quinta-feira, 1 de setembro de 2016

Impugnada a candidatura a vereador de Messias Carvalho (veja sentença na íntegra)

Messias Carvalho, foto TSE

Autos n˚ 248-39.2016.6.19.0172

SENTENÇA

Trata-se de Ação de Impugnação de Registro da candidatura de MESSIAS CARVALHO DA SILVA ao cargo de Vereador da Câmara Municipal de Armação dos Búzios pela coligação “Búzios Não Pode Parar” no pleito municipal de 2016 que foi proposta pelo MINISTÉRIO PÚBLICO ELEITORAL, eis que o pré-candidato detém contra si condenação perante o Tribunal de Constas do Estado do Rio de Janeiro, no processo n˚ 261528-3/03, devido ao fato de na condição de ordenador de despesas da Câmara Municipal de Armação dos Búzios no exercício de 2010 ter cometido na visão ministerial irregularidades e improbidades insanáveis.

Incluída também no pólo passivo da relação jurídico-processual pelo Ministério Público Eleitoral a coligação partidária pela qual o réu concorre.

Destarte, o Ministério Público Eleitoral narra que o pretenso candidato detém uma condenação na Corte de Constas no processo acima mencionado de n˚ 261528-3/0, tendo tido suas contas rejeitadas neste feito, pois consoante aquele decisum, o demandado, na qualidade de ordenador de despesas da Câmara de Vereadores Municipal, no exercício de 2010, determinou o pagamento se subsídios aos Vereadores em desacordo com o parâmetro estabelecidos no inciso VI, alínea “b”, do artigo 29, da Constituição Federal.

Ao detalhar o Ministério Público Eleitoral obtemperou que os Vereadores da Câmara Municipal de Armação dos Búzios em 2010, perceberam subsídios não só acima do parâmetro estabelecido no referenciado artigo 29, inciso VI, alínea “b”, da Constituição Federal (30% do Subsídio do Deputado Estadual), bem como também acima do valor fixado pela Resolução Legislativa Municipal n˚ 554, de 17.07.2008, sendo decidido pela irregularidade das contas do Ordenador de Despesas da Câmara Municipal de Armação dos Búzios, relativas ao exercício de 2010, de responsabilidade do impugnado em face do pagamento efetuado em prol do parâmetros constitucionais e legalmente estabelecidos.

Assim, aduz o Parquet em sua peça vestibular que em razão das irregularidades e improbidades acima mencionadas, as contas do impugnado MESSIAS CARVALHO DA SILVA não foram julgadas irregulares, como respectivo acórdão proferido pela Corte de Contas determinou a restituição dos valores recebidos a maior pelos Vereadores à época, em desacordo com os parâmetros constitucionais e legais estabelecidos. Salientando ainda o autor que no respectivo processo n˚ 261528-3/0 o Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro decidiu pela APLICAÇÃO DE MULTA ao ordenador de despesas da Câmara de Vereadores de Armação dos Búzios, no caso, o impugnado.

Assim, reputou o Ministério Público Eleitoral que a hipótese se subsume a causa de inelegibilidade cominada prevista no artigo 1º, inciso I, alínea “g”, da Lei Complementar nº 64/90, cuja letra foi acrescida pelo artigo 2˚ da Lei Complementar n˚ 135/2010, denominada “Lei da Ficha Limpa”, que foi uma lei de inciativa popular com base nos requisitos expressos no § 2˚ do artigo 61 da Constituição Federal visando à efetivação da proteção da moralidade administrativa para o exercício de mandato eletivo.

O aludido dispositivo aduz que são inelegíveis “os que tiverem suas contas relativas ao exercício de cargos ou funções públicas rejeitadas por irregularidade insanável que configure ao doloso de improbidade administrativa, e por decisão irrecorrível do órgão competente, salvo se esta houver sido suspensa ou anulada pelo Poder Judiciário, para as eleições que se realizarem no 8 (oito) anos seguintes, contados a partir da data da decisão, aplicando-se o disposto no inciso II do art. 71 da Constituição Federal, a todos os ordenadores de despesa, sem exclusão de mandatários que tiverem agido nessa condição”.

Ressalta ainda o Ministério Público Eleitoral que julgada irregulares as contas do pré-candidato, sobretudo pela infração do artigo 29, inciso VI, alínea “b”, da Constituição Federal, evidenciou-se então que tais irregularidades cometidas pelo impugnado caracterizaram atos dolosos de improbidade administrativa de caráter insanáveis no tocante à violação aos princípios da administração pública, especialmente, da legalidade, da moralidade e da impessoalidade, o que, obtempera, competir à Justiça Eleitoral decidir para fins de reconhecimento de inelegibilidade, conforme defende quase à unanimidade a doutrina eleitoral.

O Impugnado apresentou defesa à ação de impugnação de registro de candidatura ajuizada pelo Ministério Público Eleitoral apresentando basicamente dois argumentos, a saber: a uma, que o próprio TCE/RJ reconhece a possibilidade de revisão do subsídio anual através de revisão geral anual não configura aumento salarial, mas sim mera composição inflacionária; a duas, que a irregularidade apontada pela Corte de Constas não se configurou como irregularidade insanável como requisito exigível para configuração da causa de inelegibilidade cominada pelo artigo 1º, inciso I, alínea “g”, da Lei Complementar nº 64/90.

Em prosseguimento, nos moldes do artigo 5˚, caput, da Lei Complementar nº 64/90, tratando-se as questões deduzidas nestas ações de impugnação de registro de candidaturas apenas de matérias de direito, cabível o julgamento antecipado da lide, com aplicação subsidiária das disposições do Código de Processo Civil, consoante precedentes do próprio Colendo TSE, como se dessume, por exemplo, da ementa abaixo transcrita no julgamento do Recurso Especial Eleitoral n˚ 22167-GO, em 31/08/2004, cujo Relator foi o Excelentíssimo Sr. Ministro Luiz Carlos Lopes Madeira:

RECURSO ELEITORAL - INELEGIBILIDADE - RITO PROCESSUAL IMPUGNAÇÃO. JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE. MATÉRIA DE DIREITO. CERCEAMENTO DA ACUSAÇÃO. PRODUÇÃO DE PROVA.1. O RITO PROCESSUAL TRAÇADO PARA A AÇÃO DE IMPUGNAÇÃO DE REGISTRO DE CANDIDATURA ESTÁ PREVISTO NA LEI COMPLEMENTAR Nº 64/90, COM PREVISÃO NO SEU ARTIGO , DA POSSIBILIDADE DE JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE, COM APLICAÇÃO SUBSIDIÁRIA DAS REGRAS CONTIDAS NO ARTIGO 330, INCISO II DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL, PERTINENTES À AÇÃO ORDINÁRIA. 2. FORMADO O CONVECIMENTO DO JULGADOR, PERMITE A LEGISLAÇÃO ADJETIVA E TAMBÉM O ESPECÍFICO PROCEDIMENTO ELEITORAL, O JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE. 3. A CONVICÇÃO DO JULGADOR FIRMADA EM PROVA DOCUMENTAL, HÁBIL E SUFICIENTE À COMPROVAÇÃO QUE SE PRETENDIA. DESCONSTITUIR O DOCUMENTO, APENAS POSSÍVEL ATRAVÉS DA MEDIDA PRÓPRIA E CABÍVEL.4. RECURSO CONHECIDO E IMPROVIDO.

É o relatório. Passo a decidir conforme estabelece o artigo 2º, parágrafo único, inciso III, e artigo 7˚, parágrafo único, ambos dispositivos da Lei Complementar nº 64/90, que tratam da competência e do julgamento das ações de impugnação de registro de candidatura com base na arguição de causa de inelegibilidade.

PRELIMINARES:

A inclusão da coligação partidária no pólo passivo da relação jurídico-processual, ainda que haja vasto dissenso doutrinário e jurisprudencial de que a hipótese não é de litisconsórcio passivo unitário, sendo a jurisprudência quase remansosa no sentido da inexistência, tal inclusão apenas facilita o direito de defesa, não trazendo nenhum prejuízo ao primeiro réu. Vislumbro, portanto, estarem presentes as condições de exercício do direito público de ação, bem como presentes os pressupostos de existência e desenvolvimento válido e regular do processo instaurado a partir da ação ministerial.

Cabível ainda o julgamento antecipado da lide, nos moldes do artigo 355, inciso I, do Código de Processo Civil.
I – OS ATOS QUE IMPORTAM IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA:
O Ministério Público Eleitoral, órgão com legitimidade ativa ad causam para ajuizar Ação de Impugnação de Registro de Candidatura de acordo com o artigo 3˚ da Lei Complementar nº 64/90 argui a inelegibilidade do 1˚ réu haurida da rejeição de suas contas relativas ao exercício de cargo eletivo, na qualidade de ordenador de despesas, que no entendimento ministerial constituiu irregularidade insanável que configura ato doloso de improbidade administrativa, reconhecida por decisão irrecorrível do órgão do órgão competente, sem que esta esteja suspensa ou tivesse sido anulada pelo Poder Judiciário, para as eleições que se realizarem no 8 (oito) anos seguintes, contados a partir da data da decisão, configurando assim, a hipótese de restrição ao direito público político passivo do aludido cidadão de ser votado no processo político democrático no exercício do Jus Civitatis.
A Constituição Federal de 1988 trouxe a previsão no artigo 37, caput, dos deveres de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência (este último princípio inserido pela EC n˚ 19/98) para a atuação da Administração Pública e de seus agentes. Sendo certo que tais deveres são normatizados no texto constitucional com a natureza jurídica de princípios, que são preceitos fundantes da ordem constitucional e reitores dos comportamentos do Poder Público.
Portanto, o Poder Constituinte Originário determinou inclusive que os agentes públicos procedam com moralidade. Destarte, por vezes, diante de tantos atos imorais praticados por parte dos agentes públicos constata-se que a aludida previsão principiológica não é despicienda e se faz necessária diante do nível de evolução no trato da coisa pública no Brasil.
Ressalte-se que há divergência doutrinária sobre moralidade administrativa e probidade administrativa serem expressões com sinonímia, mas prepondera que a probidade possui sentido mais amplo, uma vez que abarca na Lei n˚ 8.429/92, que trata da improbidade administrativa, os atos imorais e os atos ilegais. Neste sentido, as precisas lições da Professora Maria Sylvia Zanella di Pietro:
Comparando moralidade e probidade, pode-se afirmar que, como princípios, significam praticamente a mesma coisa, embora algumas leis façam referência às duas separadamente, do mesmo modo que há referência aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade como princípios diversos, quando este último é apenas um aspecto do primeiro”.
No entanto, quando se fala em improbidade como ato ilícito, como infração sancionada pelo ordenamento jurídico, deixa de haver sinonímia entre as expressões improbidade e imoralidade, porque aquela tem um sentido muito mais amplo e muito mais preciso, que abrange não só atos desonestos ou imorais, mas também e principalmente atos ilegais. Na lei de improbidade administrativa (Lei nº 8.429, de 2-6-92), a lesão à moralidade administrativa é apenas uma das inúmeras hipóteses de atos de improbidade previstos em lei”1.
No entanto, há interligação umbilical entre a questão da probidade administrativa e o princípio da moralidade eleitoral, pois em diversas hipóteses, uma condenação por ato de improbidade administrativa pode vir a resultar em uma causa de inelegibilidade prevista pela legislação infraconstitucional, a exemplo da norma do artigo 1º, inciso I, alínea “l”, da Lei Complementar nº 64/90, que estabelece de acordo com o artigo 14, § 9˚, da Constituição Federal, casos de inelegibilidade, cuja alínea foi acrescida pelo artigo 2˚ da Lei Complementar n˚ 135/2010.
Nesta senda, dispõe o § 9˚, do artigo 14 da Constituição Federal que: “Lei Complementar estabelecerá outros casos de inelegibilidade e os prazos de sua cessação, a fim de proteger a probidade administrativa, a moralidade para o exercício do mandato, considerada a vida pregressa do candidato, e a normalidade e legitimidade das eleições contra a influência do poder econômico ou o abuso do exercício de função, cargo ou emprego na administração direta ou indireta”.
Assim, muito embora o Egrégio Tribunal Superior Eleitoral tenha editado acertadamente a Súmula n˚ 13 no sentido de que não é autoaplicável o § 9˚ do artigo 14, da Constituição Federal, para fins de exame de registros de candidaturas com base no princípio da moralidade eleitoral, sopesando-se a vida pregressa do pretenso candidato, com escopo de proteger a probidade administrativa e a moralidade para o exercício de mandato eletivo, agora, de forma mais profilática, legem habemus, sendo a Lei Complementar n˚ 135/2010, que acresceu outras hipóteses de inelegibilidades infraconstitucionais à Lei Complementar nº 64/90, com base no princípio da moralidade eleitoral uma aspiração de toda a sociedade, o que inclusive motivou a iniciativa popular para aludida produção legislativa, podendo então, hodiernamente, serem olvidadas candidaturas no processo político democrático para escolha dos governantes de cidadãos ímprobos. Podendo ser reputados como ímprobos aqueles que: a) por sentenças condenatórias confirmadas por órgãos jurisdicionais de 2˚ grau colegiados, por quanto perdurarem o prazo de suspensão de seus direitos políticos advindos de práticas de atos de improbidade administrativa então judicialmente reconhecidos; b) ou por atos que importem na rejeição de constas dos ordenadores de despesas que possam ser reputados como atos dolosos de improbidade administrativa que configuraram irregularidades insanáveis.
Insta ainda acentuar que a proteção contra a probidade administrativa tem sede constitucional, pois de acordo com o artigo 37, § 4˚, da Constituição Federal: “Os atos de improbidade administrativa importarão a suspensão dos direitos políticos, a perda da função pública, a indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao erário, na forma e gradação previstas em lei, sem prejuízo da ação penal cabível”.
Assim, a probidade é mais ampla do que a moralidade administrativa, estando intimamente ligada ao princípio da moralidade eleitoral em razão da previsão legal ora analisada de causação de inelegibilidade infraconstitucional. Deste modo, dá-se maior efetividade ao princípio democrático, pois a existência do Estado Democrático de Direito está relacionada com a obrigação constitucional, legal e moral do gestor público de prestar contas e de dar publicidade acerca de seus atos de gestão e de governo. Além disso, num Estado Democrático os cidadãos possuem o direito de participar da tomada das decisões políticas garantido pelo Estado de Direito ou Estado Constitucional, numa relação intrínseca entre Direito e Democracia que resulta no Estado Democrático de Direito.
Trata-se, portanto, da concepção de democracia como um processo em evolução fundamentado no desenvolvimento do espírito crítico e da participação popular (democracia semidireta ou participativa), prevista na Constituição Federal.
Desta forma, com a finalidade de resguardar os princípios constitucionais, proteger a probidade administrativa e o direito de todos à bora administração foi concebida a Lei n˚ 8.429/92, com entrada em vigor em 03/06/1992, que revogou as leis anteriores que se limitavam às hipóteses de enriquecimento ilícito previstas na Lei n˚ 3.164/1957 e Lei n˚ 3.502/1958, passando a ser um eficaz mecanismo de repressão à improbidade administrativa e que classificou os atos de improbidade em três modalidades distintas: a) atos que importam enriquecimento ilícito do agente público (artigo 9); b) atos que causam prejuízo ao erário (artigo 10) e atos que atentam contra os princípios da administração pública (artigo 11).
II – DOS REQUISITOS PARA A CONDENAÇÃO POR IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA FAZER INCIDIR A INELEGIBILIDADE:

Após perscrutada a conceituação da improbidade administrativa, urge ressaltar que, consoante precedentes do próprio Tribunal Superior Eleitoral, quanto a restrição ao direito público político subjetivo passivo nem toda condenação por improbidade administrativa é capaz de fazer incidi-la (inelegibilidade), mas somente as condenações que preencham cumulativamente os requisitos elencados na própria norma do artigo 1º, inciso I, alínea “l”, da Lei Complementar nº 64/90, cuja alínea foi acrescida pelo artigo 2˚ da Lei Complementar n˚ 135/2010, que estabelece a inelegibilidade nesta hipótese, a saber: a) decisão transitada em julgado ou proferida por órgão colegiado do Poder Judiciário; b) condenação à suspensão dos direitos políticos b) condenação em improbidade administrativa na modalidade dolosa; c) conduta ímproba geradora de lesão ao erário e/ou enriquecimento ilícito; e) prazo de inelegibilidade não exaurido.
Assim, para exemplificar, se o pretenso candidato detém contra si condenação confirmada em 2˚ grau por órgão colegiado por ato de improbidade administrativa culposo, que não tenha causado lesão ao Erário Público ou evidenciado causa de enriquecimento ilícito em razão do exercício de cargo público, mas tão somente tenha sido reputada a conduta ímproba como atentatória aos princípios reitores da Administração Pública, ainda que tenha sido imposta sanção de suspensão dos direitos políticos com prazo de inelegibilidade ainda não exaurido, não configurará tal hipótese a causa de inelegibilidade prevista no artigo 1º, inciso I, alínea “l”, da Lei Complementar nº 64/90, que estabelece de acordo com o artigo 14, § 9˚, da Constituição Federal, casos de inelegibilidade, cuja alínea foi acrescida pelo artigo 2˚ da Lei Complementar n˚ 135/2010.
Nestes termos, mesmo em relação a um ato de improbidade administrativa doloso, cuja condenação imposta pela Justiça Comum foi confirmada por órgão colegiado ou transitou em julgado, faz-se necessário para a incidência da inelegibilidade que a condenação por improbidade tenha estabelecido expressamente a suspensão dos direitos políticos dentre as sanções cominadas pelo artigo 12 da Lei n˚ 8.429/92, sendo este o segundo requisito da causa de inelegibilidade trazida pela alínea “l”, pois de acordo com o princípio da proporcionalidade poderá advir em um processo judicial a imposição isolada de outra penalidade que não a sanção de suspensão dos direitos políticos, donde se dessume que nem todas as sanções desta natureza importam na configuração da inelegibilidade prevista no artigo 1º, inciso I, alínea “l”, da Lei Complementar nº 64/90.
Nesta esteira, não há necessidade de que, nos moldes da alínea “l”, a condenação por ato de improbidade administrativa impositiva de sanção de suspensão de direitos políticos tenha transitado em julgado, pois o primeiro requisito objetivo da hipótese de inelegibilidade é que a decisão na ação de improbidade tenha sido prolatada de forma colegiada por maioria ou unanimidade, por exemplo por uma das Câmaras Cíveis do Tribunal de Justiça do Estado, ou então que tenha ocorrido, de fato, o trânsito em julgado da decisão monocrática ou colegiada, mormente porquê de acordo com o artigo 20 da Lei de Improbidade, o prazo de suspensão dos direitos políticos, graduado nos moldes do artigo 12, I a III, se inicia apenas com o trânsito em julgado da sentença condenatória.
Portanto, imposta condenação de sanção de suspensão dos direitos políticos em ação de improbidade por ato doloso de improbidade administrativa por lesão ao Erário e/ou por enriquecimento ilícito prolatada ou confirmada por órgão colegiado, ainda que não transitada em julgado, exsurge, então, uma causa objetiva de inelegibilidade trazida pela legislação infraconstitucional que regulamentou a norma constitucional de eficácia limitada do § 9˚ do artigo 14, da Constituição Federal. Mesmo porque o tempo da inelegibilidade da letra “l” é incerto, pois compreende o período compreendido entre a decisão colegiada condenatória ou seu trânsito em julgado e o cumprimento das sanções impostas.
Assim, em matéria de deferimento de registro de candidatura pela Justiça Eleitoral deve sempre ser ponderado cum grano salis a alegação de fato superveniente advinda de eventual suspensão liminar dos efeitos de condenação por ato de improbidade administrativa concedida pela Justiça Comum, ou seja, pelo Tribunal de Admissibilidade a quo em sede de recursos excepcionais, a saber, em sede de Recurso Especial ou de Recurso Extraordinário, pois o que exsurge da alínea “l” do inciso I, do artigo 1˚ da Lei de Inelegibilidades é um requisito objetivo de causação de inelegibilidade, a saber, a sanção de suspensão dos direitos políticos em ação de improbidade por ato doloso de improbidade administrativa por lesão ao Erário e/ou por enriquecimento ilícito em decisão judicial transitada em julgado, ou ainda prolatada ou confirmada por órgão colegiado, ainda que não transitada em julgado.
Já quanto a análise do terceiro requisito da inelegibilidade prevista na alínea “l”, é necessário, como já explicitado acima, a presença do elemento subjetivo, a saber, o animus, consubstanciada na conduta comissiva ou omissiva, perpetrada de modo consciente, deliberado e voluntário, de prática de improbidade administrativa.
Quanto ao quarto requisito para causa de inelegibilidade em comento, faz-se necessário que o ato doloso de improbidade advenha de lesão ao Erário Público ou de enriquecimento ilícito do agente ou mesmo de terceiro beneficiado pelo ato de improbidade, como observa o Procurador de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, Marcos Ramayana em sua conhecida obra “Direito Eleitoral”, citando precedente do Tribunal Superior Eleitoral:
...O enriquecimento ilícito que se observa nem sempre é do próprio réu e atual candidato, pois ele pode ter beneficiado terceiro com lesão ao patrimônio público. Neste sentido precedente o TSE, Recurso Ordinário 2136-89.2010.6.26.000, São Paulo, Rel. Min. Hamilton Carvalhido, em 25/11/2010”2.
Todavia, quanto a este quarto requisito da causa de inelegibilidade prevista na letra “l”, como ressalva o jurista José Jairo Gomes, Ex-Procurador Regional Eleitoral junto ao Tribunal Regional Eleitoral do Estado de Minas Gerais, a hermenêutica que se deve fazer da aludida alínea “l” do inciso I, do artigo 1˚ da Lei Complementar nº 64/90, acrescida pela denominada Lei da Ficha Limpa não é a propriamente literal em todo o seu preceito, mas sim uma interpretação teleológica quanto a inexigibilidade de cumulatividade entre os atos de improbidade que lesam o Erário e os que importem em enriquecimento ilícito, devendo-se assim ser perquirido o fim colimado pela Lei, que, in casu, é a efetivação da proteção da probidade administrativa aliada como irmã siamesa do princípio da moralidade eleitoral.
Destarte, à luz da qualificação e subdivisão dos atos de improbidade administrativa contida na Lei de Improbidade, lembra o jurista Jairo Gomes que a conjuntiva “e” no texto da alínea “l”, deve ser entendida como disjuntiva “ou”, pois é possível prognosticar lesão ao patrimônio público haurido de ato doloso de improbidade administrativa sem que importe em enriquecimento ilícito do agente.
Assim, assiste inteira razão ao ilustre jurista José Jairo Gomes quando afirma que a conjunção aditiva “e” no texto da alínea “l” deve ser compreendida como conjunção alternativa “ou”, haja vista que pode haver lesão ao patrimônio público sem que haja enriquecimento ilícito, muito embora, na maioria dos casos mesmo que não expressamente reconhecido na decisão judicial, possa se dessumir que a lesão ao erário tenha ocasionado o enriquecimento ilícito do próprio agente, ora pretenso candidato, ou de terceiro agraciado com o ato de improbidade do réu.
No entanto, nesta causa de inelegibilidade prevista na letra “l” não se prognosticar-se-á sobre a possibilidade de superação (derrotabilidade) da condenação por ato doloso de improbidade administrativa em eventual instância excepcional, na qual frisa-se, inexiste sequer reexame de matéria fática, mesmo que ao contrário do que alude parte da dissente doutrina e jurisprudência, a Justiça Eleitoral possa sim realizar juízo de valor sobre o ato de improbidade.
Neste sentido, a Corte do Colendo Tribunal Superior Eleitoral no julgado do Recurso Ordinário n˚ 380-23, entendeu possível a incidência da inelegibilidade em questão se a sentença ou decisão confirmatória da ação que apurou a improbidade administrativa reconheceu a presença de prejuízo ao erário e enriquecimento ilícito, ainda que não o tenha constado expressamente na parte dispositiva.
No mesmo sentido, transcreve-se a ementa do acórdão do Colendo Tribunal Superior Eleitoral no julgado do Recurso Ordinário n˚ 1408-04.2014.6.19.0000 - RIO DE JANEIRO, cuja Relatora foi a Ministra Maria Thereza de Assis Moura:
ELEIÇÕES 2014. RECURSO ORDINÁRIO. REGISTRO DE CANDIDATURA. CAUSA DE INELEGIBILIDADE. ARTIGO 1˚, I, ALÍNEA l, DA LEI COMPLEMENTAR N° 64/90. EMBORA AUSENTE O ENRIQUECIMENTO ILÍCITO NA PARTE DISPOSITIVA DA DECISÃO CONDENATÓRIA DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA, INCIDE A INELEGIBILIDADE SE Ê POSSÍVEL CONSTATAR QUE A JUSTIÇA COMUM RECONHECEU SUA PRESENÇA. PRECEDENTE. RECURSO ORDINÁRIO A QUE SE NEGA PROVIMENTO. 1. Segundo entendimento deste Tribunal Superior no RO n° 380-23 (PSESS aos 12.9.2014 - "Caso Riva"), deve-se indeferir o registro de candidatura se, a partir da análise das condenações, for possível constatar que a Justiça Comum reconheceu a presença cumulativa de prejuízo ao erário e enriquecimento ilícito decorrentes de ato doloso de improbidade administrativa, ainda que não conste expressamente na parte dispositiva da decisão condenatória. 2. Recurso ordinário desprovido”.
Para compreensão exata da recente posição do Colendo Tribunal Superior Eleitoral haurida da hermenêutica teleológica do artigo 1º, inciso I, alínea “l”, da Lei Complementar nº 64/90, que estabelece de acordo com o artigo 14, § 9˚, da Constituição Federal, casos de inelegibilidade, cuja alínea foi acrescida pelo artigo 2˚ da Lei Complementar n˚ 135/2010, posição esta firmada nas últimas eleições realizadas no país, não é demasiado o socorro do escólio do Eminente Procurador de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, Marcos Ramayana, também extraída de sua conhecida obra “Direito Eleitoral”:
O importante é o intérprete analisar no caso concreto se houve a incidência de ambos os requisitos (lesão e enriquecimento), mas não é necessário que a sentença ou acórdão no processo de ação civil declare expressamente”.
Se o candidato, por exemplo, beneficiou uma empresa sem fazer a licitação e causou danos ao erário público, em razão da prova produzida nos autos da ação civil é possível perscrutar se ocorreu o enriquecimento ilícito próprio ou de terceiro com gravidade ou proporcionalidade apta a ensejar a causa de inelegibilidade”.
Sendo celebrado um negócio jurídico (contrato) com a Administração Pública e o terceiro de forma dolosa estava em conluio com o candidato, os envolvidos tinham o objetivo de fraudar lei imperativa, art. 166, VI, do Código Civil, causando a nulidade do ato e respondendo por seu efeitos de projeção da inelegibilidade”3. (O texto menciona o artigo 145 do Código Civil, quando faz alusão ao inciso VI do artigo 166 do Estatuto Civil).
Insta acentuar que jurista Marcos Ramayana não advoga em sua obra que o quarto requisito, a saber, a necessidade de decisão condenatória de improbidade que tenha reconhecido lesão ao patrimônio público e enriquecimento ilícito considere que ambas as hipóteses de improbidade sejam cumulativas, estando a primeira prevista no artigo 10 da Lei n˚ 8.429/92 e a segunda no artigo 9˚ da aludida Lei. Destarte, o Professor de Direito Eleitoral, Dr. Marcos Ramayana, aduz que a cumulatividade deste quarto requisito deve ser analisada casuisticamente.
Em prosseguimento, quanto ao último requisito para configuração da causa de inelegibilidade prevista na letra “l”, prazo de inelegibilidade não exaurido, urge salientar que o prazo de inelegibilidade trazida pela aludida alínea é de 8 (oito) anos após o cumprimento das sanções impostas, inclusive da sanção de suspensão de direitos políticos imposta na ação de improbidade, tendo sido reconhecida como constitucional a nova causa de inelegibilidade trazida pela alínea “l” sobre fatos anteriores, consoante entendimento do Pretório Excelso no julgamento das Ações Declaratórias de Constitucionalidade nˢ 29 e 30 e Ação Direta de Inconstitucionalidade n˚ 4.579/DF.
Por fim, quanto à análise dos requisitos da causa de inelegibilidade trazida pela alínea “l”, do artigo 1˚, inciso I, da Lei de Inelegibilidades, cumpre lembrar que a denominada Lei da Ficha-Limpa tem origem em um movimento popular contra a corrupção eleitoral que deu efetividade ao significado de democracia participativa, exigindo a obediência ao princípio da moralidade eleitoral por parte daqueles que desejam exercer a capacidade eleitoral passiva. Assim, faz-se mister que os debates e discussões persistam, sejam jurídicos ou sociais, para que a legislação avance nas garantias da moralidade administrativa, bem como assim avance a jurisprudência com a superação de regras que dificultem ou impossibilitem a efetividade dos princípios constitucionais e legais, como alguns questionamentos restritivos acerca da alínea “l” do inciso I, do artigo 1º, da Lei Complementar n˚ 64/90, já que o juízo de valor do princípio da moralidade eleitoral será sempre da Justiça Eleitoral.
III- DOS REQUISITOS PARA FAZER INCIDIR A CAUSA DE INELEGIBILIDADE PREVISTA NO ARTIGO 1˚, INCISO I, ALÍNEA “G”, DA LEI COMPLEMENTAR N˚ 64/90:
Insta acentuar que a hipótese de inelegibilidade cominada pela legislação infraconstitucional eleitoral, especificamente pela Lei de Inelegibilidade, a saber, pelo artigo 1˚, inciso I, alínea “g” detém perfeita simetria com a alínea “l” do suso inciso, sendo necessária a prova inequívoca do ato de improbidade administrativa na modalidade dolosa, excluindo-se as hipóteses de negligência, imperícia ou imprudência do agente na chefia do Poder ou no exercício da atribuição de ordenação de despesa.
Assim, exige-se uma simetria entre as citadas alíneas “g” e “l”, devendo a causa de inelegibilidade desta primeira causa decorrer do critério valorativo da própria Justiça Eleitoral que entenda o ato de rejeição de contas do agente como subsumido à hipótese de improbidade administrativa capitulada nos artigos 9˚ e 10˚ da Lei n˚ 8.429/92, ou em uma ou outra dessas mesmas hipóteses, como preleciona autorizada doutrina e jurisprudência, mormente a doutrina do jurista José Jairo Gomes.
Neste diapasão, a causa de inelegibilidade prevista no artigo 1˚, inciso I, alínea “g”, da Lei de Inelegibilidade prevê o prazo de inelegibilidade de 8 (oito) anos a contar da decisão proferida por Corte de Contas que se subsuma simetricamente a alguns dos requisitos da alínea “l” do suso inciso, equiparando-se então a sanção dos direitos políticos decorrente das penalidades porventura comináveis em ação de improbidade por atos desta natureza dolosos previstos no artigo 12, incisos I e II, da Lei n˚ 8.429/92. Devendo o Juízo Eleitoral de acordo com o princípio da proporcionalidade ponderar ao fato que foi imputado ao agente pela Corte de Contas, sem se generalizar o julgamento feito pelo Tribunal de Contas, mormente porque apesar da capital importância das cortes de contas, os julgamentos destas instâncias de responsabilização não substituem a tutela jurisdicional eleitoral no exame da causa de inelegibilidade.
Para incidir ainda a causa de inelegibilidade prevista na letra “g”, além de dever o Juízo Eleitoral valorar de acordo com o princípio da razoabilidade e da proporcionalidade que a condenação de rejeição de contas haurida da Corte de Contas venha também configurar como ato doloso de improbidade administrativa que causou enriquecimento ilícito ou prejuízo ao erário público, deverá ainda reputar que as irregularidades reconhecidas pelo Tribunal de Contas sejam tipificadas como insanáveis.
Desta forma, apesar de apenas ao Poder Judiciário competir julgar os atos de improbidade administrativa, é da Câmara Municipal, das Assembléias Legislativas e do Congresso Nacional a prerrogativa de exercer o controle externo e a tomada de contas dos agentes políticos e agentes públicos, com o auxílio das Cortes de Contas. Assim, na hermenêutica da letra “g” se revela despicienda a existência de condenação judicial por ato doloso de improbidade administrativa, devendo haver apenas a exigência de duas decisões sobre a rejeição de contas do agente, a saber, uma, da própria Corte de Contas ou do Poder Legislativo quando fiscaliza o Poder Executivo, e outra, do Poder Judiciário Eleitoral (Justiça Especializada) no sentido de que a rejeição de contas derivou então de ato doloso de improbidade administrativa causadora de enriquecimento ilícito ou de prejuízo ao erário público, devendo ser ainda reputada tais irregularidades como insanáveis, pois as sanáveis não fazem exsurgir a causa de inelegibilidade cominada pela alínea em estudo.
Tal interpretação é consentânea inclusive com a redação originária da Lei Complementar n˚ 64/90 que previa para os ordenadores de despesas que tinham suas contas rejeitadas por irregularidades insanáveis e por decisão irrecorrível a cominação da causa de inelegibilidade nos cinco anos seguintes a decisão de rejeição. Tendo sido a mens legis da alteração procedida pelo artigo 2˚ da Lei Complementar n˚ 135/2010 incluir também os mandatários aos quais compete a autorização dessas despesas, e não só os meros autorizados de despesas.
Ademais, de acordo com a novel Lei na hipótese de rejeição de contas por irregularidades insanáveis que configure ato doloso de improbidade administrativa causadora de enriquecimento ilícito, próprio ou de terceiros, ou de prejuízo ao erário público, há ainda precedentes de que o pedido de reconsideração perante a própria Corte de Contas não afasta a causa de inelegibilidade.
Em prosseguimento, apenas para citar caso similar ao presente que é rebatido pela defesa quanto ao pagamento de verba indenizatória a vereadores há precedentes do Colendo TSE que reputa tal ato como qualificado como hipótese de irregularidade insanável. Assim, o Plenário do referido Tribunal Superior Eleitoral, por unanimidade, reafirmou sua jurisprudência, no sentido de que o pagamento indevido a vereadores, a título de participação em sessões extraordinárias, constitui irregularidade insanável, que atrai a inelegibilidade prevista no art. 1º, inciso I, alínea g, da Lei Complementar nº 64/90. Ressalta tais decisões que, a partir de 2006, com o advento da Emenda Constitucional nº 50, a Constituição da República, no art. 57, § 7º, passou a proibir expressamente o pagamento de parcelas indenizatórias pela participação de parlamentares em sessão extraordinária.
Esclarece ainda aquelas decisões da mais alta Corte Eleitoral que a jurisprudência do respectivo Tribunal Superior veio a se sedimentar no sentido de que a violação do art. 57, § 7º, da Constituição da República constitui vício insanável e ato de improbidade administrativa que importa em enriquecimento ilícito, conforme o art. 9º da Lei nº 8.429/92 – Lei de Improbidade Administrativa. Nesse entendimento, destaca-se, portanto, o decisum, por unanimidade, que não conheceu do agravo regimental. Agravo Regimental no Recurso Especial Eleitoral nº 329-08/SP, rel. Min. Laurita Vaz, em 13.11.2012.
IV – NO MÉRITO PROPRIAMENTE DITO:
Com razão o ilustre membro do Ministério Público Eleitoral, que prudentemente deflagrou a primeira ação de impugnação de registro de candidatura, judicializando a causa.
Não devem, portanto, prosperar as alegações defensivas do Impugnado que aduz não deter contra si qualquer restrição hodierna à sua capacidade eleitoral passiva, como se demonstrará a seguir.
Assim, o pagamento continuado de subsídios aos Vereadores de Armação dos Búzios ordenado pelo réu no exercício fiscal de 2010 em confronto com o que dispõe o artigo 29, inciso VI, alínea “b”, da Constituição Federal (30% do Subsídio do Deputado Estadual), bem como também acima do valor fixado pela própria Resolução Legislativa Municipal n˚ 554, de 17.07.2008 consistiu sim em ato configurador de improbidade administrativa por ofensa clara aos princípios da legalidade, da impessoalidade e da moralidade administrativa, pois ofendido matematicamente os parâmetros claros estabelecidos pelo texto constitucional, havendo cristalina ofensa a imparcialidade quanto aos interesses do próprio ordenador e conspurcação do dever ético do administrador. Estando assim vulnerado, por conseguinte, o dever de probidade do agente público ocupante de cargo eletivo ao qual o povo depositou sua confiança.
Nesta senda, violada uma clara regra constitucional que estabelece que os subsídios dos vereadores de municípios com menos de 50.000 (cinquenta) mil habitantes corresponderão a 30% do subsídio dos Deputados Estaduais resta indubitável a presença do elemento volitivo do autor do fato para o descumprimento de tal regra, cuja margem de apreciação hermenêutica é meramente literal. Assim, dessume-se pelas circunstâncias objetiva do caso que tal descumprimento não redundou de mero erro ou de ausência de cuidado objetivo do ordenador de despesas, mas sim de um ato consciente e voluntário perpetrado pelo agente no exercício de mandato eletivo que foi dirigido de modo finalístico ao descumprimento da norma contida nos artigos 29, inciso VI, alínea “b” e 39, § 4˚, ambos da Constituição Federal, tratando-se, portanto, de ato de improbidade administrativa que causou o enriquecimento do próprio agente e de seus demais colegas e que causou ainda prejuízo ao Erário Público Municipal.
Em suma, do cotejo das circunstâncias objetivas indubitáveis de descumprimento de regra constitucional cristalina do caso em tela evidencia-se o elemento subjetivo do agente, a saber, o dolo do mesmo no descumprimento da norma-regra constitucional, a saber, a vedação de pagamento de subsídio a ocupante de cargo eletivo fora dos parâmetros estabelecidos pelo próprio texto constitucional, ofensivo ainda, in casu, da impessoalidade e por decorrência da própria moralidade administrativa.
Assim, descumpridos princípios reitores da Administração Pública fica evidente não só a vulneração ao dever de probidade, quanto a presença do elemento subjetivo do tipo, pois as hipóteses previstas no artigo 11, caput e seus incisos, da Lei de Improbidade admitem apenas a modalidade dolosa, pois se tratam de condutas que atentam contra os deveres de honestidade e lealdade do agente público às instituições públicas, in casu, o Município de Armação dos Búzios.
Todavia, os atos dolosos do 1˚ réu que levaram a rejeição de suas contas no processo de n˚ 261528-3/03 no âmbito do Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro não ofenderam apenas princípios setoriais da Administração Pública, consistindo em ofensa aos deveres de honestidade, lealdade e probidade para com esta municipalidade, mas também redundaram tais atos em enriquecimento sem causa do mesmo agente e de demais agentes políticos e em prejuízo ao Erário Público Municipal, donde se dessume a paridade do caso em tela com a hipótese também prevista na alínea “l”, do inciso I do artigo 1˚, da Lei de Inelegibilidade.
Outrossim, a condenação de rejeição de contas do 1˚ réu relativo ao exercício de seu mandato eletivo de vereador do órgão legislativo desta municipalidade no âmbito do Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro, inclusive com imposição de multa, resultou na inclusão de seu nome na lista de inelegíveis daquela Corte, donde se dessume que o respectivo acórdão já está consubstanciado em decisão irrecorrível daquele órgão, que então disponibilizou à Justiça Eleitoral tal causa ensejadora de inelegibilidade do pré-candidato nos moldes do artigo 11, § 5˚, da Lei n˚ 9.504/1997, que disciplina as Eleições. Ademais, inexiste notícia de qualquer suspensão ou anulação de tal decisum pelo Poder Judiciário.
Em prosseguimento, tal irregularidades que redundaram na escorreita rejeição das contas do pré-candidato pelo Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro configuram, consoante precedentes do próprio Colendo Tribunal Superior Eleitoral em irregularidades insanáveis, pois se o mero pagamento de indevido a vereadores de participação em sessões extraordinárias já consiste em inconsistências insanáveis, o que se dirá, portanto, de pagamento de subsídios fora dos parâmetros estabelecidos pelo próprio texto constitucional.
Assim, não assiste razão ao defendente no sentido de que a eventual devolução de valores percebidos a maior pelos vereadores agraciados com o pagamento de parcelas além dos parâmetros fixados para o pagamento dos subsídios desses agentes políticos possa olvidar então a caracterização de tais irregularidades reconhecias pela Corte de Contas como inconsistências constitucionais e ilegais insanáveis, mas, ao contrário, caracteriza-as como meras irregularidades sanáveis.
Assim, não é demasiado transcrever-se abaixo a ementa do citado precedente do Colendo Tribunal Superior Eleitoral no julgamento do Agravo Regimental no Recurso Especial Eleitoral nº 329-08/SP, cuja a relatoria foi da ínclita Ministra Laurita Vaz, procedido em 13.11.2012, in verbis:
ELEIÇÕES 2012. ELEITORAL. PROCESSUAL CIVIL. QUESTÃO RELATIVA À SUPOSTA EXISTÊNCIA DE LEI MUNICIPAL AUTORIZATIVA. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. SÚMULAS 282 E 356 DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. PRETENSA AFRONTA AO PRINCÍPIO DO DEVIDO PROCESSO LEGAL. INEXISTENTE. REGISTRO DE CANDIDATURA. REJEIÇÃO DE CONTAS. PAGAMENTO A VEREADORES EM DESCOMPASSO COM O ART. 57, § 70, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. IRREGULARIDADE INSANÁVEL. PRECEDENTES. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO.

Destacou a Excelentíssima Senhora Relatora do julgamento daquele recurso, Ministra Laurita Vaz em seu voto que, como se vê da leitura dos termos da ementa daquele apelo, de fato, é possível afastar a condição de insanável, desde que a Corte de Contas não repute o ato como grave nem determine a devolução ao erário do valor respectivo. Entretanto, o precedente citado pelo autor da ação não guarda qualquer conexão fática com a hipótese sustentada na defesa do pré-candidato de regularidade meramente sanável, pois o Tribunal de Contas Estadual, além de reputar a conduta ora sob análise como grave, condenou o responsável a ressarcir aos cofres públicos os valores indevidamente pagos.

Contudo, a estruturação da inelegibilidade haurida da letra “g” em estudo é da competência da Justiça Eleitoral, como preleciona o jurista José Jairo Gomes em sua obra “Direito Eleitoral”, consoante assente posição da jurisprudência da mais alta Corte Eleitoral, logo, é desta Justiça Especializada a competência para apreciar a matéria atinente a configuração de ato de improbidade decorrente de rejeição de contas de ordenador de despesas relativa ao exercício de seu mandato eletivo e de qualificar, sobretudo, todos os fatos que lhes são apresentados, tratando-se, assim, de competência absoluta ratione materiae. Desta maneira, é ainda da Justiça Eleitoral, de modo inequívoco, a competência para dizer se a irregularidade apontada é, ou não, insanável, se configura, ou não, ato doloso de improbidade administrativa e, por fim, se constitui, ou não, a hipótese de inelegibilidade cominada pelo artigo 1˚, inciso I, alínea “g”, da Lei Complementar n˚ 64/90, com a redação dada pela denominada Lei da ‘Ficha Limpa’.

No caso vertente, além da Corte de Contas por decisão agora irrecorrível e não suspensa ou anulada pelo Poder Judiciário, além de ter reputado as irregularidades que levaram a rejeição das contas do 1˚ réu como graves, determinando a devolução dos valores pagos a maior, verificou-se ainda que nem todos os valores pagos em desacordo com os artigos 29, inciso VI, alínea “b” e 39, § 4˚, ambos da Constituição Federal foram devolvidos, como informou a própria defesa em sua contestação, pois consoante a confissão do demandado os Ex-Vereadores João de Melo Carrilho e Evandro Oliveira da Costa e o Vereador Leandro Pereira dos Santos não devolveram as parcelas pagas além dos parâmetros constitucionais e legais de seus subsídios nem tão pouco parcelaram tais débitos, apesar de terem sido todos instados para tanto pelo Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro, donde se dessume que o prejuízo ao Erário Municipal não foi integralmente ressarcido, não havendo de se conjecturar nem juridicamente nem factualmente que a hipótese em tela se tratou de irregularidade sanável.

Ad cautelam, não incide no caso vertente o entendimento que vem sedimentando de que as contas rejeitadas pela Corte de Contas de integrantes do Poder Executivo necessitam também do pronunciamento negativo do Poder Legislativo sobre as contas do governante ou gestor, por competir a tal Poder o julgamento das contas do chefe do Poder Executivo, atuando então o Tribunal de Contas apenas como órgão auxiliar. No caso vertente as contas foram ordenadas por próprio integrante do Poder Legislativo no exercício de função atípica deste Poder, assim, a hipótese é de julgamento das contas exercido pelo próprio Tribunal de Contas a teor do que dispõe o artigo 71, inciso II, da Constituição Federal. Da regra de controle externo fixada pelo dispositivo constitucional em apreço decorre que ao Tribunal de Contas competirá julgar das contas dos Chefes dos outros Poderes, ou seja, do Legislativo e do Judiciário.

Por todos os elementos trazidos na ação impugnativa ministerial resta mais do que claro que o réu cometeu no exercício de seu mandato eletivo de Vereador da Câmara Municipal de Armação dos Búzios no exercício fiscal de 2010, na qualidade de ordenador de despesas, atos dolosos de improbidade administrativa que concorreram para o seu enriquecimento indevido e para o enriquecimento ilícito dos demais Vereadores, causando prejuízo ao Erário Municipal, o que levou a Corte de Contas Estadual a rejeitar as contas do aludido agente político por irregularidades reputadas como graves que feriram ainda os princípios da legalidade, da impessoalidade e da moralidade administrativa, além do dever de probidade do agente político, tratando-se, portanto, de irregularidades insanáveis.

Destaca-se, por fim, que a mencionada decisão da Corte de Contas proferida em 09/06/2015, no processo n˚ 261528-3/03, tornou-se irrecorrível no âmbito daquele órgão de controle, estando o nome do réu no rol de inelegíveis do TCE, sem que sobre tal decisum incida qualquer suspensão ou anulação haurida do Poder Judiciário, o que faz incidir, então, a suspensão dos direitos políticos do demandado pelo prazo de 8 (oito) anos contados a partir da data da prolação do aludido acórdão que permitiram a esta Justiça Especializada perscrutar a presença de todos os requisitos previstos na causa de inelegibilidade prevista no artigo 1˚, inciso I, alínea “g”, da Lei Complementar n˚ 64/90.

Isso posto, de acordo com a fundamentação supra para proteção efetiva do princípio da moralidade eleitoral e em virtude da suspensão dos direitos políticos do demandado com previsão legal de inelegibilidade cominada pela Lei Complementar nº 64/90, com alterações trazidas pela Lei Complementar n˚ 135/2010, julgo PROCEDENTE A IMPUGNAÇÃO DO REGISTRO DA CANDIDATURA DE MESSIAS CARVALHO DA SILVA para o cargo de Vereador, declarando-o inelegível para as eleições municipais 2016, na chapa proporcional da Coligação Partidária “BÚZIOS NÃO PODE PARAR”.

Publique-se nos termos da lei. Registre-se. Intimem-se. Aguarde-se o prazo recursal.

Armação dos Búzios, 31 de agosto de 2016.

MARCELO ALBERTO CHAVES VILLAS
Juiz Eleitoral
1  DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 24 ed. São Paulo: Atlas, 2011. p. 825.
2 RAMAYANA, Marcos. Direito Eleitoral - 15ª edição – Rio de Janeiro: Impetrus, 2016, p. 504.
3 Ob. cit. 2, p. 504.


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Satyro Edmilson Este MATUSALÉM já vai tarde !

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Calvet Antonio Carlos Na reta final, quantos sobrarão?