sexta-feira, 22 de maio de 2020

Justiça de Búzios decreta as prisões de Albert Danan, ex-Tabelião Titular do Cartório, e de Allan Vinícius, Procurador da Câmara - Parte 2

Albert Danan. Foto: O Perú Molhado, 08/05/2009



Continuação da parte 1 (ver em "IPBUZIOS")

Fundamentação e motivação da decisão de prisão pelo Juiz DANILO MARQUES BORGES:

As investigações demonstraram que os acusados agiam de forma vil, torpe, usurpavam o serviço público e submetiam a sociedade buziana a toda sorte de vitupérios, sempre que alguém necessitava intervir junto ao Cartório daquela Comarca.

Ao cumprirem a busca e apreensão, os membros do Ministério Público encontraram uma enorme quantidade de dinheiro vivo na casa do primeiro acusado, além de considerável quantidade de joias e artigos de luxo, fato comezinho nos crimes de lavagem de dinheiro.

O crime de lavagem de dinheiro é praticado às clandestinas, de forma sub-reptícia, sendo certo que a liberdade dos acusados pode significar, em última análise, o êxito final da empreitada criminosa que vêm colocando em prática há significativo período de tempo. Prova disso são as planilhas de pagamentos encontradas na residência do acusado Danan, donde constam pagamentos mensais, em espécie, ao acusado Allan, desde o ano de 2016, a indicar que os crimes eram reiterados e tantos outros poderão ser descobertos ao longo da instrução, sobretudo após a sociedade buziana tomar conhecimento da existência do processo, seu conteúdo e das prisões dos acusados.

É neste ponto, inclusive, que reside a necessidade da cautelaridade processual, que justificar a prisão dos acusados por conveniência da instrução processual. É que, dois fatos mostram, com clareza, o tipo de comportamento que se pode esperar dos acusados caso permaneçam em liberdade. Ao tomar conhecimento das investigações que se iniciavam pela Corregedoria Geral de Justiça, o acusado Danan passou a manter contatos com as vítimas e marcar, com elas, reuniões particulares, na tentativa de dissuadi-las a não deporem contra si, ou convencê-las de suas boas intenções. Tal fato está comprovado nos autos, vez que o acusado, numa clara demonstração de seu propósito, gravou essas reuniões, mas que foram reveladas quando da realização da busca e apreensão, que descobriu tais gravações, que podem ser visualizadas ao final da cota ministerial, através do sistema de leitura dos QR Codes, ali colacionados. Sua intenção de interferir na prova é clara e se assenta em fatos, não em meras conjecturas.

Outro evento relevante para a decretação de suas prisões diz respeito aos depoimentos prestados pela vítima José Augusto Pereira Neto que, inicialmente, omitiu os fatos ao Ministério Público, contudo, posteriormente, após admitir ter medo de represálias dos acusados Danan e Allan, narrou minuciosamente a trama da qual tinha sido vítima. O risco de intervirem no ânimo das testemunhas, ameaça-las, destruírem provas, ou qualquer outra medida tendente a manter no escuro suas condutas é claro, hialino, não exsurge de meras ilações, mas sim de fatos concretos narrados na denúncia e referidos nesta decisão, o que mostra ser insuficiente a adoção de qualquer outra medida cautelar, que não a prisão preventiva, para que se possa bem instruir o processo e aplicar a lei penal, como esperado em um genuíno Estado Democrático de Direito.

O risco de fuga também é real, tendo em vista o poderio econômico dos acusados que, em liberdade, podem facilmente desaparecer, adotar novas vidas, em novos lugares, usufruindo do conforto e facilidades que o dinheiro pode proporcionar.

Por fim, a prisão também é necessária para garantia da ordem pública, seja pelo risco da reiteração de crimes, sobretudo de lavagem de dinheiro, dilapidação patrimonial e risco de frustração do confisco alargados dos bens, ao final do processo, como forma de reparar os danos causados pelos acusados ou, ainda, pela sensação de descrédito do Poder Judiciário diante da sociedade, ao desvelar tamanha trama criminosa, ardil, nauseante, de um agente público de quem se espera um agir probo, sendo um deles, inclusive, procurador da câmara municipal, cargo a cujo respeito o segundo acusado atribui ao primeiro a conquista, o que demonstra a influência e poder que exerce naquele município, o que vulnera sobremaneira a prova a ser produzida nestes autos.

Nas palavras do Ministro Gilmar Mendes, a prisão preventiva ´se justifica na garantia ordem pública quando seja necessário assegurar a credibilidade das instituições públicas, em especial do Poder Judiciário, no sentido da adoção tempestiva de medidas adequadas, eficazes e fundamentadas quanto à visibilidade e transparência da implementação de políticas públicas de persecução criminal e desde que diretamente relacionadas com a adoção tempestiva de medidas adequadas e eficazes associadas à base empírica concreta que tenha ensejado a custódia cautelar´. (STF, 2ª Turma, HC 89.090/GO, Rel. Min. Gilmar Mendes).

Há aqui, como se vê, tempestividade e contemporaneidade da necessidade da prisão, que se dignam a demonstrar à sociedade a implementação de politicas públicas de persecução criminal, diretamente relacionadas à elementos fáticos reais e comprovados, ou seja, em base empírica concreta, justificadora da medida cautelar extrema. Os agentes são perigosos, possuem meios para, em liberdade, agirem para apagar rastros de seus crimes, sobretudo por ocuparem posição social relevante e de alta influência social em uma cidade pequena, de parcos quarenta mil habitantes, o que ganha contornos ainda mais insólitos diante do fato do acusado Allan trabalhar dentro da prefeitura municipal, na condição de procurador.

No tocante à acusada Rita de Cássia Almeida Queiroz, não há fatos narrados nos autos que permitam afirmar que sua liberdade represente um risco ao processo ou à sociedade, que transcenda o âmbito da própria punição prevista pelo tipo penal incriminador que se lhe imputa. O MP não narrou fatos que vão além da conduta supostamente criminosa, que permitam que o Juízo reconheça risco real em sua liberdade, diferente do que fora fundamentado quando da decretação da prisão dos acusados Danan e Allan. Contudo, isso não quer dizer que sua liberdade não represente qualquer risco ao processo, sobretudo por ser irmã de um dos acusados e, nesta condição, poder ser usada como instrumento para eliminar ou mesmo dissimular provas. Logo, entendo necessária a adoção, a seu respeito, das seguintes medidas cautelares diversas da prisão:
(i) proibição de ausentar-se da comarca por mais de 5 dias, sem autorização do Juízo;
(ii) entrega do passaporte;
(iii) proibição de manter contato com vítimas, testemunhas e de comparecer ao presídio para se comunicar com os demais acusados;
(iv) proibição de ingressar no prédio do Cartório do Ofício Único da Comarca de Armação dos Búzios, ou manter contato com qualquer funcionário daquele serventia extrajudicial;
g) Citem-se os acusados para apresentação de defesa resposta à acusação, no prazo legal, vendo informar, no ato da citação, se possuem advogado ou se serão defendidos pela Defensoria Pública;
h) Expaçam-se os mandados de prisão;
i) No momento do cumprimento da prisão do acusado Allan, comunique-se a OAB para nomear representante para acompanhar o cumprimento da medida, visto tratar-se de prerrogativa do acusado;
j) Oficie-se à CGJ, na pessoa do Excelentíssimo Senhor Desembargador Corregedor, informando sobre a prisão do acusado Danan;
k) Promovam-se as anotações e comunicações legais e de praxe;
l) Comunique-se à Prefeitura Municipal de Búzios acerca da prisão de seu procurador, por ofício, que deverá ser enviado eletronicamente;
m) A PRESENTE DECISÃO VALE COMO MANDADO DE PRISÃO, BASTANDO SUA APRESENTAÇAÕ PARA CUMPRIMENTO DA ORDEM E CONDUÇÃO DOS RÉUS.
n) APÓS O CUMPRIMENTO DA PRISÃO DO ACUSADO ALLAN, COMUNIQUE-SE A SECCIONAL E SUBSEÇÃO DA ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL, AO QUAL O ACUSADO ESTEJA VINCULADO, EM CUMPRIMENTO AO DISPOSTO NO inciso IV do ARTIGO 7º da LEI n.º 8.906/94.
o) Apensem-se a esses autos as medidas cautelares sigilosas 002670-05.2019.8.19.0078 e 002671-87. 2019.8.19.0078, mantido o sigilo das mesmas, exceto para as partes e seus patronos.

ARMAÇÃO DOS BÚZIOS, 21 DE MAIO DE 2020

DANILO MARQUES BORGES
JUIZ DE DIREITO

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