Arte. Fonte: Folha dos Lagos |
Pesquisas
nos sites oficiais da região apresentam dificuldades, apesar de
melhora recente
Nas
caudalosas águas da administração pública, nem sempre conseguir
dados referentes às prefeituras é tarefa das mais fáceis. Na
Região dos Lagos, por exemplo, a missão de navegar nos portais da
transparência é como andar em um labirinto, onde a informação
sobre a licitação desejada ou a despesa requer um misto de
paciência e experiência de quem resolve pesquisar as movimentações
de verbas públicas.
A
constatação foi feita pela reportagem da Folha, que se debruçou
sobre aspectos dos portais da transparência de Cabo Frio, Arraial do
Cabo, Armação dos Búzios e São Pedro da Aldeia: folha de
pagamento, receitas, despesas e licitações. Com exceção do
último, que apresentou mais ferramentas e didatismo para navegação,
os demais variavam entre a desatualização das informações ou a
forma intrincada para obtê-la, com muitas ramificações e cliques.
Uma
questão especialmente problemática diz respeito ao acesso à folha
de pagamento do funcionalismo. Apenas em São Pedro, foi possível
obter numa listagem completa e nominal dos servidores lotados em cada
setor. Cabo Frio disponibilizou a ferramenta há pouco tempo, mas é
difícil ter uma noção do todo, uma vez que o sistema só permite a
consulta individual, mediante a digitação de parte do nome do
funcionário. Em Arraial do Cabo, o problema é ainda maior. Só é
possível a consulta, caso seja digitado o nome completo do servidor.
No portal do balneário buziano, até existe a opção pela busca
completa da folha, mas o sistema travou todas as vezes em que a
reportagem tentou fazer a pesquisa.
De
acordo com o vereador de Cabo Frio Rafael Peçanha (PDT), a situação
impede um melhor controle da gestão municipal.
– A
legislação federal exige uma linguagem clara e um acesso objetivo.
Hoje há uma dificuldade muito grande para ter, por exemplo, a folha
de pagamento da prefeitura como um todo. Você não consegue ter
acesso para saber qual o gasto com comissionados, contratados e
efetivos, assim como as despesas de contratos de maneira geral. É
uma linguagem de difícil acesso. Eu costumo dizer que não é um
portal transparente, mas é um portal opaco. Falta esse avanço
porque senão fica só para inglês ver e o cabofriense não ver –
avalia.
As
desventuras políticas de Búzios parecem afetar a gestão municipal
sob o aspecto da publicidade das contas públicas. De acordo com o
levantamento feito pela reportagem, o portal buziano encontra-se com
informações desatualizadas a respeito de contratos, bem como de
receitas e despesas. Em relação aos primeiros, só foram
encontrados registros até 2018. Os dois últimos, até fevereiro
deste ano.
Com
sistemas de busca semelhantes, os portais de Cabo Frio e de Arraial
esbarram nas mesmas dificuldades, embora estejam atualizados. No caso
cabofriense, as atas de licitações não estão sendo publicadas.
Dados relativos aos gastos e fontes de arrecadação também aparecem
enviesadas, demandando tempo e habilidade do cidadão para navegar em
intermináveis links.
Para
a diretora de operação da organização não-governamental
Transparência Brasil, Juliana Sakai, colocar apenas os dados nos
portais não é o bastante para indicar que um município é
transparente.
– É
importante ressaltar que a transparência não é apenas publicar
dados ou informações em um site ou Diário Oficial, mas é garantir
que essa informação seja acessível. Eu posso publicar e deixar
difícil de ser acessado. Ou só publicar no Diário Oficial, em que
o acesso é muito restrito. Não permitir que se faça buscas
automatizadas, em larga escala, faz com que se gaste muito tempo. Ter
transparência é necessário para que haja controle social e
qualquer pessoa entre e acesse – pondera.
O
professor Luiz Carlos Gomes, dono do blog Iniciativa Popular Búzios,
é um estudioso de dados públicos, que constantemente publica em seu
portal. De acordo com Luiz Carlos, houve um avanço na questão da
transparência nos últimos tempos, mas que os prefeitos só colocam
os dados no ar ‘porque a lei os obriga’. Ele lembra que não dar
a devida a devida publicidade pode levar os prefeitos a responder
ações. Ele lembra que o ex-prefeito de Búzios, André Granado,
responde a dois processos de ação civil pública por não respeitar
a Lei da Transparência e que uma das impropriedades apontadas pelo
Tribunal de Contas do Estado (TCE-RJ) para reprovar as contas de 2017
do ex-prefeito de Cabo Frio Marquinho Mendes é por problemas no site
municipal.
– Fiz
um levantamento há pouco tempo e o portal que está mais avançado é
o de São Pedro da Aldeia. Não por acaso, o prefeito Chumbinho é o
que tem o menor número de ações por improbidade. Não é um
governo com o qual eu simpatizo, mas é o que lida melhor com o
recurso público. O de Cabo Frio deu uma melhorada em relação aos
últimos anos. O de Búzios tinha melhorado, mas começou a fechar,
colocar dificuldades técnicas. É muito comum isso acontecer –
comentou Luiz Carlos, que recentemente fez um pedido de resposta
sobre quanto cada prefeitura gastou com coleta de lixo e outros
serviços no ano passado e o máximo que conseguiu foi ser
direcionado para links de portais da transparência.
De
acordo com a diretora da ONG, a situação impede um controle social
da população sobre como o seu dinheiro é gasto.
– A
transparência é uma ferramenta do cidadão e da sociedade civil
para o monitoramento dos gastos públicos e das políticas públicas.
O Estado é direcionado às pessoas, o poder é das pessoas. Elas têm
o direito de saber o que está acontecendo. Se não há publicidade,
o cidadão está sendo impedido de acompanhar o governo –
finaliza.
A
reportagem entrou nem contato com as prefeituras de Cabo Frio,
Arraial do Cabo e Búzios para se posicionarem sobre os problemas,
mas não houve resposta até o fechamento desta edição.
O
que diz a Lei
A
Lei Complementar nº 131/2009 acrescenta dispositivos à Lei
Complementar no 101, de 4 de maio de 2000, que estabelece
normas de finanças públicas voltadas para a responsabilidade na
gestão fiscal e dá outras providências, a fim de determinar a
disponibilização, em tempo real, de informações pormenorizadas
sobre a execução orçamentária e financeira da União, dos
Estados, do Distrito Federal e dos Municípios.
Art.
1o O art. 48 da Lei Complementar no 101, de 4 de maio de 2000,
passa a vigorar com a seguinte redação:
“Art. 48.
...........................................................................
Parágrafo
único. A transparência será assegurada também mediante:
I
– incentivo à participação popular e realização de audiências
públicas, durante os processos de elaboração e discussão dos
planos, lei de diretrizes orçamentárias e orçamentos;
II
– liberação ao pleno conhecimento e acompanhamento da sociedade,
em tempo real, de informações pormenorizadas sobre a execução
orçamentária e financeira, em meios eletrônicos de acesso
público;
III – adoção de sistema integrado de
administração financeira e controle, que atenda a padrão mínimo
de qualidade estabelecido pelo Poder Executivo da União e ao
disposto no art. 48-A.” (NR)
Art. 2o A Lei
Complementar no 101, de 4 de maio de 2000, passa a vigorar acrescida
dos seguintes arts. 48-A, 73-A, 73-B e 73-C:
“Art. 48-A.
Para os fins a que se refere o inciso II do parágrafo único do art.
48, os entes da Federação disponibilizarão a qualquer pessoa
física ou jurídica o acesso a informações referentes a:
I
– quanto à despesa: todos os atos praticados pelas unidades
gestoras no decorrer da execução da despesa, no momento de sua
realização, com a disponibilização mínima dos dados referentes
ao número do correspondente processo, ao bem fornecido ou ao serviço
prestado, à pessoa física ou jurídica beneficiária do pagamento
e, quando for o caso, ao procedimento licitatório realizado;
II
– quanto à receita: o lançamento e o recebimento de toda a
receita das unidades gestoras, inclusive referente a recursos
extraordinários.”
Fonte: "folhadoslagos"