Lélis Teixeira, ex-presidente da FETRANSPOR. Foto: Folha de SP |
A delação premiada de um ex-presidente da federação de empresas de ônibus do Rio de Janeiro atinge todos os Poderes estaduais e municipais. E também alguns órgão federais.
Assinado
em fevereiro, o acordo de Lélis Teixeira com
o Ministério Público Federal contém
25 anexos que citam políticos, magistrados e conselheiros do Judiciário fluminense. E ainda servidores da Receita e da Polícia Federal.
Com
a delação de Lélis Teixeira, a famosa caixinha
da Fetranspor começa
a ser aberta. Calcula-se que pelos menos 30 autoridades receberam propina de
R$ 120 milhões da Fetranspor durante 20 anos.
Pense em um nome qualquer de autoridade estadual ou municipal. Não
se surpreenda se ele estiver na lista.
Obviamente
que o esquema de corrupção prejudicou os usuários de transporte no
Rio de Janeiro. As tarifas das linhas intermunicipais
em 2017 foram reajustadas em 14,83%, mais que o dobro da inflação
no período que foi de 6,99%. Além dos aumentos das passagens acima da inflação, as empresas
de ônibus também conseguiram benefícios ficais, como redução do
IPVA e isenção do ICMS em 2014, época em que Sérgio Cabral, do
MDB, governava o Rio de Janeiro.
Daí
se explica porque a melhor opção de
mobilidade nas grandes metrópoles- o trem- é o tipo de transporte
que mais sofre com o descaso das autoridades públicas estaduais e
municipais. Os ônibus rendem muito mais. Para o bolso deles, claro.
Teixeira
detalhou as informações que recebeu sobre o pagamento de propinas
para autoridades estaduais ao longo de anos, descrevendo os
beneficiários da "caixinha da Fetranspor", como ficou
conhecido o caixa dois das empresas de ônibus.
A
dimensão da "caixinha" já havia sido dada pelo antigo
operador financeiro da Fetranspor, Álvaro
Novis. Ele fechou delação premiada em 2017 e seus
depoimentos deram origem à Operação Ponto Final, que
teve como alvos os maiores empresários do setor no Rio de Janeiro. Novis
era responsável por receber o dinheiro vivo que vinha das roletas de
ônibus do estado e distribuí-lo sob ordens dos empresários.
Estima-se que R$ 500 milhões foram repassados de 2010 a 2016.
A
dimensão da delação de Lélis ainda não dá conta de toda a
propina distribuída. Enquanto ele descreve cerca de R$
120 milhões de 2007 a 2017, Novis tem em suas
planilhas gastos com cerca de R$ 500
milhões de 2010 a 2016.
RECEITA
FEDERAL
O
ex-auditor Marco
Aurélio Canal-
à
época chefe da equipe responsável pelo processo da Fetranspor
dentro da Receita- teria recebido pagamento de R$ 4 milhões para
evitar uma multa contra uma empresa de transporte carioca em um
processo que corria na Receita.
POLÍCIA
FEDERAL
O
delegado de Polícia Federal Hélio
Khristian de Cunha Almeira,
acusado de obstruir as investigações no caso Marielle Franco, teria
participado de esquema para enterrar inquérito aberto contra a
Federação das Empresas de Transportes de Passageiros do Rio de
Janeiro (Fetranspor) na Delegacia Previdenciária da PF no Rio que
investigava supostos crimes cometidos no âmbito da entidade. O
delegado teria recebido de R$ 2 milhões a R$ 3 milhões em propinas.
O caso teria ocorrido em 2017, afirmou o delator.
EX-GOVERNADORES
(MESADAS PARA GAROTINHO, CABRAL E PEZÃO)
Lélis
Teixeira afirmou que, durante uma reunião em 2010, Anthony
Garotinho, atualmente sem
partido, solicitou o pagamento de R$ 30 mil mensais a pretexto de
patrocínio para seu programa de rádio. Garantiu
também ter repassado mais R$ 4 milhões da Fetranspor, na campanha
seguinte, em 2014, quando Anthony Garotinho foi candidato a
governador.
A
delação aponta também que, nas mesmas eleições, Luiz
Fernando Pezão, do MDB, recebeu
R$ 30 milhões da Fetranspor e que parte dos pagamentos foi em
dinheiro.
Cabral, de acordo com o Ministério Público Federal (MPF), teria recebido cerca de R$ 122 milhões em propina por meio do operador e braço-direito Carlos Miranda.
SECRETÁRIO
ESTADUAL
Na
delação, Lélis Teixeira cita nomes como o então secretário de
transportes do estado, Júlio
Lopes
e Carlos
Roberto Osório,
que foi secretário municipal de Transportes do Rio e depois assumiu
a secretaria estadual no governo Pezão.
Segundo
Lélis Teixeira, Julio
Lopes
recebeu R$ 7,9 milhões de forma ilegal quando secretário de
transportes do estado. O pagamento foi feito em mesadas de R$ 100 mil
e em um contrato fictício com um escritório de advocacia, no valor
de R$ 900 mil.
SECRETÁRIO
MUNICIPAL
O
outro nome é o de Carlos
Roberto Osorio,
atualmente no PSDB, que também foi secretário municipal de
Transportes. Ele teria recebido entre R$ 160 mil e R$ 200 mil por
mês, de 2012 a 2015.
PREFEITO
MARCELO
CRIVELLA
Segundo
o delator, Crivella
recebeu recursos via caixa 2 quando concorreu à prefeitura, em 2004,
ao senado em 2010 e de novo à prefeitura, em 2016.
Na
última campanha, segundo Lélis, foram repassados R$ 2,5 milhões a
Mauro Macedo, tesoureiro de Crivella. Na delação, constam conversas
de WhatsApp que Lélis Teixeira entregou à Justiça, nas quais
marcava encontros com Macedo.
EX-PREFEITO
EDUARDO
PAES
O
delator afirmou que o ex-prefeito Eduardo
Paes
recebeu R$ 40 milhões em 2012 para a campanha de reeleição.
PEDRO
PAULO
O
deputado federal e ex-secretário Pedro
Paulo
teria ficado com R$ 10 milhões para sua campanha à prefeitura do
Rio em 2016.
DEPUTADOS
FEDERAIS
São citados
na delação 21 deputados, ex-deputados e candidatos à Câmara dos
Deputados e à Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro. O total pago
em caixa dois chega a R$ 20 milhões nas eleições de 2014 e 2016.
Dois
secretários do governador Wilson Witzel aparecem na lista. São eles
o secretário de Turismo, Otávio
Leite
(PSDB), e o secretário de Esporte, Felipe
Bornier
(PROS).
OUTROS
DEPUTADOS FEDERAIS E CANDIDATOS
Alexandre
Valle (PRP)
– 70 mil reais
Carlos
Alberto
(PMN) – 20 mil reais
Dr.
Paulo César
(PR) – 90 mil reais
Edson
Santos
(PT) – 100 mil reais
Eurico
Júnior
(PV) – 30 mil reais
Felipe
Bornier
(PSD) – 150 mil reais
Hugo
Leal
(PROS) – 200 mi reais
Índio
da Costa
(PSD) – R$ 1.500.000,00
Itagiba
(PSDB) – 100 mil reais
João
Ferreira
(PR) – 80 mil reais
Júlio
Lopes
(PP) – 600 mil reais
Marcelo
Matos
(PDT) – 250 mil reais
Marcelo
Sereno (PT)
– 100 mil reais
Marco
Antônio Cabral
(PMDB) – R$ 8.000.000,00
Marquinho
Mendes
(PMDB) – 150 mil reais
Otávio
Leite
(PSDB) – R$ 1.000.000,00
Rosangela
Gomes
(PRB) – 30 mil reais
Sávio
Neves
(PEN) – 50 mil reais
Simão
Sessim
(PP) – 100 mil reais
Washington
Reis
(PMDB) – 100 mil reais
Aécio
Neves
(PSDB) – R$ 1.500.000,00
DEPUTADOS
Lélis
Teixeira afirmou ter pago propina também na Assembleia Legislativa
do Rio de Janeiro, citando oito deputados e ex-deputados na delação.
No grupo, os ex-presidentes Jorge
Picciani e Paulo Melo
- os dois do MDB - e presos em 2017 acusados de terem recebido
dinheiro da caixinha da Fetranspor.
Além
dos DEZ DEPUTADOS ESTADUAIS PRESOS são citados:
Anabal
(PHS) – 50 mil reais
Átila
Nunes Filho (PSL) – 50 mil reais
Dr.
Marcelo Amaral (PSD) – 30 mil reais
Sérgio
Sveiter (PSD) – 100 mil reais
TRIBUNAL
DE JUSTIÇA
PERITO
Perito
suspeito: Charles
William.
Codinome: “Sr.
Charles”.
O
Ministério Público Federal acusou William de ter recebido R$ 4,9
milhões em propinas da Fetranspor. Segundo
o delator, as negociações foram intermediadas pelo ex-auditor
Elizeu Marinho, apresentado como “uma pessoa influente” pelo
advogado e empresário de transportes Narciso Gonçalves. Tanto
Marinho quanto Gonçalves foram alvos de prisão preventiva.
JUIZA
Juíza
Roseli
Nalin,
da 5ª Vara de Fazenda Pública do Rio de Janeiro.
O ex-presidente da Fetranspor Lélis Teixeira afirmou, em sua delação premiada, que a juíza Roseli Nalin deu uma decisão favorável aos empresários de ônibus após ele ter pagado R$ 1,6 milhão ao ex-marido dela, por serviços advocatícios, e ter ouvido dele que a decisão dela seria favorável ao setor de ônibus.
DESEMBARGADOR
A
delação de Lélis Teixeira cita dois desembargadores do TJ do Rio
de Janeiro. Um deles, aposentado.
Propinas
de até R$ 6 milhões teriam sido pagas para a mulher do
desembargador Mário
Guimarães Neto,
do Tribunal de Justiça do Rio. As tratativas visavam ‘influenciar’
o magistrado a tomar decisão a favor de empresários do setor em
briga travada com a Prefeitura do Rio sobre a licitação das linhas
de ônibus aberta em 2008 pela gestão César Maia (DEM).
Mário
Guimarães Neto é o atual presidente da 12.ª Câmara Cível do Rio.
Em
um relato, Lélis narra tratativas que teriam envolvido o então
presidente do Conselho Superior da Rio-Ônibus, João Augusto
Monteiro, o empresário Jacob Barata Filho, o ‘Rei dos Ônibus’,
e a advogada Gláucia Iorio Araújo Guimarães – mulher do
desembargador Mário Guimarães Neto. Lélis
relata que o pedido inicial da mulher do desembargador foi ‘muito
alto’ para Monteiro e que no segundo semestre de 2009 esteve duas
vezes com Gláucia para renegociar um valor, ainda sem sucesso.
Segundo
o ex-presidente da Fetranspor, a advogada então participou de outro
encontro, dessa vez com Jacob Barata Filho e João Monteiro, no qual
ficou ajustado o pagamento de R$ 5 milhões a R$ 6 milhões.
“Ficou
combinado que o êxito, ou seja, a contrapartida, compreendia também
o convencimento de pelo menos mais um integrante do quórum de
julgamento”, detalha Lélis.
MINISTÉRIO
PÚBLICO
O
promotor Flávio
Bonazza de Assis
é acusado de receber, entre 2014 e 2016, 22 pagamentos no valor de
R$ 60 mil, para proteger os empresários do setor de transportes do
Rio de eventuais ações judiciais.
Na
época do suposto esquema de propina, Bonazza conduzida
investigações ligadas ao setor de transporte em trâmite na 3ª
Promotoria de Justiça de Tutela Coletiva da Cidadania da Capital,
da qual era o titular. Ele teria evitado que tais casos se
transformassem em ações civis públicas.
Carlos
Antônio Navega
Segundo
Teixeira, Navega teria recebido, como advogado, propina para
conseguir com sua ex-mulher, juíza Roselin Nalin, decisões
favoráveis aos empresários de ônibus. Navega foi procurador-geral,
presidente da Associação do Ministério Público, corregedor-geral
e decano da instituição.
CONSELHEIROS
DO TCE-RJ
SEIS
CONSELHEIROS PRESOS
CONSELHEIROS
DO TCM DO RIO
“Após
o atendimento de várias exigências pela Prefeitura e pelos
consórcios vencedores da licitação, houve negociações para
pagamento de propina para o conselheiro Antônio
Carlos Flores”,
delata Lélis.
Além
de Antônio Carlos Flores, o conselheiro Nestor
Guimarães Martins da Rocha
também votou para arquivar o processo na Corte de Contas. Segundo
Lélis, Nestor da Rocha também tinha relações com os empresários.
O
delator da Lava Jato Rio também afirma que tinha conhecimento do
pagamento de propina ao conselheiro e ex-presidente da Câmara de
Vereadores do Rio Ivan
Moreira dos Santos,
que teria votado a favor da Fetranspor em processo no TCM sobre o
rateio das gratuidades das passagens em troca de uma mesada de R$ 60
mil.
CÂMARA
DE VEREADORES DO RIO DE JANEIRO
Na
Câmara do Rio, o ex-presidente da Fetranspor disse que 15
vereadores e ex-vereadores teriam recebido de R$ 6 mil a R$ 8 mil por
mês pra defender interesses do setor e impedir o avanço de CPIs que
investigassem as empresas de ônibus. No
entanto, presidentes de comissões ganhavam o dobro, e o presidente
da Casa um valor ainda maior, que não foi revelado pelo delator.
Entre
eles, os ex-presidentes da casa, Sami Jorge, que já morreu, Ivan
Moreira, atualmente conselheiro do Tribunal de Contas do Município,
e o atual presidente Jorge Felippe, do MDB.
Lélis
Teixeira contou
que a Fetranspor gastava cerca de R$ 400 mil mensais em propinas com
a Câmara de Vereadores do Rio de Janeiro.
Os pagamentos duraram até 2015.
Foram
citados, como aqueles que recebiam mesadas, os vereadores:
Jorge
Felippe,
Ivan
Moreira,
Jimmy
Pereira,
Jorge
Braz,
Jorginho
do SOS,
Luiz
Carlos Ramos,
Marcelino
D’almeida,
Renato
Moura,
Sebastião
Ferraz,
Vera
Lins,
Marcelo
Piuí,
Verônica
Costa
e
Jorge Mauro.
CONTROLE
DE CPI
Lélis
contou detalhes de um plano que teria sido arquitetado com o
presidente da Câmara do Rio, Jorge Felippe (MDB),
e um grupo de vereadores da base do governo, para controlar uma CPI
que estava sendo criada para investigar os contratos entre a
prefeitura e os consórcios que venceram em 2010, a licitação para
operar o sistema. A CPI foi criada em 2013, em meio aos
protestos em todo o Brasil contra o reajuste das tarifas de ônibus.
No relato, Lélis afirmou que três vereadores que
integrariam a CPI teriam recebido propina para que as investigações
não contrariassem os interesses do setor. No depoimento, ele citou
como beneficiários dois políticos que hoje estão sem mandato:
Jorginho
da SOS
e Professor Uoston.
O terceiro foi vereador licenciado e atual secretário municipal de
Trabalho do prefeito Marcelo Crivella, Renato
Moura (PDT).
‘’Os
empresários do setor foram surpreendidos com a instalação da CPI,
uma vez que boa parte dos Vereadores recebia caixinha mensal (...)
mas alguns traíram o compromisso de votar sempre de acordo os
interesses dos setor’’, diz um dos trechos do documento. Autor do
pedido da CPI de 2013, o ex-vereador e hoje deputado
estadual Eliomar Coelho (PSOL) diz que as declarações
de Lélis ajudam a esclarecer porque as investigações não
prosperaram há seis anos.
— A
situação foi estranha. Quem propôs a CPI fui eu. A oposição
tinha direito a mais vagas. Mas a proporcionalidade na composição
não foi respeitada de forma arbitrária. Essa delação ajuda a
explicar as coisas — disse Eliomar.
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