Eficácia do medicamento remdesivir ainda é avaliada em testes laboratoriais. Foto Ulrich Perrey/ POOL/ AFP |
Pesquisando
fake news em sites de jornalismo investigativo (“fact-check”)
encontrei esta postagem no "ESTADÃO"
do dia 15 de maio de 2020.
“Em
um vídeo que circula na internet, um homem que se identifica como
médico especialista em ortopedia afirma que a cloroquina é
alvo
de uma conspiração,
por parte de governos e da indústria farmacêutica, que teriam
interesse na utilização de uma droga chamada remdesivir –
muito
mais cara – no tratamento dos pacientes com a covid-19,
doença provocada pelo novo coronavírus.
Na
postagem, que é o trecho de uma transmissão ao vivo de mais de uma
hora de duração, Cláudio Agualusa afirma que a cloroquina já é
usada sem restrições há anos, no tratamento de outras doenças, e
que a relutância na adoção de um protocolo que inclua a substância
é uma tentativa
de ampliar a comercialização de uma droga desenvolvida por um
laboratório americano, que custaria “milhões”.
Primeiro,
há governantes que defendem abertamente o uso da cloroquina, casos
de Donald
Trump e Jair
Bolsonaro.
Segundo, o uso da cloroquina e da hidroxicloroquina no tratamento de
pacientes com a covid-19 ainda
é objeto de estudos clínicos em todo o mundo,
inclusive em uma iniciativa liderada pela Organização
Mundial da Saúde (OMS). No
Brasil, a coordenação é da Fiocruz.
Do mesmo modo, o remdesivir ainda está sendo avaliado no combate à
doença.
Por
que checamos isto?
O
Comprova monitora conteúdos
duvidosos
sobre o novo coronavírus e sobre a covid-19 compartilhados nas redes
sociais e aplicativos de mensagens que tenham grande alcance nas
redes sociais. O vídeo investigado pelo Comprova alcançou 44 mil
compartilhamentos em somente uma das publicações encontradas.
A
cloroquina e a hidroxicloroquina têm estado no centro de inúmeros
rumores que circulam, em especial, nos Estados
Unidos e
no Brasil.
Muitos desses boatos dizem que essas
substâncias seriam a “cura” para a covid-19,
o que poderia desmobilizar a sociedade no enfrentamento da pandemia.
Além disso, a cloroquina e a hidroxicloroquina só
podem ser usadas sob orientação médica, pois têm efeitos
colaterais significativos.
Enganoso,
para o Comprova, é o conteúdo que confunde, com ou sem a intenção
deliberada de causar dano.
Como
verificamos?
Para
esta verificação, buscamos dados da Food and Drug Administration
(FDA), órgão sanitário dos Estados Unidos, estudos recentes
envolvendo o tratamento da covid-19 com hidroxicloroquina e
contatamos um especialista em infectologia.
Buscamos
o vídeo original com as falas de Agualusa, publicado originalmente
numa transmissão ao vivo no Facebook dele e entramos em contato com
os municípios onde o médico diz atuar e com o Conselho Regional de
Medicina do Rio de Janeiro.
Também
foram consultadas matérias jornalísticas, de veículos nacionais e
internacionais, com informações sobre o tema.
Verificação
No
vídeo, que circula pelas redes sociais e pelo Youtube, o médico
Cláudio Agualusa defende a utilização de um protocolo barato para
o tratamento de pacientes com a covid-19: administração do
antibiótico azitromicina, de cloroquina ou hidroxicloroquina e de
sulfato de zinco.
Apesar
do baixo custo, o médico afirma que o tratamento não é adotado
porque “eles”
estão aguardando a possibilidade de utilização de um medicamento
muito mais caro, o remdesivir.
A
conspiração,
segundo o médico, não é política, mas sim em prol do
lucro da indústria farmacêutica,
já que cada dose do medicamento custaria “milhões
de dólares”.
O
remdesivir
Trata-se,
realmente, de um tratamento antiviral em investigação, administrado
por infusão diária. Segundo anúncio do governo americano, no
último dia 29, é o primeiro remédio capaz de melhorar a situação
dos doentes de covid-19.
O
FDA, que regula os medicamentos nos Estados Unidos, autorizou
o uso de remdesivir em emergências,
o que possibilita entrada da droga no mercado americano sem a
exigência de dados completos sobre segurança e eficácia.
A
droga, até então era classificada como uma “medicação órfã”,
assim como apontado por Agualusa. Essa é uma forma de elencar
fármacos destinados ao diagnóstico, prevenção e tratamento de uma
doença rara ou negligenciada, cuja produção não é economicamente
viável. Há dentro do FDA, o órgão instituído para promover
a pesquisa e o desenvolvimento de drogas órfãs é o Office of
Orphan Products Developement (OOPD).
Segundo
o laboratório Gilead Science,
que é responsável pelo desenvolvimento do remdesivir, a droga é
fruto de uma pesquisa desenvolvida há mais de uma década e sua
aplicação já foi testada em doenças como a Ebola, por exemplo. Em
entrevista à NPR, National Public Radio, organização de mídia
parcialmente financiada pelo governo dos EUA,
uma representante do laboratório disse que o medicamento ainda não
tem um preço definido, mas que um suprimento inicial, de 1,5 milhão
de doses da droga, foi doado para o tratamento de pacientes com
covid-19.
Em
um modelo
apresentado pelo Institute for Clinical and Economical (ICER) –
entidade voltada para a precificação e análise da efetividade
clínica de medicamentos, localizada em Boston (EUA) –, o
tratamento com o remdesivir deve custar entre 10 e 4,5 mil dólares.
A estimativa leva em conta o custo de produção e a efetividade do
medicamento. Apesar do valor máximo ser alto – mais de R$ 26 mil,
considerada a cotação do dólar americano no dia 12 de maio –, a
quantia está bem distante dos “milhões
de reais” a que Agualusa se refere no vídeo.
Sobre
a utilização do medicamento no Brasil, que, segundo Claudio
Agualusa, só
começaria depois de um número muito maior de mortes,
o ministro da Saúde, Nelson Teich, disse, na segunda-feira,
11 (portanto, depois da realização da live), que está
condicionada à realização de estudos clínicos que comprovem a sua
eficácia nos casos do novo coronavírus.
A
cloroquina
O
vídeo de Claudio Agualusa sugere a existência de campanha
contra a hidroxicloroquina e a cloroquina, realizada pela indústria
farmacêutica e governos,
por conta do custo baixo do medicamento e do tratamento com seu uso
associado.
As
pesquisas mais recentes, publicadas em periódicos médicos
importantes como o Journal
of the American Medical Association e
o The
New England Journal of Medicine,
não
encontraram redução de mortalidade por covid-19
entre pessoas que foram medicadas com hidroxicloroquina.
O
uso do medicamento em pacientes com o novo coronavírus, portanto,
apesar de autorizado no Brasil, não
é uma unanimidade.
O Comprova entrou
em contato com Estevão Urbano,
presidente da Sociedade Mineira de Infectologia e Membro do Comitê
de Enfrentamento à covid-19 de Belo Horizonte, que disse que não
procede a crença de Agualusa na existência de uma conspiração
contra a cloroquina.
“Não existe nenhuma normatização ainda. Existem pouco remédios
cientificamente testados, os usos empíricos são baseados em
trabalhos muito frágeis”, afirmou.
Segundo
Urbano, “a
cloroquina está muito longe de ser comprovada como uma droga
efetiva,
e é por isso que ela não é, ainda, um consenso. Embora possa ter
também seu papel, não
é mais do que uma inferência, ainda, muito frágil.”
O
tratamento sugerido por Cláudio Agualusa, inclusive, é o mesmo
sugerido por um médico de Nova Iorque, e, como
apurado pelo Comprova, ainda não tem comprovação científica.
Cláudio
Agualusa
O
homem que aparece no vídeo é o médico fluminense Cláudio
Agualusa. Ele possui registro
ativo junto ao Conselho Regional de Medicina do Rio de Janeiro,
e aparece em catálogos online, como o Doctoralia,
e o CatálogoMed como
especialista em Ortopedia e Traumatologia. Na live, aliás, ele
também se identifica como ortopedista, diz já ter receitado
cloroquina e hidroxicloroquina a pacientes com “artrites severas”.
Não
há qualquer indicação de que Agualusa esteja atuando diretamente
no tratamento de pacientes com a covid-19.
Agualusa
foi candidato a Deputado
Estadual,
no Rio de Janeiro, em 2018, pelo PRB. Em 2016, já havia se
candidatado a prefeito
de Búzios, pelo PRP.
Não se elegeu em nenhuma das duas ocasiões.
O
médico mantém um perfil ativo e uma fanpage no Facebook, onde
publica vídeos e textos sobre o novo coronavírus e a covid-19. Ele
também já realizou várias transmissões ao vivo — de mais de uma
hora de duração — sobre o tema. Nas postagens, Agualusa defende a
importância do isolamento social, fala sobre a higienização das
mãos e de produtos e, principalmente,
trata dos benefícios do tratamento realizado com a cloroquina.
O
Comprova tentou entrar em contato com Agualusa, por meio de seu
perfil no Facebook, mas não recebemos uma resposta. Na página
oficial dele, não há a possibilidade de envio de mensagens
privadas.
Contexto
Desde
março, o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, vem
incentivando o uso da cloroquina e a hidroxicloroquina, normalmente
prescritas no tratamento de doenças como malária, artrite e lúpus.
No
mesmo mês, o presidente do Brasil, Jair Bolsonaro, também passou a
fazer o mesmo. Bolsonaro anunciou o aumento
da produção da droga no país em
21 de março, e sua campanha em favor da substância foi um dos
pontos de desentendimento com o ex-ministro da Saúde, Luiz Henrique
Mandetta, que não
recomendava o uso indiscriminado
do medicamento.
Desde
então, apoiadores de Trump e Bolsonaro passaram a defender
firmemente o uso das substâncias, cuja eficácia continua sob
análise”.
Fonte:
"ESTADÃO"
Observação
1: O blog está, como sempre esteve, à disposição dos
citados para quaisquer esclarecimentos que queiram fazer a respeito
das postagens publicadas.
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