Ao
tornar sem efeito todas as 364 nomeações de comissionados da
Prefeitura de Búzios por meio da Portaria nº 238 de 11 de outubro
de 2018, excluindo-se dos seus efeitos os cargos de agentes políticos
(o Chefe de Gabinete do Prefeito, o Controlador-Geral do Município,
o Procurador-Geral do Município e os secretários Municipais), o
prefeito Henrique Gomes não está cumprindo o que foi determinado na
sentença prolatada pelo Juiz Raphael Baddini no dia 21/06/2018 no
processo relativo aos concursados (processo
nº 0002216-98.2014.8.19.0078).
Em
nenhum momento o Juiz se refere na sentença a funcionário
comissionado. O pedido do MP, atendido pelo magistrado, era para que
o Município cumprisse o Compromisso estabelecido no Termo de
Ajustamento de Conduta (TAC) assinado em 2008, no qual o
Município se comprometia a não realizar mais "contratações
temporárias" (grifos meus).
O
MP só ingressou com a Ação Civil Pública por Improbidade
Administrativa, porque, primeiro, mesmo existindo um TAC assinado, em 07 de
janeiro de 2013, "o Município lançou
edital de processo seletivo simplificado para formação de cadastro
de reserva para contratação
temporária para o grupo do magistério, com
a finalidade de cobrir licenças e a demanda criada pela Lei
Municipal editada no final de 2012, que reduziu em um terço da carga
horária desses profissionais para o ano de 2013, sendo que as
contratações teriam prazo de apenas 12 (doze) meses" e segundo, no
ano seguinte, "uma vez mais, o Poder Público Municipal publicou
edital em 02 de janeiro de 2014 visando à contratação
de professores para o ensino fundamental e médio, o que foi repetido
no final desse ano, para as demandas de 2015".
Essas
contratações temporárias só foram possíveis porque o réu André
Granado logo após ter assumido o governo do Município de
Armação dos Búzios no ano de 2013, editou "decreto
para suspender por 180 (cento e oitenta) dias a convocação dos
aprovados no concurso público realizado no ano de 2012, com
homologação em 03 de julho daquele ano, sob o argumento de que tal
medida era necessária para que fosse reavaliado
o impacto orçamentário de novas convocações e
apurar eventuais
irregularidades que
porventura maculassem a higidez do certame".
Na
sentença, o Juiz Baddini cita que "não obstante, apesar de
notificado formalmente pelo Ministério Público para que
interrompesse a nomeação de temporários em detrimento
daqueles que foram aprovados em concurso público, a
Administração Municipal permaneceu os preterindo sistematicamente".
Na
data da distribuição do processo (26/05/2014), o quadro de pessoal
do Município era o seguinte:
1)
Ocupantes de cargo público em
provimento efetivo: 1.831 (mil oitocentos e trinta e um)
2)
Comissionados: 355
(trezentos e cinquenta e cinco)
3)
Temporários: 1.175 (mil cento e setenta e cinco)
Total: 3.461
(três mil quatrocentos e sessenta e um)
O
juiz adverte que "a existência de sucessivas
contratações temporárias e a paralização da
convocação de aprovados no certame realizando no ano de 2012 não é
ponto controvertido nesta demanda, sendo fato notório e amplamente
conhecido, tendo sido causa, inclusive, de incontáveis
ações judiciais nas quais os supostos preteridos visavam a garantia
de sua nomeação".
Além
do mais as contratações temporárias não foram feitas dentro da
legalidade ao ver do Juiz: "Compulsando estes autos e seu
apenso, verifico que o Poder Público desatendeu sistematicamente
ambos os requisitos básicos
trazidos pela Constituição Federal para as contratações de
servidores a título precário" (temporariedade
e a excepcionalidade ).
"Senão
vejamos: O primeiro requisito, a temporariedade,
foi inteiramente ignorado pelas sucessivas
renovações de contratos ocorridas nos anos de 2013 a 2015,
o que demonstra evidente intenção do Município de perpetuar o
vínculo com esses indivíduos, sem que fosse necessária a
realização de novos concursos e pagando inúmeros direitos a menos
aos servidores, haja vista que a eles não se aplica o estatuto
próprio daqueles ocupantes de cargo efetivo".
"Vislumbro,
também, que o atuar do Poder Executivo manifesta elevada
incapacidade de gestão quando
foram desprezados os diversos alertas, inclusive da própria
Procuradoria, de que o prazo de contratação deveria ter sido
cumprido, sendo necessária a nomeação daqueles que foram aprovados
em concurso público de provas".
"A excepcionalidade também
não foi demonstrada pelo réu, haja vista que a necessidade de
servidores públicos para cobrir
férias e licenças de outros é
absolutamente previsível e natural, devendo a Administração reger
de forma eficiente as escalas e ter número suficiente de servidores
efetivos para suprir essas faltas. É obvio, ainda, que o argumento
de inexistência de margem na
Lei de Responsabilidade Fiscal para
a contratação de servidores efetivos não merece prosperar. Por
certo, se há dinheiro para a contratação de temporários, também
deve haver para a convocação de servidores efetivos, ainda que em
menor quantidade".
"O
que se pretendia, em verdade, era burlar a regra do concurso público,
acusando a absoluta dependência dos servidores à autoridade
exercida pelo réu, que podia nomear e exonerar a todos sem nenhum
constrangimento. Além do mais, causa estranheza que um
terço (1.175) de todos (3.461) os servidores municipais seja apenas
para cobrir férias e licenças dos demais,
ou para suprir a necessidade de execução de serviços
públicos excepcionais".
"Além
disso, para que o requisito da excepcionalidade fosse comprovado,
necessária seria a demonstração de que outras medidas estavam
sendo tomadas para que a situação atípica fosse resolvida, o que
não ficou demonstrado com a sequência
imensa de recontratações, que perdurou por diversos anos".
Portanto,
Henrique Gomes está incorrendo no mesmo erro de André Granado,
violando princípios da administração pública, mormente o da
legalidade, consistente em
retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício (Artigo
11, II, Lei 8.429/92). Como André, está aparelhando a máquina
pública ao manter 1.175 contratados.
Na verdade, Henrique Gomes está preservando o curral eleitoral maior. Não mexe no quadro dos contratados, desviando o foco dos excessivos 1.175 contratados para os 364 comissionados. Ao demitir todos os comissionados, chamando 224 concursados, extingue apenas 40 cargos, porque anuncia que 100 comissionados serão readmitidos. E não acontece nada com os 1.175 contratados, centenas deles nomeados por vereadores. Assim, o curral coletivo fica preservado!
Note-se que a Constituição
Federal é expressa ao determinar que investidura em cargo público
de provimento efetivo se dará com aprovação em concurso público
(Artigo, 37, II, Constituição Federal). A regra da
estabilidade dos servidores públicos (Artigo 41 da Constituição
Federal), que ficam imunes às constantes alternâncias de poder,
blindando-os de pressões vindas de cima que os compelissem a apoiar
um ou outro postulante a cargo político por receio de vir a perder a
função.
É
bom lembrar que André Granado foi condenado a:
a)
suspensão dos direitos políticos por 05 (cinco anos);
b)
pagamento de multa civil de 50 (cinquenta) vezes o valor da última
remuneração percebida pelo agente na função pública de Prefeito
do Município de Armação dos Búzios, devidamente corrigida
monetariamente;
c) perda
da função pública que
esteja eventualmente ocupando nesta data;
d)
proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios
ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda
que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio
majoritário, pelo prazo de três anos.
Observação: muitos cargos comissionados não são na verdade cargos de chefia e assessoramento. Por isso, devem ser ocupados por servidores concursados. Neste ponto, Henrique Gomes está correto.