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Ocupação irregular no Parque Costa do Sol, em Arraial do Cabo, que foi invadido pelo tráfico e milícia. Foto: Custódio Coimbra / Agência O Globo |
O
jornal O Globo de hoje (21) trás excelente matéria assinada por
Paulo Cappelli (ver em "oglobo")
sobre a exploração imobiliária criminosa de
áreas do Parque Estadual da Costa do Sol (PECSOL). A ação do
tráfico e da milícia são investigadas pela Polícia Civil e pelo
Ministério Público do Rio. Já a ação da especulação
imobiliária, livre, leve e solta, percorre as Casas Legislativas e os “Palácios” governamentais.
MILÍCIA
E TRÁFICO
O
aparente ar de tranquilidade no Parque Estadual Costa do Sol, com
belezas naturais que se estendem por seis municípios na Região dos
Lagos, contrasta com um problema já conhecido de cidades grandes: a
atuação da milícia
e do tráfico
de drogas.
O paraíso ecológico de restingas, mangues, lagoas e brejos agora
divide espaço com centenas
de casas construídas irregularmente,
uma vez que, por se tratar de unidade
de conservação de proteção integral,
nenhuma construção privada poderia ser erguida lá. O poder
paralelo queima trechos com vegetação e multiplica pequenas
moradias sobre as dunas. A
exploração imobiliária criminosa no parque,
criado em 2011, é investigada pela Polícia Civil e pelo Ministério
Público do Rio.
—
Essa
situação se agravou de 2018 para cá. Casas são construídas da
noite para o dia, e, rapidamente, famílias são instaladas. Dessa
forma, eles tornam mais difícil a atuação do poder público
porque, quando a construção já está habitada, o processo para a
demolição é mais demorado — disse Vinicius
Lameira,
promotor do Ministério Público, que investiga a ação da milícia
na região, assim como a Delegacia de Repressão às Ações
Criminosas e de Inquéritos Policiais (Draco).
Presidente
do Instituto
Estadual do Ambiente (Inea),
ligado à Secretaria do Ambiente, Claudio
Dutra
contabiliza que este ano já foram derrubadas 195
construções irregulares no interior do parque.
—
Estamos
trabalhando para proteger a biodiversidade. Muitas vezes, não
podemos ir apenas com os nossos fiscais, na cara e na coragem, por
conta da presença da milícia. Mas temos tido o
apoio das polícias Militar e Ambiental —
afirmou Dutra, informando que 25
operações de demolição
foram feitas este ano.
Segundo
o MPRJ, um dos trechos mais degradados é a Restinga
de Massambaba,
em Arraial do Cabo. Ao chegar ao local, a equipe do GLOBO foi
alertada por moradores sobre o perigo de permanecer na região. Em
Massambaba, ruas abertas em meio à vegetação levam a condomínios
de pequenas casas erguidas sobre as dunas, a poucos metros do mar e
da Rodovia RJ-102.
As
investigações indicam que os
imóveis são negociados por R$ 7 mil,
em parcelas de R$ 100 a R$ 200 mensais. Um morador de uma área
regularizada em Arraial do Cabo denuncia que, além da milícia,
traficantes
recém-chegados da Baixada Fluminense aderiram ao “negócio”.
—
Vende-se
um “kit-invasão”.
São 15 ou 20 casas construídas em velocidade relâmpago. Tudo de
forma organizada. Muitos que não são daqui são chamados quando os
imóveis ainda estão sendo construídos — diz.
A
ESPECULAÇÃO IMOBILIÁRIA QUER MUDANÇA NO MANEJO
Uma
ação
civil pública do MPRJ
conseguiu na Justiça tutela de urgência para a desocupação
das áreas invadidas.
De acordo com as investigações, ainda em andamento, a exploração
imobiliária dentro do parque conta com a conivência
de servidores do estado e da prefeitura de Arraial do Cabo.
A assessoria do município afirmou que, “até a presente data, não
tem conhecimento do envolvimento de agentes”. Já o estado disse
que “os funcionários das unidades de conservação têm atuado na
fiscalização de irregularidades”.
Em
meio ao drama na região, o governador Wilson Witzel anuncia mudanças
nos limites geográficos do Parque Estadual Costa do Sol,
que, além de Arraial, abrange partes de Araruama, Búzios, Cabo
Frio, Saquarema e São Pedro da Aldeia. Ele diz que, hoje, o
nível de restrição é “elevado”.
—
Acaba
que, por não permitirem nada, permitem tudo — disse o governador
ao GLOBO na última segunda-feira.
O
presidente do Inea adiantou que a ideia é alterar
o plano de manejo para retirar algumas áreas que estão dentro dos
limites do parque
e incluir outras de forma a atrair investimentos. Esta semana, um
grupo começa a trabalhar no projeto. Segundo Dutra, os
condomínios do tráfico e da milícia não serão beneficiados,
muito pelo contrário. Ele garantiu que a
área do parque, de 9.790 hectares, será mantida.
—
É
possível que construções
possam ser feitas em áreas hoje não permitidas.
Os critérios serão técnicos. Para
cada hectare retirado, um outro será incluído
— explica Dutra. — Vamos usar imagens de satélites para saber
que construções existiam e quais não existiam quando o parque foi
criado. Se
o estado não alterasse o manejo, teria que indenizar alguns
proprietários de residências que já estavam lá antes da
delimitação.
ATUAÇÃO
DA ESPECULAÇÃO IMOBILIÁRIA
Representante
da sociedade civil no conselho consultivo do parque, Roberto
Noronha
vê com preocupação a mudança:
—
Quando
se fala em permitir a ocupação no interior do parque, isso
significa transformar
as áreas em edificantes.
Nos bastidores, sabemos da atuação
de empresários, principalmente de olho em terrenos à beira-mar, que
têm um valor altíssimo.
É
difícil haver recategorização para proteger mais,
o normal é flexibilizar
para facilitar a ocupação.
O
deputado Carlos Minc (PSB), que era secretário do Ambiente quando o
parque foi criado, enxerga
retrocesso:
—
Para
criar o parque, houve grande
resistência da especulação imobiliária.
Há áreas muito valorizadas em Arraial, Búzios e Cabo Frio. Foram
dois anos de negociação. A ocupação
desordenada ameaçava a fauna e a flora.