Rodrigo
Janot em evento da Escola Superior do MPU:
"Colegas,
A
Lava Jato completou neste mês de março três anos de profícuos
trabalhos. Do que se revelou no curso das investigações, é
possível concluir que existem basicamente duas formas de corrupção
no país: a econômica e a política. Elas não se excluem e, em
certa medida, tocam-se e interagem.
A
primeira, sempre combatida e bem conhecida do Ministério Público,
tem fundamentalmente uma finalidade financeira: o corrupto busca o
enriquecimento com a venda de facilidades. Normalmente, esse tipo de
corrupção encontra-se em profusão nas camadas inferiores da
estrutura burocrática do Estado.
A
segunda, até então mais intuída do que propriamente conhecida, é
ambiciosa e mais lesiva. O proveito econômico não está na sua
alçada principal, mas antes o poder. Enriquecer pela corrupção
política é mais uma consequência do que propriamente um objetivo.
Busca-se o poder, porque o dinheiro e suas facilidades chegam de
arrasto. O mérito da Lava Jato foi haver encontrado o veio principal
da corrupção política. Esse tipo de corrupção, como disse, é de
altíssima lesividade social porque frauda a democracia
representativa, movimenta bilhões de reais na clandestinidade e
debilita o senso de solidariedade e de coesão, essenciais a uma
sociedade saudável.
Escolhas
para altos postos na estrutura do Estado, nas suas autarquias e
empresas passam a não considerar a competência técnica do
candidato, mas sua disposição para trabalhar na engrenagem
arrecadadora de recursos espúrios destinados à máquina partidária
que o apadrinhou. Desde o mensalão, essa realidade já começava a
revelar seus contornos com mais nitidez. No entanto, foi nesses
últimos três anos que a dura e inocultável verdade se mostrou por
completo: nosso sistema político-partidário foi conspurcado e
precisa urgentemente de reformas.
É
necessário abrir espaço para a renovação o quanto antes, pois a
política não pode continuar a ser uma custosa atividade de risco
propícia para aventureiros sem escrúpulos. Certamente, essa crise
política há de encontrar o devido equacionamento no âmbito do
próprio sistema democrático. Serão as forças políticas da
sociedade, dentro da institucionalidade, que, após debate e
reflexão, devem apontar caminhos para que levem à quebra do círculo
vicioso em que o país se encontra.
A
nós do Ministério Público cabe um papel modesto nesse processo,
mas de grande relevância social. Devemos dar combate, sem tréguas,
ao crime, à corrupção e às tentativas de fraudar-se a lisura do
processo eleitoral. É nesse contexto que o papel dos senhores,
Procuradores Regionais Eleitorais, avulta em importância
institucional. Muitos dos desvios do poder político podem e devem
ser prevenidos e reprimidos, quando for o caso, já no processo
eleitoral.
Precisamos
intensificar, assim, a fiscalização do financiamento das campanhas,
combater firmemente o caixa 2 e promover obstinadamente a
responsabilização de quem não respeita o fair play do jogo
democrático e abusa do poder econômico e político para vencer
ilegitimamente eleições. O filtro do processo eleitoral, do qual o
Ministério Público é importante componente, é fundamental para
melhorar a qualidade de nossa política. Não é fácil a nossa
missão, bem o sei. Para mim, já se vão 32 anos de árdua labuta
nesta Casa.Tenho afirmado reiteradamente que o Ministério Público
não engana a ninguém e não costuma vender ilusões ou fantasias.
Quem busca atalhos e facilidades, de fato, não terá aqui o melhor
lugar para encontrá-los.
Digo
isso porque, mesmo quando exercemos nossas funções dentro da mais
absoluta legalidade,estamos sujeitos a severas e, muitas vezes,
injustas críticas de quem teve interesses contrariados por nossas
ações. A maledicência e a má-fé são verdugos constantes e
insolentes.Não quero deter-me no fato específico, mas não posso
deixar de repudiar com toda veemência a aleivosia que tem sido
disseminada para o público nos últimos dias: é uma mentira, que
beira a irresponsabilidade, afirmar que realizamos, na
Procuradoria-Geral da República, coletiva de imprensa para “vazar”
nomes da Odebrecht.
Só
posso atribuir tal ideia a mentes ociosas e dadas a devaneios, mas,
infelizmente, com meios para distorcer fatos e desvirtuar
instrumentos legítimos de comunicação institucional. Refutei
pessoalmente o fato para os próprios representantes do veículo de
comunicação que publicou a matéria inverídica. Procuramos nos
distanciar dos banquetes palacianos. Fugimos dos círculos de
comensais que cortejam desavergonhadamente o poder político. E
repudiamos a relação promíscua com a imprensa.
Ainda
assim, meus amigos, em projeção mental, alguns tentam nivelar a
todos à sua decrepitude moral, e para isso acusam-nos de condutas
que lhes são próprias, socorrendo-se não raras vezes da aparente
intangibilidade proporcionada pela posição que ocupam no Estado.
Infelizmente,
precisamos reconhecer que sempre houve, na história da humanidade,
homens dispostos a sacrificar seus compromissos éticos no altar da
vaidade desmedida e da ambição sem freios. Esses não hesitam em
violar o dever de imparcialidade ou em macular o decoro do cargo que
exercem; na sofreguidão por reconhecimento e afago dos poderosos de
plantão, perdem o referencial de decência e de retidão. Não se
impressionem com a importância que parecem transitoriamente
ostentar.
No
fundo, são apenas difamadores e para eles, ouvidos moucos é o que
cabe e, no limite, a lei. Não somos um deles, e isso já nos
basta.Para encerrar, compartilho com os senhores a advertência do
mestre Montesquieu que sempre tive presente comigo: o homem público
deve buscar sempre a aprovação, mas nunca o aplauso. E, se o busca,
espera-se, ao menos, que seja pelo cumprimento do seu dever para com
as leis; jamais por servilismo ou compadrio."
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