O jornalista LÚCIO
DE CASTRO, do site de jornalismo investigativo "agenciasportlight",
conquista Prêmio da Petrobras.
Tudo começou com um pedido feito junto à Eletrobrás em 2015 com base na Lei de Acesso à Informação (LAI) solicitando "as prestações de contas e relatórios da Confederação Brasileira
de Basquete (CBB) enviados para a Eletrobrás dos anos de 2009 até
2013”.
No site "Agência Sportlight"
Lúcio conta:
"A
montanha de documentos era assustadora. Intimidadora. Desanimadora.
Mas era preciso encarar. Garimpar é preciso. O suor é sempre maior
do que a inspiração, ao contrário do que se imagina quando se vê
tudo pronto ali.
Foram
meses de várias idas ao prédio da Eletrobras, no Centro do Rio.
Tardes inteiras. Um dia lindo lá fora…
Na
verdade, foi tanto tempo garimpando que era para ser publicada em um
lugar e no meio do caminho tinha mudado…
Muitas
vezes se pensa em desistir ao se destrinchar uma montanha dessas de
papeis. Mas há um juramento no meio disso tudo, há a certeza de que
esse ofício só existe e só pode existir enquanto fiscalizador de
qualquer poder.
Tal
certeza gerou uma série de oito reportagens: “A Farra do
Basquete”, publicadas entre 2015/16 no UOL. (Muito virá pela
frente na Agência Sportlight de Jornalismo Investigativo e isso nos
alegra profundamente!)
Eram
só papeis, uma montanha. Mas no meio deles existiam histórias. De
malversação de verbas, de dinheiro público virando farra em Paris,
comissões nababescas que não se sustentavam…
Jantar em restaurante na Torre Eiffel, foto agenciasportlight |
Coisas
que até quem vem de longe se impressiona. R$ 15 milhões gastos em
repasse para duas agências de marketing pelo mesmo contrato, pagos
em diferentes momentos. Trinta e dois por cento (32%) gastos em
comissões para agências abertas logo depois da assinatura do
contrato…Presidente e mulher viajando de classe executiva para
Paris e usando o cartão de crédito da confederação para pagar
jantares na Torre Eiffel. Todas as despesas apresentadas ali no meio
do bolo da prestação de contas pra Eletrobrás. Enquanto pagava
vinhos caros em Paris com o dinheiro da Eletrobrás a mulher do
presidente discursava nas redes sociais contra corruptos…Teve muito
mais…
Falaremos
mais delas e lembraremos um pouco alguns detalhes (para que ninguém
esqueça. É tanto escândalo, CBV, CBB, COB, CBDA que as pessoas vão
perdendo a conta. Mesmo).
Nesse momento, mais do que nunca, é
importante relatar o processo disso tudo como está acima.
No
exato momento em que muitos ignoram a essência do nosso ofício e
acham que só esperando MPF, PF, etc se pode fazer algo, é preciso
lembrar: muito se pode fazer. Quase tudo. Fontes públicas. Se isso
valer como inspiração para um único estudante de jornalismo, já
terá valido a pena.
A
questão é vontade. E isso é uma decisão política, embora tantos
tenham pavor da palavra. É querer.
Cumprir
tais prerrogativas implica em investigar, apurar, fustigar,
independente de quem seja o poder.
Viver
apenas, novamente e sempre ressaltando, com as nobres exceções de
sempre, de vazamentos e presentes no lugar do exercício do ofício,
tem levado nosso jornalismo ao papel de irrelevância que ocupa hoje
no cenário mundial. Salvo as nobres exceções de sempre.
E
não estamos falando aqui da irrelevância do nosso jornalismo nos
dias de hoje diante de Estados Unidos, Inglaterra, Espanha…As
andanças mundo afora em congressos, palestras, debates mostram que
nos tornamos irrelevantes ao nos confrontarmos com o que está se
fazendo na Costa Rica, em El Salvador, no México…Somos a terceira,
quarta, talvez quinta divisão do jornalismo mundial. Embora com
muita pose.
Já
vamos longe demais nesse papo que começou só pra dar conta da
imensa alegria em ver reafirmado, não só pelo prêmio, que é
muito, claro, mas pelo carinho, pelo “vamos em frente” de tantos,
todos lidos e registrados. Voltaremos ao tema. Hoje é dia de
comemorar.
Deixo
aqui, com todo carinho, minhas palavras proferidas no palco do
Muncipal ontem ao receber o prêmio. Obrigado a todos",
Lúcio de
Castro
Discurso
ao receber o Prêmio Petrobras de Jornalismo em 9 de outubro de 2017:
“Não
poderia ser mais significativo estar aqui hoje recebendo esse prêmio
de jornalismo esportivo nesse momento, pelas notícias que todos tem
acompanhado.
Mas até por isso creio ser fundamental uma
brevíssima reflexão sobre nosso ofício.
A
essa altura, imagino que ninguém mais tem qualquer dúvida:
Havelanges, Teixeiras, Nuzmans e afins só foram possíveis pelas
omissões nossas de cada dia.
Nesse
momento, em que as trevas e a sombra do autoritarismo, da censura e
do obscurantismo se avizinham e se põe sobre nossas cabeças, não
poderia deixar tal reflexão apenas para o jornalismo esportivo.
Também
não é possível jogar para baixo do tapete e agir como avestruz sem
cumprir tais prerrogativas do jornalismo quando tenebrosas transações
entregam a cada dia as riquezas de um país sem que isso tenha sido
referendado pelo voto.
Queria
também dedicar esse prêmio:
Queria
dizer que hoje e sempre, Victorino Chermont, irmão que a vida me
deu, está presente. É dele também essa honraria. Jornalista maior.
Presente.
E
sempre, aos meus. Minha família, aos que estão aqui. Todos.
Em
especial a minha mãe, a meu pai. Que ao me ensinarem, em seus
exemplos diários, um dos principais fundamentos e sentidos da vida,
me ensinaram também que eles são a essência do jornalismo.
Fundamento
de vida e de jornalismo que poderia estar resumido na frase de
Guimarães Rosa sobre a vida: “O que ela quer da gente é coragem”.
A
primeira coisa que farei ao sair daqui será dar um beijo e entregar
esse prêmio ao meu pai.
Foi
com ele, Marcos de Castro, primeiro autor de uma série de jornalismo
investigativo sobre esporte no Brasil em 1963, “Futebol, do sonho à
realidade”, em parceria com Dácio de Almeida, que me ensinou algo
que sempre repete e oxalá me siga como sempre esteve e está com
ele: “O jogo é deles, a luta é nossa”.
Muito
obrigado.
Fonte: "agenciasportlight"