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Publicado
DESPACHO / DECISÃO em 01/07/2021 (92) 01/07/202105:33
HABEAS
CORPUS Nº 676200 - RJ (2021/0197904-6)
RELATOR
: MINISTRO SEBASTIÃO REIS JÚNIOR
IMPETRANTE
: IGNACIO AUGUSTO MACIEL MACHADO E OUTROS ADVOGADOS : CARLOS EDUARDO
MACHADO - RJ043406
RAFAEL
LUIZ DUQUE ESTRADA - RJ145385
JÉSSYCA
TEIXEIRA DE MORAES SILVA - RJ206825
IGNACIO
AUGUSTO MACIEL MACHADO - RJ229767
NATAN
AGUILAR DUEK - RJ228181
IMPETRADO
: TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO
PACIENTE
: LORRAM GOMES DA SILVEIRA (PRESO)
INTERES.
: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO
DECISÃO
Trata-se
de habeas corpus, com pedido liminar, impetrado em benefício de
Lorram Gomes da Silveira – preso preventivamente pela prática, em
tese, dos delitos de organização criminosa, corrupção
passiva majorada por 5 vezes, uso de documento
falso por 4 vezes, falsificação de documento
público por 4 vezes e estelionato por 4
vezes – contra ato coator do Tribunal de Justiça do
Rio de Janeiro, que manteve a segregação cautelar decretada pelo
Juízo de Direito da 1ª Vara da comarca de Armação dos Búzios/RJ,
na denominada Operação Plastógrafos (Autos n. 000707-
88.2021.8.19.0078).
Alega-se,
em síntese, constrangimento ilegal na
decretação e na manutenção da prisão preventiva do paciente, ao
argumento de insuficiência de fundamentação e ausência
de contemporaneidade.
Sustenta-se
que a prisão preventiva do paciente se deu amparada exclusivamente
nas delações dos Srs. Thiago e Jonatas. Alerta-se que os
únicos elementos novos desde a não inclusão do Sr. Lorram na
denúncia oferecida em fevereiro de 2020 até o oferecimento da
segunda denúncia foram as delações dos corréus (fl.
15).
Argumenta-se
que, quando do decreto prisional, o paciente não exercia nenhum
cargo na Prefeitura de Búzios, pelo contrário, é um vereador
do grupo político de oposição ao atual Prefeito eleito em
2020 (fl. 19).
Postula-se,
então, a concessão liminar da ordem para que seja revogada a prisão
preventiva imposta ou substituída por medidas alternativas.
É
o relatório.
De
início, o Magistrado singular, ao decretar a prisão preventiva do
acusado, consignou (fls. 242/245 – grifo nosso):
[...]
Em segundo lugar, a prisão do acusado deve ser decretada
por conveniência da instrução processual.
Aqui
residem os argumentos de maior gravidade e concretude, que atribuem à
sua prisão o caráter da necessidade contemporânea de
sua decretação, arrostando qualquer alegação de tratar-se
de medida antecipatória da pena.
O
primeiro argumento é de ordem indutiva, apesar de se basear em fatos
concretos praticados pelo réu, diretamente relacionados a este
processo.
Conforme
ficou consignado nos interrogatórios judiciais dos acusados Thiago e
Jonatas, o acusado Lorram, ao tomar conhecimento do início das
investigações policiais sobre a chamada "máfia dos alvarás",
sem qualquer pedido dos réus passou a encaminhar
advogados para realizarem suas defesas, advogados esses que,
conforme informado em Juízo, a todo tempo diziam que os investigados
deveria excluir toda responsabilidade de Lorram.
Ao
sentir deste Juízo, a intenção do acusado Lorram não era outra,
que não, dissimular os fatos e se isentar da responsabilidade pelos
crimes a respeito dos quais há indícios veementes de sua
participação.
Por
que outro motivo, então, teria o acusado patrocinado toda
a defesa dos investigados, que afirmam terem sido instruídos
somente para não fazerem qualquer menção ao mesmo, sendo certo que
nenhum dos patronos daquela ocasião atua, atualmente, na defesa dos
réus, que amargam mais de um ano de prisão preventiva, sem que
aquele que afirmam ter sido o grande mentor dos crimes, tenha sofrido
qualquer consequência por suas condutas.
Não
bastasse isso, o réu também procurou a testemunha Denize
Tonami, uma das vítimas da malta, logo após seu depoimento
perante o GAECO, ávido por saber o que ela havia dito para os
Promotores responsáveis pelas investigações, também com o
manifesto intento de interferir na produção da prova e condução
do processo.
Os
coautores dos crimes, Thiago e Jonatas, afirmaram que temem por suas
vidas e de suas famílias, e que, ainda no cárcere, teriam recebido
recados para que se atentassem ao que diriam em seus depoimentos, sob
pena de represálias.
O
mesmo foi dito pela vítima Sr. Maurino Pacífico Campos,
que, ouvido pelo Ministério Público, afirmou "ter medo de
sofrer represálias, por conta de seu depoimento, por envolver
pessoas poderosas na cidade e pelo fato de o grupo ser maior do que o
declarante imaginada".
Porém,
o temor das vítimas e testemunhas não se resume à conjecturas e
probabilidades.
Ocorre
que, este Juízo foi informado, por petição dirigida pela Douta
Advogada de Thiago Silva Soares, delator do acusado Lorram, que o
temor revelado ao Juízo em seu interrogatório se concretizou, e
o acusado foi espancado em sua cela na prisão,
estando atualmente internado para realização de cirurgia em um dos
seus braços, fraturado no momento da agressão.
Segundo
informa, ao ser agredido por outro detento, ainda não identificado,
o agressor teria dito a Thiago que a violência sofrida tinha por
motivação sua delação, e que, agora, o acusado deveria ter mais
cuidado com suas palavras.
O
relato desses fatos e de outros se encontra na gravação da oitiva
de Tiago, realizada logo após a revogação de sua liberdade,
perante o Ministério Público.
Nela,
Tiago reafirma, agora assistido por sua advogada e perante o Promotor
de Justiça Dr. Rafael Dopico, titular da 1ª Promotoria desta
Comarca, que ao ser agredido no presídio foi efetivamente advertido
que a violência aconteceria em razão de sua delação.
As
palavras de Tiago são estarrecedoras. Especificamente no
tocante à necessidade da prisão preventiva, não
bastasse a violência sofrida no presídio, cujo contexto é
eloquente em conduzir ao réu Lorram os indícios de autoria, também
há relatos de ameaças através de interposta pessoas, no cárcere,
e até mesmo recados enviados por intermédio da esposa de Tiago,
tudo com o claro intuito de incutir medo na testemunha e se esquivar,
assim da aplicação da lei.
Poucas
vezes este Juízo esteve frente a elementos tão fortes de convicção,
que demonstrassem tão claramente a necessidade de prender
uma pessoa preventivamente, tanto pela probabilidade de
reiteração delitiva, quanto para garantir a segurança de
testemunhas e do processo.
Todos
esses fatos dão conta de que o risco que o acusado Lorram representa
para a instrução do processo e para a sociedade são evidentes,
reais, se baseiam em fatos concretos, atuais, e não em elementos
genéricos ou meras suposições do Ministério Público.
Em
liberdade, sua conduta já sinaliza que poderá influir no âmbito
das testemunhas, vítimas, destruir provas, como já o fez, e até
mesmo praticar atos violentos contra pessoas que se ponham em seu
caminho, o que reforça a necessidade de sua prisão, tanto como
forma de garantir a ordem pública, quanto
por absoluta conveniência da instrução processual.
Veja-se
que os coautores dos crimes imputados ao acusado, assim como as
testemunhas, foram ouvidos em processo em que o acusado não figurou
como parte, portanto, em relação a este último, as provas não
foram submetidas ao contraditório, o que exige a renovação de toda
a instrução, nestes autos, como forma convolar em provas, aquilo
que, até este momento, são apenas indícios, mas
veementes ao ponto de fundamentar legitimamente o decreto prisional.
Diante
de todo o exposto, DECRETO A PRISÃO PREVENTIVA DO ACUSADO LORRAM
GOMES DA SILVEIRA. [...]
Acerca
da questão, a Corte estadual assim destacou (fls. 69/70 – grifo
nosso): [...]
Demais
disso noticia-se nos autos intimidação e ameaças a
testemunhas, circunstância que se reveste de extrema
gravidade, não podendo o Judiciário ficar inerte ante tal estado de
coisas.
O
paciente empreendeu fuga, ao saber que o cumprimento de
mandado de prisão e busca e apreensão em seu desfavor teria
cumprimento em instantes.
Tal
iniciativa mostra-se, d. v., deplorável, mormente
quando perpetrada por um homem público em quem a população do
Município confiou seu voto para representá-la.
Não
se mostra razoável que um Vereador seja apontado como integrante de
uma malta; que fuja ao saber que seria preso por ordem judicial,
desafiando determinação de um Magistrado, sendo certo que tem
dentre seus inúmeros compromissos para com a população que o
elegeu de pautar sua vida e seus atos pela licitude, pela
probidade, pelo acatamento às determinações
legais. [...]
Compulsando
os autos, observei que, aparentemente, o paciente ainda seria
detentor de mandato público eletivo, eleito vereador pela terceira
vez no ano de 2020, demonstrando possuir inegável
influência política [...] na região (fls. 213/214).
Assim,
da atenta análise dos trechos transcritos observo que os fatos
imputados são graves e relevantes as
considerações realizadas pelo Magistrado singular a respeito da
gravidade concreta das condutas atribuídas ao paciente, que aparece
em papel de destaque na suposta organização criminosa, e da quantia
supostamente desviada do erário público, principalmente no atual
cenário de pandemia causado pelo novo coronavírus.
Contudo,
ponderando os elementos em análise, entendo que a substituição da
medida extrema por cautelares alternativas é medida que se
mostra eficaz a evitar a reiteração delitiva,
eventual interferência na instrução criminal e garantir a
aplicação da lei penal.
Primeiro,
porque, como a defesa peticionou há pouco nos autos informando
o pedido de licença do cargo público (fls.
396/398), bastaria o afastamento dele e a suspensão do exercício
das atividades, para que as atividades
delituosas a ele concernentes fossem cessadas ou mesmo dificultado o
modus operandi.
Depois,
porque, além de realizadas buscas, apreensões e bloqueios de bens e
direitos, conforme ressaltado na própria decisão que impôs a
segregação cautelar, parecem ser suficientes certas
restrições como a suspensão da atividade, proibição
de acesso às dependências de determinados lugares e o contato entre
corréus, para impedir possível conduta de interferir na instrução
criminal.
Também
existe medida alternativa capaz de impedir a fuga do
acusado e garantir a futura aplicação da lei penal.
Por
fim, deve ser considerada a situação particular do paciente,
de primário e possuidor de bons antecedentes,
razão pela qual vislumbro, por ora, portanto, a aplicação das
seguintes medidas alternativas à
prisão:
a)
comparecimento mensal em juízo para informar e justificar suas
atividades;
b)
proibição de acesso ou frequência a qualquer dependência da
Administração Pública de Búzios/RJ, bem como de quaisquer dos
estabelecimentos supostamente lesionados;
c)
proibição de manter contato com qualquer corréu ou testemunha de
acusação da ação penal, exceto familiares;
d)
proibição de se ausentar da comarca de sua residência sem
autorização judicial, mediante entrega de passaporte;
e)
recolhimento domiciliar no período noturno e nos dias de folga; e
f)
suspensão do exercício do cargo público.
Em
face do exposto, defiro o pedido liminar para substituir a prisão
cautelar imposta ao paciente na Ação Penal n.
000707-88.2021.8.19.0078, por medidas
alternativas à prisão previstas no art. 319, I,
II, III, IV, V e VI, do Código de Processo Penal, que deverão ser
implementadas e fiscalizadas pelo Magistrado singular, a quem caberá
decidir qualquer pedido de flexibilização/adequação das medidas
impostas, bem como restabelecer a prisão cautelar, caso descumprida
qualquer medida.
Comunique-se
com urgência.
Solicitem-se
informações pormenorizadas ao Juízo de Direito da 1ª Vara da
comarca de Armação dos Búzios/RJ acerca do cumprimento da presente
decisão, bem como do atual andamento da ação penal, a serem
prestadas, preferencialmente, pela Central do Processo Eletrônico -
CPE do STJ.
Após,
encaminhem-se os autos ao Ministério Público Federal para parecer.
Publique-se.
Brasília,
29 de junho de 2021.
Ministro
Sebastião Reis Júnior
Relator
Fonte:
STJ
Observação: os
grifos são meus