Crivella recebeu 250 pastores e líderes de igrejas no Palácio da Cidade. Foto:Bruno Abud, O Globo |
O
Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro (MPRJ), por meio da
5ª Promotoria de Justiça de Tutela Coletiva de Defesa da Cidadania
da Capital, ajuizou ação civil pública (ACP) por improbidade
administrativa contra o prefeito Marcelo Crivella. De acordo com a
ação, em reiterados atos, o gestor municipal feriu o princípio do
estado laico. Expresso no artigo 19 da Constituição da
República, o laicismo determina a separação entre estado e
religião e garante a liberdade religiosa.
Reunião
do prefeito com pastores e líderes de igrejas evangélicas no
Palácio da Cidade, realizada no dia 4 de julho, foi o fato decisivo
para o ajuizamento da ação. Em áudio gravado na ocasião, Crivella
oferece apoio a fiéis das igrejas representadas no ato para realizar
cirurgias de catarata pelo sistema público da saúde e para resolver
‘problemas’ com o IPTU.
A
controvérsia, por óbvio, não se cinge na religião professada pelo
Prefeito Municipal, mas, sim, na interferência do poder público na
vida privada das pessoas e na utilização da máquina pública para
benefício de determinado segmento religioso, e em eventual
discriminação contra os outros diferentes segmentos religiosos e
culturais, o que não pode e nem deve ser admitido”, diz a ação
distribuída para a 7ª Vara de Fazenda Pública.
Marcelo
Crivella é investigado pelo MPRJ desde agosto de 2017. “O Parquet
Fluminense vem recebendo, desde a posse do demandado como Prefeito da
Cidade do Rio de Janeiro, diversas notícias de irregularidades
envolvendo a liberdade religiosa e a laicidade do Estado”, diz a
petição inicial, que traz um rol de condutas do prefeito que dão
suporte à ACP.
Além
do encontro com pastores, a ação aponta o episódio que ficou
conhecido com “censo religioso na Guarda Municipal”, no qual os
servidores da guarda foram orientados a preencher um questionário
que incluía perguntas sobre sua orientação religiosa. São
investigadas ainda demissões de servidores comissionados de órgãos
municipais para contratação de pessoas ligadas à Igreja Universal
do Reino de Deus.
A
ACP faz um pequeno histórico de outras políticas municipais que
teriam violado a laicidade do estado: o censo religioso nas academias
“Rio Ar Livre”; o Festival de Cinema Cristão na Cidade das
Artes; o corte de patrocínio de eventos religiosos de matrizes
afro-brasileiras; o controle de eventos com poder de veto diretamente
pelo gabinete do prefeito; e a realização de eventos pela Igreja
Universal do Reino de Deus em escolas públicas.
A
ação destaca que o estado laico deve ser oficialmente neutro em
relação a questões religiosas, não apoiando nem restringindo
qualquer religião. “Deve ele garantir e proteger a liberdade
religiosa de cada cidadão, independente de sua crença, evitando que
alguma religião exerça controle ou interfira em questões
políticas”, pontua a ACP.
Quanto
às promessas do prefeito feitas na reunião com pastores, o MPRJ
observa que privilegiar fiéis para realização de cirurgias
ofertadas pela municipalidade, vai totalmente de encontro à política
do SISREG (Sistema de Regulação) e às diretrizes do Sistema Único
de Saúde, que prega igualdade e universalidade no atendimento à
população. Para o MPRJ, o encontro também caracterizou propaganda
eleitoral extemporânea.
“Ficou
constatado no convite para a reunião no Palácio da Cidade que o
evento contaria com a presença dos pré-candidatos do partido do
Prefeito, Rubens Teixeira e Raphael Leandro. Mais que isso. A leitura
da mensagem circulada na rede social na véspera do evento mostra a
clara intenção de realização de propaganda eleitoral
extemporânea em favor dos pré-candidatos, já que incluía a
promessa de que ambos seriam levados para visita nas igrejas
integradas pelos convidados”, afirma a inicial.
Entre
outros pedidos, o MPRJ requer que a Justiça determine, por meio de
decisão liminar, que Marcelo Crivella cumpra 12 determinações sob
pena de afastamento do cargo, entre elas, que deixe de utilizar a
máquina pública municipal para a defesa de interesses pessoais ou
de seu grupo religioso; se abstenha de determinar que servidores
públicos municipais privilegiem determinada categoria para acesso ao
serviço público de qualquer natureza; deixe de favorecer a Igreja
Universal do Reino de Deus, se abstenha de manter qualquer
relação de aliança ou dependência com entidade religiosa que vise
à concessão de privilégio; e não adote qualquer atitude
discriminatória contra entidades ou pessoas que não professam sua
fé.
Também é requerida sua condenação pela prática de
improbidade administrativa determinando o ressarcimento integral do
dano, a suspensão e de direitos políticos, o pagamento de multa
civil e a proibição de contratar com o Poder Público.
Processo
número nº 0162110-11.2018.8.19.0001
Fonte: "mprj"