Colégio Estadual João de Oliveira Botas, foto da página do Facebook de Luísa Barbosa |
No
final do dia 19 de fevereiro a comunidade escolar de Armação dos
Búzios dormiu mais tranquila. O juiz Dr. Danilo Marques Borges
deferiu a ação civil pública (ACP) com pedido de tutela de
urgência em face ao Município, para que este reestabeleça as vagas
extintas no ensino médio do CM Paulo Freire e INEFI. O
reconhecimento da Justiça para com o Ministério Público, clamado
como intermediador pela comunidade escolar, é uma conquista a ser
celebrada, mas está longe de se qualificar como uma grande vitória
da cidade. O problema é muito mais sério. Envolve o esvaziamento da
escola enquanto espaço de conhecimento, os elevados índices de
repetência e a altíssima taxa de evasão escolar que assola o
Brasil e, principalmente, a cidade turística de Armação dos
Búzios.
O
compromisso elementar de qualquer gestor público com a escolarização
é o de incutir tolerância zero quanto à ausência de uma criança
ou adolescente das unidades de ensino. Muitos são os fatores
que determinam a não realização de matrícula ou a interrupção
dos estudos, e estes devem ser diagnosticados atentando às
especificidades de municípios, escolas, turnos e turmas. As
consequências da não inclusão, como sabemos, são nefastas, com
prejuízo econômico, social e principalmente humano. O lamentável é
verificarmos que este problema está sendo passivamente assimilado e
tolerado por escolas e sistemas de ensino que admitem matrículas de
um número mais elevado de alunos por turma já esperando pelas
"desistências" ao longo do ano letivo. Ou, mais grave
ainda, observar a conformação pela menor procura por matrículas
apesar de uma demanda potencial, invertendo a gravidade da
exclusão/evasão à solução para redução de despesas. Esquiva-se
assim, da responsabilidade pela formação cidadã e o combate às
desigualdades sociais. Tal lógica também tem justificado a redução
drástica de vagas destinadas à Educação de Jovens e Adultos
(EJA), modalidade consagrada constitucionalmente, fundamental para a
qualificação da população mais velha e mais pobre da cidade, que
vem sofrendo reduções progressivas de vagas nos últimos anos.
Dificulta-se
o acesso, não qualifica-se os programas de ensino e a
responsabilidade da desistência recai tão somente sob os ombros dos
estudantes que desistem de estudar. Preferem a rua, a praça, a
praia. Isso é problema nosso, não pode ser visto como solução
para equilíbrio de contas. É problema do Executivo, Judiciário,
Comunidade Escolar e Sociedade Civil.
A
evasão vem sendo tratada como uma medida a ser combatida pelos
dirigentes municipais de educação do Brasil, fora de Búzios. A
União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação
(Undime), o Fundo das Nações Unidas para a Infância
(UNICEF) em parceria com o Colegiado Nacional de Gestores Municipais
de Assistência Social (Congemas) e o Instituto TIM lançaram em 2016
o programa Busca Ativa Escolar.
A intenção é apoiar os governos na identificação, registro,
controle e acompanhamento de crianças e adolescentes que estão fora
da escola ou em risco de evasão. Por meio do programa, municípios e
estados terão dados concretos que possibilitarão planejar,
desenvolver e implementar políticas públicas que contribuam para a
inclusão escolar. A adesão ao programa pode ser um primeiro passo
para um diagnóstico preciso na nossa cidade e a reversão desse
problema que percebemos a olho nu. Dados apresentados pelo Ministério
Público em 2016, em ação movida contra o Município, mostram que
cerca de 61% dos alunos em idade escolar para o Ensino Médio, estão
fora da escola. Um segundo passo é transformar todo esse movimento
em defesa da educação pública em Búzios num fórum
permanente de educação.
O
conceito empregado não é o de esperar passivamente a matrícula por
parte dos estudantes, mas o de mobilizar esforços para detecção
desses que estão fora do ambiente da escola, em qualquer que seja a
idade, caso haja demanda. Como dizia Paulo Freire, se sozinha a
educação não muda a sociedade, sem ela, tampouco a sociedade muda.
Revendo
os fatos:
A
prefeitura do Município de Armação dos Búzios e sua Secretaria de
Educação no final de 2017 e início de 2018, sem diálogo e sem um
real diagnóstico dos problemas e suas consequências, deliberou
fechar praticamente todas as turmas dos cursos noturnos de Ensino
Médio e da Educação de Jovens e Adultos, sob a alegação ou de
cortes de despesas ou da pueril “inconstitucionalidade” de a rede
municipal atender ao Ensino Médio. No caso da EJA da E.M Ciléa
Barreto, após encerrar turmas do fundamental I, extinguiram todas as
seis turmas do curso noturno, apenas comunicando a ação nos
Conselhos Escolares finais de dezembro, quando a escola já planeja
ações visando o ano subsequente. A redução também atingiu a E.M
Nicomedes que teve sua oferta de vagas da EJA reduzida pela metade. O
mais contraditório nesse caso é que nem mesmo a justificativa de
diminuição “gastos” se vale, uma vez que professores efetivos
estão com carga horária sobrando e a escola estará aberta no
noturno com as demais despesas correndo. Qual a lógica?
Por
sua vez, as turmas do Ensino Médio municipal estão sendo extintas.
Seis turmas do noturno da Rasa, do INEFI, fundamental para população
do bairro, foram encerradas sob a alegação de que teriam vagas no
noturno do Paulo Freire. Mais uma vez, decisão tomada sem nenhum
diálogo com uma comunidade escolar que encontra no próprio governo
um obstáculo a mais para continuar em seu já hercúleo processo de
formação escolar. Por fim, para as turmas do noturno do Colégio
Municipal Paulo Freire e outras diversas turmas do turno da tarde o
golpe ocorreu em meados de JANEIRO, mês consagrado às férias
escolares e momento que a cidade recebe milhares de turistas que são
fonte de renda para parcela significativa dos estudantes da rede
pública de ensino. Descoberto por alguns funcionários ao longo
deste período, nem mesmo estudantes matriculados em seus respectivos
turnos haviam sido comunicados. Em todos esses casos verificamos duas
atitudes frente à população: o descompromisso com o básico que é
do oferecimento de vagas, a negligência com os cenários de
exclusão/evasão, e a postura autoritária e rapinesca de aguardar o
momento considerado mais oportuno à desmobilização sobre decisões
que comprometem o presente e futuro da população buziana. Não
existe justificativa para que estas ações tenham sido realizadas
desta forma e não de outra.
O
movimento tão somente deseja o básico que é a manutenção das
vagas existentes em 2017, seja as do Ensino Médio municipal seja da
Educação de Jovens e Adultos para, a partir desse ponto, abrir um
diálogo para democraticamente enfrentarmos o
Problema da exclusão e evasão
escolar no município de Armação dos Búzios. Problema que não
fugimos e encaramos como responsabilidade de todos, seja pela
estrutura oferecida, pelas metodologias de ensino empregadas ou
outros fatores sociais e pedagógicos que distanciam os estudantes de
concluírem com qualidade esta etapa de vida essencial ao conjunto
social de Armação dos Búzios. Fórum permanente de educação
urge, assim como a democratização do espaço escolar com
fortalecimento dos Conselhos Escolares e eleição para diretores das
unidades de ensino. O Plano Municipal de Educação, por ora
esquecido, contempla estes dispositivos entre outras ações que
estão exatamente na contramão das últimas deliberações
anunciadas pela prefeitura municipal.
Luisa Barbosa e Water Marcelo
Luisa é doutora em sociologia (UFRJ) e professora de sociologia e filosofia. Walter Marcelo é mestre em História (UFRJ) e professor de história. Ambos lecionam no C.M Paulo Freire turno noturno.
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