Audiência Pública "Búzios sem esgoto" |
Quem se der ao trabalho de ler a ata da sessão em que foi aprovado o Projeto de Lei (2158/2013) encaminhado pelo executivo Estadual que "autoriza a outorga de subsídio pelo Estado na concessão pública dos serviços e obras de implantação, ampliação, manutenção e operação dos sistemas de abastecimento de água, de coleta e tratamento de esgostos de Armação dos Búzios, Cabo Frio, Iguaba Grande e São Pedro da Aldeia e distribuição de água potável para o município de Arraial do Cabo" ficará espantado com o nível de subserviência da quase totalidade dos deputados estaduais ao governador Sérgio Cabral. Lembra muito a nossa Casa do Amém" buziana. Aprova-se a outorga de subsídio a uma empresa concessionária sem ao menos se saber se no contrato de concessão estava prevista essa responsabilidade da concessionária. Como bem frisou a deputada Janira Rocha (PSOL) em sua "Nota à sociedade civil de Búzios e à imprensa", transferem-se ilegalmente "recursos públicos (do FECAM e outras fontes) para empresas privadas, o que configura flagrante desvio de função de dinheiro público".
Na leitura fica claro que nenhum dos deputados estaduais conhece o contrato feito com a Prolagos à época da concessão. Vota-se em regime de urgência, sem nenhuma justificativa, sem orçamento, sem um Projeto, sem cronograma físico-financeiro. Explicita-se no Projeto de Lei "como o Poder Executivo vai repassar o dinheiro, mas não se explicita como a concessionária vai gastar o dinheiro" (Deputado Luiz Paulo). Também não se sabe se o repasse será em sete parcelas iguais ou não. É um Projeto do Executivo muito mal feito encaminhado a esta Casa, sem o grau de detalhamento desejado, em regime de urgência. Votando no escuro, sem conhecer o contrato com a Prolagos, os deputados deram um "cheque em branco" (Deputado Domingos Brazão) para o Governador, aquele mesmo que participou da farra dos guardanapos em Paris, "dos favores à Delta, do Senhor Cavendish, ou ao senhor Eike Batista, ou à Odebretch, ou à OAS e outras empreiteiras" (Deputado Paulo Ramos).
É bom lembrar que a privatização da CEDAE no então governo Marcelo Alencar foi feita na onda da privataria tucana. Terceirizava-se tudo, exceto a alma, porque o Diabo não deixava. Conta-se que a Prefeitura de Búzios assinou com a Prolagos no último dia do prazo concedido pelo Governador. Nosso prefeito à época não teria tido tempo de ler todo o calhamaço do contrato. Teria assinado sem ler. Mirinho sempre fora favorável à privatização porque, apesar de ser filiado ao PDT, ao longo de seus três mandatos, terceirizou quase toda Prefeitura (serviços, obras, aluguéis, etc,).
Se houve a privatização da empresa CEDAE, seria correto que a concessionária fizesse, ela própria, essas obras com os recursos que recebe através de sua gestão nos municípios da Região. Por que então privatizar? Só faz sentido a privatização se a iniciativa privada apresentar um serviço de melhor qualidade e com um custo menor para a população. Se a concessionária não tem capacidade para prestar o serviço, então que entregue a concessão. É muita "generosidade" (Deputado Altineu Cortes) do Estado passar o negócio para um terceiro e ainda botar dinheiro para o cara ganhar dinheiro com ele. Na maioria dos casos, os interesses da sociedade não são contemplados pelas privatizações promovidas pelos governos neoliberais. Se elas não cumprem os prometidos planos de ampliação dos serviços e aumentam abusivamente as tarifas para os consumidores, porque manter a concessão?
Decorridos 17 anos da asssinatura do contrato com a Prolagos, do esgoto captado pela ETE de São José, coletado (criminosamente) em tempo seco e apenas na Península, 40% é tratado de forma primária assistida , indo o restante (60%) praticamente in natura para os canais da Marina. Quando falamos de 40% não estamos nos referindo ao município como um todo, mas apenas àquilo que é coletado da península. Segundo informações do secretário municipal de meio ambiente Carlos Alberto Muniz, para termos esgoto 100% tratado, "seriam necessários R$ 200 milhões". Somos um município rico. E não é difícil encontrar parcerias para levantar este montante. Não podemos é ficar à mercê de uma empresa que até 2041- prazo de sua concessão- prevê investir apenas R$ 8 milhões. Até lá, com valas negras nas nossas praias, de quinto destino turístico internacional do Brasil, nos tornaremos um destino perdido. Se não podemos mais, de jeito nenhum, conviver com esgoto em nossas praias e lagoas, muito menos aceitar virar a latrina da Região dos Lagos.
Precisamos entrar no MPE e MPF para paralisar imediatamente essa obra de transposição do efluente do esgoto tratado (das ETEs de S. P. da Aldeia e de Iguaba Grande) da Lagoa de Araruama para o Rio Una. Não resta dúvida que essa transposição , pela proximidade, ameaça o Mangue de Pedra, raro ecossistema que precisa ser protegido. Da mesma forma que a população de Búzios se mobilizou para barrar empreendimento imobiliário próximo ao Mangue, também irá se mobilizar para impedir que o efluente do esgoto seja despejado no Rio Una. Como resultado dessa luta, temos hoje tramitando na ALERJ o Projeto de lei (PL 1625/2012), de autoria dos deputados Janira Rocha, Wagner Montes e André Lazaroni, que cria o Parque Estadual do Mangue de Pedra.
Segundo dados do Censo 2010 do IBGE, Armação dos Búzios tinha apenas 18,44% das suas casas ligadas na rede geral de esgoto. Arraial do Cabo, que rompeu em 2001 o contrato com a Prolagos no que diz respeito ao tratamento de esgoto, tinha 70,99% das casas ligadas na rede. Não há outra alternativa, precisamos fazer o mesmo, como Poder Concedente, mantendo o contrato com a Prolagos apenas no que diz respeito à água, passando o município de Búzios a tratar seu esgoto através de uma uma empresa pública, de economia mista, nos moldes da CEDAE.