Especialistas apontaram abusos contra os trabalhadores, atraídos por salários em dólar ou euro Foto Roque de Sá Agência Senado |
A
dificuldade de aplicação da lei brasileira a infrações
trabalhistas em navios de cruzeiros, impedindo a punição quando os
empregadores são estrangeiros ou o trabalho se dá em águas
internacionais, foi a preocupação apresentada pelos participantes
de audiência pública promovida pela Comissão de Direitos
Humanos (CDH) ontem (25). O requerimento para a realização
da audiência foi do senador Paulo Paim (PT-RS), que preside a CDH.
A
professora Angela Teberga de Paula apresentou pesquisa sobre as
condições de trabalho em cruzeiros
marítimos. Segundo os números que apresentou, 93%
dos tripulantes dão expediente sete dias por semana, em
jornadas semanais que chegam a ultrapassar 100 horas.
Além disso, 74% sentem ameaças à sua saúde e à sua
segurança no navio.
— O
trabalho adoece e, no limite, pode levar a óbito. Não somos
maniqueístas quanto ao turismo de cruzeiro. A ideia é problematizar
a qualidade dos empregos que estão sendo oferecidos a esses
trabalhadores – observou, associando a limitação da jornada
de trabalho ao direito à saúde do trabalhador.
Abusos
Paulo
Regis Machado Botelho, desembargador do Tribunal Federal do Trabalho
da 7ª Região, mencionou a atratividade dos salários no setor,
pagos em dólar ou euro, para milhares de jovens trabalhadores, mas
questionou se o pagamento justifica deixar de lado as garantias
trabalhistas. Em seu ponto de vista, as empresas de navegação
ofendem o princípio da boa-fé objetiva em seus contratos de
trabalho. Questões como adicional noturno e folga
semanal são regidas por acordos coletivos internacionais de
que o trabalhador não conhece na total amplitude, observou.
Botelho
acrescenta que os abusos na jornada de trabalho sufocam
a existência plena do trabalhador, podendo ser interpretados como
imposição de condições análogas à de escravo. Ele
admite que ainda existe a controvérsia sobre se deve ser aplicada a
legislação do Brasil ou a do país de origem da embarcação,
mas considera que “a jurisprudência é bem clara”.
— Tem
preponderado o entendimento de que a legislação a ser aplicada é a
nossa CLT, que é mais benéfica ao trabalhador.
Fiscalização
O
procurador regional do trabalho Gláucio Araújo de Oliveira chamou
atenção para a preocupação do Ministério Público com o
sucateamento da estrutura de fiscalização trabalhista,
o que reduziu operações, inclusive na área aquaviária. Ele
concorda que a imposição de jornada de mais de 12 horas,
junto com o confinamento por períodos prolongados,
está acima da capacidade humana. Porém, Oliveira rejeitou a
possibilidade de tratamento distinto conforme a nacionalidade de cada
trabalhador.
— Há
preocupação de que se dê tratamento idêntico e digno a todos os
tripulantes — declarou.
Fonte:
"senado"