O
Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro, tendo em vista a
completa desfiguração sofrida pelo Projeto de Lei nº 4.850/16, em
votação ocorrida nesta madrugada (30/11/16) na Câmara dos
Deputados, vem a público denunciar a trama urdida para inviabilizar
as investigações e a responsabilização de corruptos e
corruptores, colocando-os a salvo da atuação do Ministério Público
e do Judiciário.
A
versão original do aludido projeto, que contou com mais de dois
milhões de assinaturas, propôs a introdução, em nosso ordenamento
jurídico, das chamadas "10 medidas contra a corrupção".
Tais propostas visam justamente a conferir às instituições
responsáveis pelo combate a essa verdadeira chaga nacional, os
instrumentos jurídicos necessários para que os resultados dessa
luta possam ser efetivos (e não ilusórios).
Contudo,
na calada da noite, em meio ao torpor provocado pelo triste acidente
aéreo que vitimou a delegação de futebol da Chapecoense, a Câmara
dos Deputados, valendo-se do desvio das atenções do povo e da
imprensa para esse desastre terrível, cravou no peito da cidadania o
mais cortante punhal que a história do país registra, desprezando a
honestidade, a decência e o anseio por justiça.
Ao
invés de aprovar as medidas que permitiriam o avanço no combate à
corrupção, a Casa rejeitou importantes medidas contidas no projeto,
como a criação do programa de incentivo à delação, as medidas de
proteção ao delator, a devolução dos valores havidos ilegalmente
como condicionante para benefícios penais (progressão de regime,
livramento condicional e indulto) e a facilitação do acordo de
leniência, entre outros pontos relevantes.
Por
outro lado, os deputados introduziram instrumentos de retaliação ao
Ministério Público e à Magistratura, mecanismos estes que, na
prática, tornarão inviáveis as investigações e as condenações
dos responsáveis por corrupção, desvios e atos de improbidade. A
pretexto de combater o abuso de autoridade de promotores,
procuradores e magistrados, o texto aprovado criminaliza condutas
praticadas no curso de investigações e de atos instrutórios,
criando tipos penais de absoluta imprecisão e subjetivismo
interpretativo, além de impor aos membros do Ministério Público o
dever de indenizar investigados por danos materiais e morais
decorrentes das investigações.
Tais
"ameaças", encobertas pelo manto da aparente legalidade,
inviabilizarão as investigações, ao mesmo tempo em que servirão
de salvaguarda aos interesses dos corruptos, que se sentirão mais
confortáveis e seguros para dar continuidade à sua pilhagem da
riqueza nacional. Não é apenas o fim da Lava-Jato. É o fim de
todas as investigações e o triunfo da corrupção.
Por
tudo isso, o Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro
conclama a todos para que se levantem contra esse "filme de
horrores" protagonizado pela Câmara de Deputados, a nós
irmanando-se também a imprensa, a sociedade civil organizada e
aqueles que ainda acreditam em valores como dignidade, honra e
honestidade, nessa cruzada nacional que terá, agora, como palco, o
Senado Federal.
Somente
a união de todos poderá derrotar esse verdadeiro atentado contra o
Estado Democrático de Direito e contra os interesses do povo
brasileiro.
Rio
de Janeiro, 30 de novembro de 2016.
Marfan
Martins Vieira
Procurador-Geral de Justiça do Estado do Rio de
Janeiro
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