No dia 31 de agosto deste ano a prefeitura entregou ao CRER-VIP, a título de doação, os bens móveis patrimoniais inservíveis no valor total de R$ 1.682.012,36.
O vereador Genilson foi o primeiro a denunciar que a doação – pelo seu alto valor- pode ter sido feita para cobrir possíveis rombos existentes no balanço patrimonial da prefeitura. Eu o acompanhei na diligência que fez ao CRER-VIP. Seu presidente, pastor Sérgio Naves, nos mostrou algumas cadeiras, armários e camas doadas que, apesar do péssimo estado, foram aproveitadas pela entidade. Além destes bens, conseguiu fazer um pouco mais de R$ 4.000,00 no ferro velho com a venda de cobre e outros metais extraídos dos computadores e objetos que recebeu. Numa avaliação, a grosso modo, tudo não somaria mais do que R$ 10.000,00. Ou seja, a prefeitura teria conseguido transformar, contabilmente, 10 mil reais em mais de 1,6 milhões de reais.
O pastor Sérgio nos disse que todo material foi deixado na entidade por caminhões da prefeitura, que assinou alguns papéis, mas que não ficou com cópia alguma. Para saber que bens foram doados só vendo a relação que está no processo 12.510/2010. Sobre ele não encontrei nada nos BOs.
Parece que a prefeitura lançou os bens pelo valor de aquisição. O vereador Messias informou, na sessão de terça-feira da câmara de vereadores, ao responder ao vereador Genilson, que a prefeitura, para fazer o lançamento, se baseou em uma lei federal. Como costumo não acreditar no que me falam, principalmente vindo da turma do amém do desgoverno municipal, fui conferir e descobri que a afirmação do vereador não é verdadeira.
Quem quiser pesquisar também basta digitar no Google “doação de bens inservíveis” e vai descobrir que existe uma doutrina acerca da doação de bens móveis pela Administração Pública. Parece-me que a prefeitura não observou algumas exigências das leis (Código Civil, Código do Processo Civil, Lei 8.666, Decreto federal 99.658).
Em primeiro lugar, as despesas decorrentes da retirada, carregamento e transporte dos bens deverão ocorrer integralmente por conta da solicitante. Ou seja, a lei estabelece que a doação não deve acarretar quaisquer ônus para os cofres públicos. Não foi o caso desta doação porque a prefeitura entregou os bens na entidade com o seu caminhão gastando combustível para tal.
Em segundo lugar, o decreto federal 99.658 em seu artigo 7º estabelece que, nos casos de alienação, a avaliação do material deverá ser feita de conformidade com os preços atualizados e praticados no mercado. E no seu parágrafo único: Decorridos mais de sessenta dias da avaliação, o material deverá ter o seu valor automaticamente atualizado, tomando-se por base o fator de correção aplicável às demonstrações contábeis e considerando-se o período decorrido entre a avaliação e a conclusão do processo de alienação. Portanto, a apuração de valor de quaisquer bens há de ser realizada, em regra, por técnico devidamente habilitado (contador ou economista) ressalvadas as exceções (leigo ou avaliador judicial). Por ter lançado, incorretamente, como valor do bem inservível o valor de aquisição, a prefeitura não se utilizou, como manda a lei, de técnicos devidamente habilitados para tal.
Finalmente, uma comissão especial, com no mínimo três servidores integrantes do órgão ou entidades interessadas, deveria ter sido criada. No Boletim Oficial não há registro algum a respeito desta comissão.
Observação: no boletim 424, de 05/02/2010, há outra doação, desta vez para a APAE (processo 9.634/2009). O estranho é a fundamentação do ato se basear no decreto 153 do Governo do Estado do Rio de Janeiro que regula a disponibilidade de material; regimento interno do TCE/RJ (deliberação 167); e na Lei 287 que aprova o código de administração financeira e contabilidade pública do Estado do Rio de Janeiro. Isso ocorreu no Gabinete de Planejamento, Orçamento e Gestão, do secretário sabe-tudo-faz-nada-gelatinoso.
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