sexta-feira, 13 de janeiro de 2017

O atraso político perdeu: Justiça de Búzios acaba com o trem da alegria do G-5

Processo No 0000008-39.2017.8.19.0078

Autor
MEIRY ELLEN COUTINHO MENDES GARCIA
Autor
SABRINA CARDOSO PEREIRA
Autor
ANDRÉ LUIZ TARDELLI DA SILVA OLIVEIRA
Autor
ANA MARIA CRAVO PEREIRA
Autor
RENAN MOREIRA RAPOSO DA SILVA
Autor
FRANCISCO FERREIRA DA SILVA
Autor
MAICON ANDERSON COUTINHO MENDES
Autor
VANESSA DOS SANTOS DA COSTA COUTINHO MENDES
Autor
JORGE RAFAEL DE SOUSA MOURA
Autor
JOÃO FILIPE SOUZA SENA
Autor
BIANCA DE MIRANDA CARVALHO PEREIRA
Autor
IRACEMA SANTIAGO OLIVEIRA
Autor
ANDRÉIA PAULA DE ATHAYDE
Autor
LUIS GUSTAVO SABINO GUIMARAES
Autor
GABRIELA SILVA DE SOUZA
Advogado
(RJ175313) CRISTIANO FERNANDES DA SILVA
Réu
CÂMARA MUNICIPAL DE ARMAÇÃO DOS BÚZIOS
Representante Legal
JOÃO CARLOS ALVES DE SOUZA
Réu
JOSUÉ PEREIRA DOS SANTOS
Réu
VALMIR MARTINS DE CARVALHO
Réu
GLADYS PEREIRA RODRIGUES NUNES
Réu
ADIEL DA SILVA VIEIRA
Autor
GUILHERME DE LUCAS CRAVO PEREIRA
Autor
CINTHIA SANTINA ARAÚJO AFONSO ESTEVES
Autor
KÁTIA GONÇALVES DA CONCEIÇÃO
Autor
MILENA ALONSO FERREIRA MIKA
Autor
NATALI DOS SANTOS CEDRO
Autor
ÉRICA DA SILVA VIANNA
Autor
BRUNA SICILIANO MELO DA SILVA


Nesta data, faço os autos conclusos ao MM. Dr. Juiz Gustavo Favaro Arruda
Em 12/01/2017

Decisão

Trata-se de ação popular ajuizada por MEIRY ELLEN COUTINHO MENDES GARCIA e outros em face de ato praticado pelo presidente da Câmara Municipal de Armação dos Búzios, o vereador JOÃO CARLOS ALVES DE SOUZA, e os demais membros da mesa diretora.

Os requerentes alegam que a mesa diretora da Câmara dos Vereadores, no dia 06/01/2017, em recesso legislativo, em sessão extraordinária, propôs e aprovou, com participação dos requeridos, as Resoluções 01 e 02/2017.

A Resolução 01 alterou a estrutura da Câmara, para lhe acrescentar 13 cargos comissionados, que, somados aos 49 existentes, resultam na existência atual de 62 cargos comissionados.

A Resolução 02, por seu turno, revogou Resolução 909/2016, fazendo repristinar 41 cargos comissionados extintos por esta última, de modo que, então, restaram 111 cargos comissionados. Atualmente, existem apenas 23 cargos de provimento efetivo mediante concurso.

Dizem que essas resoluções ferem inúmeros princípios de direito administrativo, entre os quais o da legalidade, o da impessoalidade, o da moralidade, o da publicidade e o da eficiência.

Pedem, liminarmente, a suspensão dos efeitos das Resoluções 01 e 02/2017 e, no mérito, o seu desfazimento.

É O RELATÓRIO. DECIDO.

Nos autos de processo 0004104-34.2016.8.19.0078, este Juízo determinou que ficassem suspensos os efeitos da Resolução 909/2016, da Mesa Diretora da Câmara Municipal de Armação dos Búzios, tendo em vista a existência de indícios de que o ato seria potencialmente lesivo ao patrimônio público.

A Resolução 909/2016 acrescentava ao quadro permanente do pessoal do Poder Legislativo Municipal 20 cargos de agente legislativo, 01 cargo de técnico em contabilidade e 01 cargo de técnico em informática.

Como bem colocado pelo Ministério Público naqueles autos, a criação de cargos no âmbito dos Poderes Públicos deve observar os parâmetros estabelecidos na lei de diretrizes orçamentárias, por importar aumento de despesa, conforme estabelecido na Constituição Federal.

No caso em análise, considerando os elementos que constavam naqueles autos, não havia indicativo de que havia sido realizado estudo de impacto financeiro e que haveria dotação orçamentária para suprir o aumento das despesas em decorrência dos cargos criados.

Assim, por se tratar de medida adotada no encerramento dos mandados parlamentares, suspendeu-se os efeitos da Resolução 909/2016, para que, empossados os novos vereadores, a situação encontrasse novo ambiente de conformação política, evitando-se ainda possível interferência do recém transposto período eleitoral de 10/2016.

Ocorre que, apenas alguns dias depois da posse, em 06/01/2017, ainda antes do início oficial do período legislativo, os mesmos vereadores que haviam apenas jurado cumprir a Constituição Federal, tendo impugnado a Resolução 909/2016 nos autos de processo 0004104-34.2016.8.19.0078 sob o argumento de aumento desmedidos e impensado de despesas, levaram a discussão e aprovação as Resoluções 01 e 02/2017, criando 13 novos cargos e recuperando outros 41 que haviam sido extintos.

Ou seja, primeiro os vereadores vieram a Juízo para barrar a criação de 22 cargos de provimento efetivo, a serem providos por concurso público já realizado; menos de um mês depois, impulsionaram a aprovação de 13 cargos comissionados, recuperando outros 41 comissionados que estavam em vias de extinção.

O absurdo não é só fático, mas também jurídico. Para recuperar os 41 comissionados, a Câmara pretendeu repristinar a lei.

No ordenamento brasileiro, a lei revogada não se restaura por ter a lei revogadora perdido a vigência. Vereadores, elaboradores de lei, deveriam saber disso.

Note-se o que determina o art. 2, §3, da Lei de Introdução às Normas de Direito Brasileiro (Decreto-Lei nº 4.657/1942):

"Art. 2º Não se destinando à vigência temporária, a lei terá vigor até que outra a modifique ou revogue. §1º A lei posterior revoga a anterior quando expressamente o declare, quando seja com ela incompatível ou quando regule inteiramente a matéria de que tratava a lei anterior. §2º A lei nova, que estabeleça disposições gerais ou especiais a par das já existentes, não revoga nem modifica a lei anterior. §3º Salvo disposição em contrário, a lei revogada não se restaura por ter a lei revogadora perdido a vigência."

O erro básico é inadmissível, em especial se for considerado que a Câmara já conta e ainda pretendida contar com um verdadeiro exército de juristas.

Ocorre que, não bastasse a má técnica legislativa, os vereadores demonstraram verdadeira má-fé em sua conduta.

Primeiro porque nos autos de processo 0004104-34.2016.8.19.0078, foi omitida dolosamente a informação a respeito da extinção dos 41 cargos comissionados, o que altera substancialmente a análise do impacto financeiro da Resolução 909/2016.

Segundo porque o comportamento dos vereadores é contraditório. Por um lado, pedem a suspensão de ato legislativo, alegando criação inoportuna e desmedida de despesa; por outro, votam o verdadeiro aparelhamento do Legislativo municipal.

Mas não é só. As Resoluções 01 e 02/2017 ferem os mais básicos princípios de direito administrativo, a começar pela própria moralidade.

Como pode a Câmara Municipal de uma cidade de 30 mil habitantes, onde falta água, onde praticamente não há coleta de esgoto, onde as ruas não têm nome, onde o lixo anda espalhado pelas calçadas; como pode o Legislativo de uma cidade assim contar com 111 cargos comissionados? Quais propósitos não republicanos esses comissionados encobrem? Desvios de salários? Compra de votos? Compra de apoio político?

A situação é realmente intrigante, tendo em vista que a maior parte deles seria de juristas (assistentes parlamentares, assistentes legislativos). Para se ter uma ideia, é fato notório que toda a cidade, por sua subseção da OAB/RJ, sequer conta com esse número de advogados ativos.

As resoluções impugnadas também ferem o princípio da legalidade. Se há decisão judicial determinando a suspensão dos efeitos da Resolução 909/2016, essa decisão deve ser cumprida; ou atacada mediante o recurso específico. Neste ponto, é evidente que as Resoluções 01 e 02/2017 constituem verdadeira fraude legislativa.

Por fim, as Resoluções 01 e 02/2017 ferem o princípio da publicidade. Não há urgência que justifique a seção extraordinária realizada ainda antes do final do recesso, em período de alta temporada, logo após o réveillon, em comarca eminentemente turística. O momento foi deliberadamente escolhido para evitar o acompanhamento popular da decisão, até porque confronta orientação do Ministério Público e do Tribunal de Contas.

Casos como este, em que medida de tamanha gravidade foi adotada com menos de 10 dias de exercício do mandato, somente demonstram o grau de desvinculação e falta de representatividade do legislativo brasileiro, em todos os seus níveis.

Corre pela cidade a informação de que o Município passou a atrasar os pagamentos de seus servidores, coroando a crise que atinge todo o país e, em especial, o Estado do Rio de Janeiro e a Região dos Lagos. E o que os nobres vereadores fazem? Pretendem aparelhar o Legislativo com 111 cargos comissionados.

Enfim, como foi decidido nos autos de processo 0004104-34.2016.8.19.0078, considerando não haver indício que teria sido realizado estudo de impacto financeiro, nem de que haveria dotação orçamentária para suprir o aumento das despesas em decorrência dos cargos criados; considerando ainda que as resoluções impugnadas ferem orientação do Ministério Público e determinação da Constituição Federal para redução do número de funcionários comissionados; não há outra medida a ser adotada, senão a nova suspensão dos efeitos dos atos legislativos viciados.

Ante o exposto, DEFIRO o pedido liminar, nos termos do art. 5º, § 4º, da Lei 4.717/65, para determinar a imediata suspensão dos efeitos da Resolução 01 e 02/2017, da Mesa Diretora da Câmara Municipal de Armação dos Búzios.
Intimem-se com urgência.

Inclua-se no polo passivo o Município, tendo em vista que o ato impugnado produz efeitos concretos no orçamento municipal.

Citem-se os impetrados na forma do art. 7º da Lei 4.717/65.
Oficie-se à Câmara Municipal de Armação dos Búzios determinando que seja encaminhado ao Juízo documentos e informações a respeito do caso.

Apensem-se aos autos de processo 0004104-34.2016.8.19.0078.

Dê-se ciência ao Ministério Público e ao Procurador da Câmara de Vereadores do Município de Armação dos Búzios.

Diga o Ministério Público, nos autos de processo 0004104-34.2016.8.19.0078, se a suspensão dos efeitos da Resolução 909/2016 deve ser mantida, em especial no ponto em que extinguia os cargos comissionados. Diga também o que pensa sobre a aparente litigância de má-fé e suas consequências.

Após, dê-se vista dos autos ao Ministério Público com atribuição de tutela coletiva, para que verifique se a atitude dos vereadores caracteriza ato improbidade administrativa, em especial considerando as orientações já expedidas sobre os funcionários comissionados no Poder Público.

Armação dos Búzios, 12/01/2017.


Gustavo Favaro Arruda - Juiz Titular 

Comentários no Facebook:
Paulo Ramos Da Silva O Povo de Búzios merece respeito, justiça neles.


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