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Plenário do STF. Foto: Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil. |
No
artigo “Existe impeachment de Ministros do STF” publicado no site
Politize, em 20
de janeiro de 2020,
o Bacharel
em Direito Edmilson
Neto fala
sobre o tema.
"A
polarização política criada no país atualmente, impulsionada
pelas redes sociais, respinga em figuras que até pouco tempo
atrás não eram conhecidas por grande parte do povo brasileiro:
os Ministros
do Supremo Tribunal Federal.
Estes e suas decisões são expostos pela grande mídia e atacados
por internautas de diferentes orientações políticas, sendo que
muitos clamam pelo impeachment dos ministros.
Este
artigo apresenta informações necessárias para entender quais são
as possibilidades e qual é o rito para que um ministro
sofra um impeachment, além de verificar alguns exemplos de
pedidos realizados em 2019 (O texto é de janeiro de 2020).
“Impeachment”
é uma palavra inglesa que para o fim ao qual se
destina, poderia ser traduzida como “impedimento”. Trata-se
do “impedimento”
do agente público de continuar no exercício do seu cargo, caso
ele tenha cometido um “crime de responsabilidade”.
A
Lei nº 1.079, de 1950, que define os crimes de responsabilidade e
regula o processo de julgamento, traz a hipótese de Ministros
do STF serem processados e julgados por crimes de responsabilidade.
A
Constituição não descreve quais são as hipóteses pelas quais um
ministro poderá sofrer o impedimento, como faz com o Presidente da
República, no art. 85. Mas ela estabelece que compete
ao Senado julgar os ministros (art. 52, inciso II, da
Constituição).
Ainda,
é mencionado que a Lei nº 1.079, de 1950 é quem estabelece os
crimes e o rito pelo qual um Ministro pode ser processado e julgado.
O
art. 39 da Lei do Impeachment (chamemos assim), estabelece que:
São
crimes de responsabilidade dos Ministros do Supremo Tribunal Federal:
1-
alterar, por qualquer forma, exceto por via de recurso, a decisão ou
voto já proferido em sessão do Tribunal;
2
– proferir julgamento, quando, por lei, seja suspeito na causa;
3
– exercer atividade político-partidária;
4
– ser patentemente desidioso no cumprimento dos deveres do cargo;
5
– proceder de modo incompatível com a honra, dignidade e decoro de
suas funções
Para
não se incorrer em equívocos, é importante abordar que o Item
1 estabelece
que se um ministro alterar
um voto ou decisão de
um julgamento
já encerrado, ele
comete crime de responsabilidade. Uma leitura “desavisada” pode
levar o leitor a incorrer no seguinte erro: durante um julgamento, um
ministro votou, mas no dia seguinte ele alterou seu posicionamento
sobre aquilo que está sendo julgado, logo ele cometeu um crime de
responsabilidade. Não! Este item se refere a julgamento já
concluído, no qual todos os votos foram colhidos e a decisão final
foi publicada. (Foi o caso da Ministra Carmem Lúcia, que mudou seu
voto no HC que inocentou Lula ao decidir que o Juiz Sérgio Moro foi
parcial no julgamento do Caso do Triplex de Guarujá).
No
decorrer de um julgamento, se um ministro votou de uma forma, mas
antes que se encerrasse, dias depois ele altera o seu voto, ele não
incorre em crime de responsabilidade. Tal modificação, inclusive, é
permitida pelo Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal: Cada
Ministro poderá falar duas vezes sobre o assunto em discussão e
mais uma vez, se for o caso, para explicar a modificação do voto.
Nenhum falará sem autorização do Presidente, nem interromperá a
quem estiver usando a palavra, salvo para apartes, quando solicitados
e concedidos.
O
Impeachment na prática
A
Lei do Impeachment estabelece o procedimento, que se divide em
denúncia (arts. 41 e seguintes), acusação e defesa (arts. 58 e
seguintes) e sentença (arts. 68 e seguintes).
Denúncia
do Ministro do Supremo Tribunal Federal
Diferentemente
do impeachment do Presidente da República, em que se inicia na
Câmara dos Deputados, a
denúncia contra ministros do STF é feita no Senado Federal.
A
seguir, segue o passo-a-passo na fase da denúncia:
Primeiro
passo
Qualquer
cidadão pode denunciar um ministro do STF ao Senado. Para que a
denúncia seja aceita, o ministro precisa estar no cargo, caso
contrário, o processo não terá seguimento.
Segundo
passo
A
petição a ser entregue deve conter assinatura do
denunciante com firma reconhecida; os documentos que comprovem o
crime ou ser declarada a impossibilidade de entregar, desde que
indique onde a prova pode ser encontrada; e, se o crime tiver
prova testemunhal, estas deverão ser indicadas, em número de cinco,
no mínimo.
Terceiro
passo
O
presidente do Senado poderá dar seguimento ou não.
Sobre este ponto, o art. 44, da Lei do Impeachment diz que
“Recebida a denúncia pela Mesa do Senado, será lida no expediente
da sessão seguinte [leia-se: reunião realizada no plenário do
Senado] e despachada a uma comissão especial [leia-se: após a
leitura no plenário, uma comissão de senadores analisará a
denúncia], eleita para opinar sobre a mesma”.
A
controvérsia que se pode criar é: se tantas denúncias já foram
feitas, por que não é dado seguimento no processo?
Porque
protocolar a denúncia não significa que ela será recebida.
Primeiramente, cabe
ao presidente do senado decidir pelo recebimento e seguimento da
denúncia.
Antes
do Presidente do Senado decidir se a denúncia segue, ou não, os
advogados do Senado emitirão um parecer, que normalmente é adotado
pelo Presidente. Se a decisão for positiva, então será feita
a leitura na sessão seguinte.
Outro
problema daí advindo se refere ao prazo para
que o presidente aprecie essas denúncias: não tem prazo!
Quarto
passo
Supondo
que a denúncia foi recebida e teve seguimento, uma
comissão especial será instalada para discutir o parecer sobre a
denúncia no prazo de 10 dias.
O parecer
consiste em dizer se a denúncia dever ser julgada,
ou não. Para aprovação do parecer sobre a denúncia, bastará
uma maioria simples daqueles que estivem presentes na sessão.
Se
os senadores entenderem que a denúncia não deve ser apreciada ela
será arquivada, mas se for aceita, serão remetidas cópias para que
o denunciado responda no prazo de 10 dias às acusações. Após
o prazo de 10 dias para defesa, o senado dará um parecer também
dentro de 10 dias sobre a procedência ou improcedência da acusação.
Quinto
passo
Se
o parecer final for admitido, o denunciado sofrerá as seguintes
consequências:
a)
ficar suspenso do exercício das suas funções até sentença final;
b)
ficar sujeito a acusação criminal;
c)
perder, até sentença final, um terço dos vencimentos, que lhe será
pago no caso de absolvição.
Acusação
e Defesa
Após
aprovação do parecer final sobre a denúncia, a próxima fase visa
aprofundar o debate entre a acusação e a defesa.
Primeiro
passo
O
denunciante poderá acessar o processo no prazo de 48 horas para
apresentar sua acusação e testemunhas e, em seguinte, o denunciado
acessará o processo no mesmo prazo para oferecer sua defesa e
rol de testemunhas;
Segundo
passo
Tanto
a acusação quanto a defesa serão enviadas para o
presidente do Supremo Tribunal Federal, que presidirá a sessão de
julgamento no senado.
Terceiro
passo
No
dia do julgamento, após verificação da presença do número
mínimo de senadores [dois terços, o que equivale a 54 senadores], a
sessão será aberta, sendo que eles próprios serão os juízes do
processo.
Quarto
passo
Terminada a
inquirição das testemunhas, será aberto o debate oral, pelo prazo
que o presidente determinar. Após, tanto o acusador quanto o acusado
deverão se retirar do local para que os senadores/juízes debatam
entre si o objeto da acusação.
Após
este debate, o presidente fará um relatório com o resumo dos
fundamentos da acusação e da defesa, bem como das respectivas
provas, submetendo em seguida o caso a julgamento.
Julgamento
Os
senadores/juízes deverão responder “sim” ou “não” à
pergunta: “cometeu
o acusado X o crime que lhe é imputado e seve ser condenado à
perda do seu cargo?”.
Para
condenação, dois terços dos senadores/juízes deverão responder
“sim”.
Após, o presidente do julgamento fará nova consulta para saber se o
condenado deverá ficar inabilitado por prazo não superior a 5 anos
para exercer qualquer função pública. Se a sentença absolver o
acusado, ele será reabilitado para suas funções, com direito
à restituição da parte do salário que ficou retido.
A
sentença será assinada tanto pelo presidente do julgamento quanto
pelos senadores/juízes, e será informado ao Supremo Tribunal
Federal e ao Presidente da República.
Alguns
casos de pedidos de impeachment contra os ministros do STF
Pode-se
dizer que a principal função de um juiz é julgar e cada um
decide sobre o assunto que a lei lhe confere competência para
decidir.
Os
ministros do STF julgam processos de alta relevância jurídica,
política e social.
Porém,
há uma onda de insatisfação criada no seio da sociedade
contra decisões dos ministros. As críticas são diversas e severas,
e o atual clima político apenas infla as suspeitas sobre as
decisões. De um lado, um grupo político “X” acredita que
determinados ministros favorecem o grupo político “Y”. Já este
acredita que determinados ministros favorecem aquele.
Com
efeito, percebe-se que muitas críticas são feitas sem
fundamentos, em que o interlocutor se baseia em suspeitas, fake
news,
interpretação das decisões, suposta tendência ideológico,
favorecimento, etc.
Por
mais que a decisão favoreça “esse” ou “aquele”, o
pressuposto das críticas não deve levar em consideração quem se
beneficia da decisão, mas sim a técnica empregada para decidir, ou
seja, se está de acordo com as leis vigentes, se não há
impedimento ou suspeição, etc.
Acusar
um juiz de parcialidade nas suas decisões nunca é fácil. Como dito
acima, não basta ver a quem a decisão beneficia. Logo, a
possibilidade de impeachment de um ministro se restringe
a “encaixar” a conduta aos tipos de crimes de
responsabilidade elencados nos arts. 39 e 39-A da Lei do Impeachment.
Atualmente,
dezenas de denúncias já foram protocoladas contra os ministros,
principalmente contra os ministros Gilmar
Mendes e Dias
Toffoli.
Apenas
no ano de 2019,
foram protocolados dezenove pedidos de impeachment, sendo que, de
todos, o ministro Dias Toffoli conta com nove, seguindo do
ministro Gilmar Mendes, com oito e dos ministros Celso de Mello e
Alexandre de Moraes com cinco cada.
Em
algumas petições, apenas um ministro é denunciado, mas há outras
em que todos os ministros são denunciados!
Vamos
ver alguns dos pedidos de impeachment protocolados em 2019, contra
quem, por qual motivo, e qual o status do processo:
Petição
1/2019: contra
Gilmar Mendes, porque ele pediu vista [leia-se: um tempo] de um
processo que versa sobre doação de pessoas jurídicas para
campanhas eleitorais e partidos políticos, além disso ele
demorou meses para devolver o processo, mas se manifestou sobre o
tema na imprensa. Foi acusado de ser “desidioso
no cumprimento dos deveres do cargo”.
Esse pedido foi rejeitado.
Petição
2/2019: contra
Ricardo Lewandowski, porque deu voz de prisão a um passageiro de
avião que o importunou ao dizer palavras como “Ministro
Lewandowski, o Supremo é uma vergonha, viu? E eu tenho vergonha de
ser brasileiro quando vejo vocês”. Ao ser ameaçado de prisão, o
passageiro alegou que tinha direito de expressão. Ao ministro foi
imputado a prática
de abuso de poder e procedência de modo incompatível com
a honra, dignidade e decoro de suas funções. Está pendente o
parecer de admissão.
Petição
6/2019: contra
os ministros Celso de Mello, Barroso, Fachin e Alexandre de Moraes,
porque decidiram que o Congresso
Nacional está em um estado de omissão inconstitucional ao não
regulamentar a punição àqueles que cometem crimes em razão de
homofobia.
Entendeu-se ser possível aplicar a lei de racismo enquanto uma lei
específica não for editada. Está pendente o parecer de
admissão.
Petição
8/2019: contra
os ministros Lewandowski, Cármen Lúcia, Celso de Mello, Marco
Aurélio, Gilmar Mendes, Dias Toffoli, Fux, Rosa Weber, Barroso,
Fachin e Teori Zavascki. Como podem perceber, o ministro Teori
Zavascki faleceu em 2017 após um acidente em um avião. Mesmo assim,
este fato não impediu que em 2019 pedissem o seu impeachment! O
motivo deste pedido de impeachment foi que eles concordaram
em afastar o Deputado Eduardo Cunha das
funções de presidente da Câmara dos Deputados além de terem
suspendido o mandato de deputado. Esse pedido foi rejeitado.
Petição
10/2019: contra
os ministros Dias Toffoli e Alexandre de Moraes, porque
decidiram
abrir um inquérito para apurar fake
news contra
o STF e
seus ministros. Está pendente o parecer de admissão.
Petição
11/2019: contra
todos os ministros do STF, além da ex-Procuradora-Geral Raquel
Dodge. A discussão é complexa e gira em torno da implantação
do voto impresso nas eleições.
Há diversas acusações contra os ministros, como serem desidiosos,
suspeições, etc. Está pendente o parecer de admissão.
Petição
13/2019:
contra Dias Toffoli, porque determinou a retirada de matéria
jornalística do O Antagonista e Cruzoé. Está pendente o
parecer de admissão.
Petição
15/2019: contra
Dias Toffoli, porque determinou a paralisação dos
processos judiciais, inquéritos policiais e procedimentos do MPF e
MP estaduais que se utilizam de dados do COAF. Está pendente o
parecer de admissão.
Petição
16/2019: contra
todos os ministros do STF, por diversas razões, em que se elenca
fatos desde o início do Governo Lula. Está pendente o parecer
de admissão.
São
várias as acusações, das mais simples em petições de cinco
páginas, até as mais complexas, em petição que somam mais de
quatro mil páginas. Mas em que pese todas essas tentativas de
impeachment, recorde-se o citado no início deste artigo: impeachment
é um processo essencialmente político! Enquanto a situação entre
os ministros e o parlamento não se desgastar ou enquanto os fatos a
eles imputados não forem de extrema gravidade do ponto de vista
jurídico, ético, moral, político, etc., é grande a probabilidade
dessas denúncias não prosperarem.
Neste
artigo não se pretende adentrar no mérito daquilo que se alega nas
denúncias contra os ministros acima citados, mas sim afirmar que o
ordenamento prevê a possibilidade do impedimento deles conforme as
hipóteses citadas.
Deve-se
ponderar que todo processo de impeachment gera uma crise
institucional. Agora, cabe ao Presidente do Senado avaliar o
seguimento, ou não, das denúncias.
Fonte:
"POLITIZE"
Meu
comentário:
O
presidente Jair Bolsonaro parece desconhecer a Constituição
Brasileira ao afirmar que "Barroso
se omite ao não determinar ao Senado a instalação de processos de
impeachment contra ministro do Supremo, mesmo a pedido de mais de 3
milhões de brasileiros". Se ele quer mesmo que seja
instalado processo de impeachment de algum Ministro do STF basta
pedir ao Presidente do Senado Rodrigo Pacheco (DEM), seu aliado. A prerrogativa é dele e não do STF.