O prefeito
de Sucupira quer viajar como sempre faz nos meses de maio-junho. Pra Disney.
Não sei por que, mas ele adora a Disney. Mas tem um probleminha. Ele não quer
que o vice assuma, porque brigou com ele. Na última viagem, o vice teve a
ousadia de entregar os boletins oficiais (fraudados) com páginas a mais que
estavam estocados na Prefeitura para os membros da CPI do BO. Vê se pode? Seu gesto foi considerado alta traição! Como
então viajar e ele não assumir?
Foi então
que surgiu a ideia de recorrer aos préstimos da Procuradoria. Como lá não tem
nenhum Procurador concursado, as coisas ficaram fáceis. Funciona como uma Procuradoria particular, do Prefeito. Estão sempre dispostos
a criar algum jeitinho legal para agradar a quem lhes deu emprego. Não é que alguém de lá teve a brilhante ideia
de propor simetria da nossa Lei Orgânica com a Constituição Federal no que se refere à questão da viagem ao exterior. No governo Federal, o Presidente viaja à vontade
para o exterior sem ter que dar a mínima satisfação ao Congresso nacional, desde que em
viagens inferiores a 15 dias. Logo nossa Lei Orgânica que obriga o Prefeito a
pedir autorização para viajar é inconstitucional, segundo os brilhantes procuradores.
Foi o pulo do gato. Estava armado o estratagema para que o Prefeito viajasse e
o Vice não assumisse. Faltava apenas a colaboração da Câmara de Vereadores de Sucupira.
Passo inicial: enviar à douta Câmara de Vereadores
de Sucupira proposta de emenda constitucional alterando a Lei Orgânica Municipal, adaptando-a
ao que diz a Constituição Federal de 1988.
Até jurisprudência do Supremo Federal foi apresentada como
justificativa. Trata-se do caso do Município de Betim (MG), em que o Prefeito entrou
com recurso especial contra a Câmara de Vereadores do Município, para não ter
que pedir autorização à Casa Legislativa para viajar ao exterior por prazo
inferior a 15 dias. O Prefeito entrou com recurso contra a Câmara de Vereadores
de lá e ganhou. Aqui, a Câmara aquiesceu, de pronto, à vontade do Prefeito,
emendando a Lei Orgânica Municipal “de modo irresponsável e oportunista”,
segundo o Juiz Dr. Marcelo Villas (ver sentença no processo nº 0002178-52.2015.8.19.0078).
Mas havia um
pequeno detalhe que não devia ser revelado. Em Brasília, nesses casos de
viagens internacionais do Chefe do Poder Executivo, o Vice sempre assume republicanamente. E,
registre-se, a agenda de viagens nacionais e internacionais do Presidente da
República, sempre divulgada com antecedência razoável, é pública.
Passo dois:
como Búzios tem pouca ou nenhuma transparência, e muito menos possui agenda de
viagens do Prefeito divulgada publicamente e com antecedência, o negócio seria
o Prefeito viajar escondidinho, sem que ninguém soubesse. A necessidade de ter
que pedir autorização para viajar denunciava a viagem. Entrava na pauta do Legislativo. Tendo acabado com essa
exigência, e sem incluir de imediato a necessidade de comunicação à Câmara, os vereadores de
Sucupira, objetivamente, facilitaram a viagem sigilosa do Prefeito. O que foi feito no dia 28/05. O Prefeito parte para Orlando, Flórida. Como
disfarce, seu carrão é deixado no estacionamento da Prefeitura durante o
horário de expediente. Assim, todos pensariam que ele estava trabalhando.
As coisas
estavam correndo bem. A cidade ficou desgovernada por 5 dias, mas tudo bem. Não se sabe "quem
administrou a Prefeitura nesses dias, qual o Chefe do Poder Executivo que responde
informações requisitadas pelo Poder Judiciário ou pelo Ministério Público, quem
toma decisões importantes nas hipóteses de emergência ou calamidade, quem toma
decisões políticas nas hipóteses de greve de servidores municipais (registro: a Guarda Municipal protestou pelas ruas na segunda, dia 2), quem toma
decisões no dia-a-dia da Administração Pública Municipal e na gestão da coisa
pública?". (Juiz de Búzios, Dr. Marcelo)
Ninguém sabia de nada. Nenhum munícipe imaginava que o seu Prefeito estava em
outro país. Muito menos o que ele fora fazer lá. Viagem oficial,
a negócios ou a passeio? Será que os
vereadores de Sucupira sabiam do paradeiro daquele cujos atos têm a obrigação
legal de fiscalizar? Quem governava em seu lugar? O Kleber?
Passo três:
como a alteração da lei orgânica repercutiu muito mal nas redes sociais, com as
pessoas achando que ela não passava de uma pegadinha legal para permitir que o
Prefeito viajasse sem que o vice assumisse, os
sete vereadores da base- os dois eleitos
e os cinco “enrustidos” (de acordo com o vereador Felipe Lopes)-
resolveram emendar a emenda- que sempre fica pior que o soneto-, acrescentando
algo que o povo acredita que já deveria ter sido acrescentado na primeira
emenda: a necessidade de comunicação da viagem à Câmara de Vereadores. Afinal,
não temos uma agenda pública de viagens do Prefeito como tem o Presidente da
República. E o Prefeito já criara um bafafá jurídico tremendo ao viajar
anteriormente sem querer que o vice assumisse, com base em um Decreto
Legislativo “eivado de nulidade e inconstitucionalidade”, segundo avaliação do
Juiz de Búzios Dr. Marcelo Villas (ver sentença citada acima). Outros gestos deste mesmo teor em apoio ao Prefeito
já foram aprovados na Casa legislativa, como a elaboração de uma Certidão que atestava o
recebimento dos Boletins Oficiais com as páginas a mais nas quais as licitações
eram fraudadas, com o objetivo único de desmentir uma CPI em andamento.
Passo
quatro: empurrar com a barriga, o máximo possível, a aprovação da alteração que
obriga a comunicação da viagem do Prefeito à Câmara, fazendo-a coincidir com a
volta dele. Como a votação da emenda se dá em dois turnos- e tem um feriado no
meio do caminho- não foi difícil estabelecer uma data – terça-feira próxima
(9)- para a votação do segundo turno. O prazo de que goza o Prefeito para ficar
fora do país- 14 dias- se esgota justamente próximo a essa data- na
quarta-feira (10).
O problema é
que “deu ruim” em Sucupira. A viagem vazou e o Vice peitou a situação não abrindo
mão de exercer o seu direito de assumir o cargo. Ao conceder-lhe mandado de
segurança, o Juiz de Búzios, Dr. Marcelo Villas, pôs as coisas nos seus devidos
lugares: se o Prefeito viaja para o exterior, o Vice assume e ponto final. Cabe
agora ao Ministério Público apurar responsabilidades dos atores participantes da
pegadinha legal para que Búzios deixe de ser Sucupira.
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