O
Ministro Alexandre de Moraes, relator do Inquérito nº
4.781/DF- instaurado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) para
apurar condutas de internautas consideradas ofensivas aos
membros da Corte- determinou o seu desmembramento em
relação a Norival Mariano de Souza (N.M.S) e sua remessa ao
foro competente (domicílio do infrator) para prosseguimento das
investigações, considerando que mensagens publicadas por ele em seu
perfil no Twitter poderiam em tese configurar o crime de
difamação contra o STF previsto no Código Penal (artigos 139
e 141, II e III) e na Lei de Segurança Nacional (artigo 26
da Lei 7.170/83), bem como os crimes previstos nos artigos artigos
22, I; 23, I; e 26 dessa lei.
O
Ministério Público Federal (MPF) da cidade simplesmente arquivou a
investigação por nulidade
absoluta, atos inexistentes e crimes não
configurados. Desmoralização
maior do STF não poderia ter havido. Vejamos.
Nulidade
absoluta
Para
o MPF, a investigação não pode prosseguir, porque o inquérito
do qual derivou é absolutamente nulo, já que sua instauração e
condução teriam violado "garantias fundamentais previstas na
Constituição de 1988: proibição de juízo ou tribunal de
exceção (art. 5º,
XXXVII); princípio do juiz natural (art.
5º, LIII); e o devido processo legal (art.
5º, LIV)".
Segundo
o procurador da República Lucas Gualtieri, “é notório que o Inq.
4.781/DF foi instaurado no âmbito do Supremo Tribunal Federal de
ofício, por ato de seu presidente, para apurar fatos
indeterminados, sem delimitação temporal, geográfica ou
circunstancial. Uma vez instaurado, não foi submetido à livre
distribuição, tendo sido designado membro do Tribunal para a sua
condução, conforme escolha pessoal e insindicável do
presidente", desconsiderando as competências
constitucionais do STF.
Além
disso, segundo o procurador da República, "o Inq.
4.781 constitui flagrante violação ao sistema penal
acusatório, materializando na figura do ministro designado pela
Presidência da Suprema Corte, a dupla função de investigar e
julgar, em violação ao disposto no art. 129, incisos I, II, VII,
VIII e § 2º da CR/88".
O
despacho de arquivamento também ressalta que, "em nenhum
momento a Procuradora-Geral da República (PGR), a quem compete
exercer as funções do Ministério Público junto ao STF (art. 46,
LC 75/93), foi instada a se manifestar no bojo dos autos, seja para
analisar a conveniência e oportunidade da realização de medidas
cautelares levadas a efeito (mediante 'pedido' e decisão do Ministro
'condutor'), seja para conduzir o inquérito, na função de
titular exclusiva da ação penal pública".
Atos
inexistentes
O
procurador da República cita jurisprudência unânime do próprio
STF, segundo a qual "é irrecusável o pedido, formulado pelo
Chefe do Ministério Público, o Procurador-Geral da República, de
arquivamento do inquérito”. Como a PGR requereu em 16 de abril de 2019 o arquivamento do Inquérito, todos os atos
praticados no inquérito devem então ser considerados inexistentes.
Ele ainda destaca que o relatório técnico elaborado pela Polícia
Civil de São Paulo, indicando as condutas atribuídas ao
investigado, "foi produzido apenas em 28/05/2019, ou seja,
mais de um mês após o arquivamento dos autos pela Procuradora-Geral
da República, o que robustece a plêiade de máculas às provas dos
autos".
Crimes
não configurados
O
MPF também sustenta, na promoção de arquivamento, que, mesmo que
a investigação não fosse nula, "as expressões
utilizadas pelo investigado nas publicações realizadas na rede
social Twitter, embora deseducadas e até grosseiras, não
refletem um contexto de ataque deliberado à honra dos agentes
públicos mencionados, senão o ânimo de criticar a conduta
funcional dos mesmos, o que exclui a tipicidade do crime contra
a honra" ou da calúnia e difamação contra o presidente
do STF previsto no
artigo 26 da Lei 7.170/83.
Para
o procurador da República, além disso, mesmo que houvesse crime
contra a honra, faltaria, no caso, a representação do
ofendido, elemento indispensável à instauração de um
processo-crime dessa natureza.
"Ocorre
que no caso dos autos, a simples Portaria de instauração do
Inq. 4.781/DF não pode ser entendida como representação
por parte do Presidente do STF – no que tange a eventual crime
de difamação em desfavor da Corte –, já que a mesma não se
refere aos fatos específicos tratados nestes autos, os quais somente
foram trazidos à baila posteriormente à edição daquele
documento", afirma o MPF, que também entendeu não configurados
os crimes dos artigos 22 e 23 da Lei 7.170/83, porque as postagens
feitas por N.M.S. "não evidenciam qualquer propaganda 'de
processos violentos ou ilegais para alteração da ordem política ou
social', ou mesmo 'incitação à subversão da ordem política ou
social' mas sim críticas pontuais à atuação de
Ministros do Supremo Tribunal Federal".
(Autos
nº 18225-85.2019.4.01.3800)
Fonte: "mpf"
Com
o número do processo na Justiça Federal de Minas Gerais fornecido pelo MPF, resolvi
dar uma olhada nos autos.
PROCESSO:
18225-85.2019.4.01.3810
CLASSE:
15601 – INQUÉRITO POLICIAL
AUTOR:
MINISTRO PRESIDENTE DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL
INDICIADO:
SIGILOSO
Apesar
do nome do indiciado ser sigiloso, em sua decisão de 26/08/2019, o
JUIZ FEDERAL SUBSTITUTO MARCELO GARCIA VIEIRA revela que se trata
de Norival Mariano de Souza. Com
o nome descobri seu perfil no twitter: https://twitter.com/norivalmarianod. Nele pude acessar as postagens
postas em questão pelo STF. Em sua decisão, o próprio Juiz se refere a
elas. Veja.
“Consta
que Norival Mariano de Souza, que reside em Pouso Alegre/MG,
teria publicado fake news no seu perfil no Twitter,
tais como:
1)
em 23/02/2019, postagem da frase “Os canalhas”, seguida
de fotografia com os dizeres “Imagem dos Ministros Dias Toffoli,
Gilmar Mendes, Marco Aurélio Mello, Celso de Melo e Ricardo
Lewandowski segurando sacos de dinheiro com a inscrição “Soldados
da Corruptocracia”;
2)
em 19/02/2019, “Olha o luxo, quanto valem esses homens? Nada, uma
vergonha. Ocupam cargos extremamente importante e olha o que fazem.
Como explica o Zé solto? Rabo preso” seguida de fotografia assim
descrita “Imagem dos Ministros Gilmar Mendes, Ricardo Lewandowski e
Dias Toffoli cercando José Dirceu, com as inscrição “Os
advogados do diabo. Eles burlam a lei para praticar o mal e a
corrupção. Todo o Brasil quer #dirceunacadeia#fora
lewandowski#foragilmarmendes#foratoffoli;
3)
em 08/02/2019, “É arrogante, é um nojo, é um lixo, é
um corrupto” seguida de uma fotografia descrita “Imagem do
Ministro Gilmar Mendes, com a inscrição “Urgente! Receita Federal
investiga Gilmar Mendes e a mulher por corrupção e lavagem!”;
4)
em 18/02/2018, “Joesley Batista gravando uma conversa fala que
precisa entregar o STF. Ele fala que vai usar o Zé. Quem é esse Zé?
José Dirceu, claro. Q falas dos ministros, fala A, B, C, D. Quais
desses? Vc ganha uma bala para descobrir. Precisamos compartilhar o
máximo isso”, seguida de fotografia assim descrita: “Imagem de
barras de mesa de som, seguida da inscrição “STF foi comprado –
Joesley Batista falou em entregar...”;
5)
em 22/05/2019, “Suínos tratando de assunto relacionado à saúde é
estranho. São sujos.”
Comentário
sobre uma publicação do perfil oficial do STF no Twitter que
destacava fala do Min. Dias Toffoli, por ocasião da abertura da
sessão extraordinária.
Na
sequência ao comentar publicação do perfil oficial do STF no
Twitter, que mencionava decisão do Plenário do STF que desobrigou o
Estado a fornecer medicamento sem registro da ANVISA, o indiciado
teria escrito: “O porco sem pelo A Morais, no seu voto
disse que os recursos são finitos. Pra comprar ração de luxo,
iguarias refinadas a picarda não viu que os recursos são finitos.
Suínos.”
Segundo
o Juiz, no “processo penal acusatório inexiste ação penal sem
autor, de forma que a posição institucional do MPF neste aspecto
deve ser mantida”. Assim, como não constou dos documentos
encaminhados a representação do agente ofendido, tenho como
correta a representação por arquivamento, sem a qual o MPF é
agente deslegitimado para a promoção da ação penal. No que
pertine às supostas violações à lei de segurança nacional,
antevejo apenas o exercício do direito de livre manifestação
de pensamento político, razão porque deixo de aplicar o art. 28,
CPP.
Pelo
exposto, homologo o arquivamento efetuado pelo MPF. Indefiro
o pedido de retirada de sigilo dos autos. Desnecessária a intimação
do investigado para ciência do inquérito e da decisão, já que não
houve qualquer afetação de direito próprio. Cientifique-se o teor
desta decisão ao Ministro Alexandre de Moraes do STF. Registro
efetuado eletronicamente.
Pouso
Alegre/MG, 26 de agosto de 2019.
Fonte: "trf1"