quarta-feira, 7 de outubro de 2015

TCU rejeita contas de Dilma de 2014 por unanimidade

Sessão do Tribunal de Contas da União para análise das contas do governo federal em 2014 no plenário TCU, em Brasília (Foto: André Dusek/Estadão Conteúdo)


















O TCU (Tribunal de Contas da União) recomendou nesta quarta-feira (7) a reprovação das contas de 2014 do governo da presidente Dilma Rousseff (PT). Em decisão unânime, oito ministros votaram pela rejeição das contas da petista.

Esta é a primeira vez que o TCU recomenda a reprovação das contas de um presidente desde que o órgão foi criado, em 1890. O parecer pela reprovação não significa que as contas foram reprovadas. Elas ainda precisam ser julgadas pelo Poder Legislativo.

A decisão foi recebida com fogos de artifício do lado de fora do tribunal. A oposição planeja usar o parecer como embasamento de um pedido de impeachment de Dilma.

Agora, o parecer pela rejeição das contas de Dilma deve ser encaminhado à Comissão Mista de Orçamento do Congresso. Lá, deputados e senadores irão avaliar o parecer e votar um relatório que deverá ser posto em votação no Congresso. Ainda não há consenso se a votação das contas acontecerá em sessões separadas da Câmara dos Deputados e do Senado ou em uma sessão conjunta do Congresso Nacional. A CMO tem, em média, 82 dias para avaliar o parecer do TCU.

Sessão de hoje

Os oito ministros que votaram pela reprovação das contas do governo Dilma de 2014 foram: Augusto Nardes (relator do processo), Walton Alencar, Benjamin Zymler, Raimundo Carreiro, José Múcio Monteiro, Ana Arraes, Bruno Dantas e Vital do Rego. Só o presidente da Corte, Aroldo Cedraz, não votou e apenas proclamou o resultado.

A sessão desta quarta-feira foi marcada por muita polêmica. Líderes da oposição como os deputados federais Mendonça Filho (DEM-PE), Antônio Imbassahy (PSDB-BA), Izalci (PSDB-GO) e o senador Cássio Cunha Lima (PSDB-PB) estiveram presentes à sessão. O parecer do TCU deve ser usado pela oposição para embasar pedidos de impeachment de Dilma.

Desde o último domingo (4), o governo vinha tentando suspender a sessão que analisaria as contas da presidente Dilma. A AGU (Advocacia Geral da União) fez um pedido de suspeição contra Nardes argumentando que ele teria se pronunciado sobre seu voto antes do julgamento e que essa conduta feria a Lei Orgânica da Magistratura. 

Na prática, o recurso pedia que Nardes fosse afastado da relatoria das contas do governo e que o julgamento fosse suspenso até que um novo relator fosse designado. Com base no mesmo argumento, o governo ingressou com um recurso junto ao STF (Supremo Tribunal Federal), mas o ministro Luiz Fux rejeitou o pedido do governo alegando que a simples manifestação de Nardes sobre o processo não era motivo suficiente para que ele fosse considerado "suspeito". 


Em seu voto nesta noite, Nardes afirmou que Dilma é pessoalmente responsável pelas "pedaladas". "É importante esclarecer que a responsabilidade direta é da presidente da República sobre a prática das pedaladas fiscais", declarou.

Já o advogado-geral da União, Luís Inácio Lucena Adams, foi vaiado após sua defesa. "Eu acredito que o TCU tomará sua decisão, mas o que não se pode é, artificiosamente, tentar transformar isso num movimento de cassação de mandato presidencial", afirmou Adams. Logo após sua fala, vaias foram ouvidas no plenário do tribunal.

Pedaladas fiscais

O episódio conhecido como "pedaladas fiscais" foi um dos principais pontos que embasaram a decisão dos ministros. As "pedaladas fiscais" foram manobras contábeis realizadas pelo governo para "maquiar" as finanças. De acordo com técnicos do TCU, benefícios sociais e subsídios federais eram pagos por bancos estatais sem que o Tesouro Nacional tivesse feito o devido repasse dos valores a tempo.

Esse "adiantamento" feito pelos bancos foi classificado pelo TCU como "empréstimos", mas a LRF (Lei de Responsabilidade Fiscal) proíbe o governo de fazer empréstimos junto a bancos estatais. O governo nega que as transações caracterizaram empréstimos e alega que outros governos utilizaram o mesmo mecanismo sem que suas contas fosse reprovadas.

De acordo com o TCU, as "pedaladas fiscais" envolveram um montante de R$ 40 bilhões.


Irresponsabilidade com gastos dá impeachment? Juristas expõem visões opostas

NÃO

Irresponsabilidade com gastos dá impeachment? Juristas expõem visões opostas
Joaquim Falcão, diretor da faculdade de direito da FGV-Rio, considera que uma eventual parecer do TCU pela rejeição das contas de 2014 do governo de Dilma Rousseff, mesmo que venha a ser confirmado pelo Congresso, não é suficiente para justificar juridicamente a abertura de um processo de impeachment da presidente.

Ele argumenta que não haveria precedente de decisões anteriores nesse sentido. Segundo pesquisa realizada por sua equipe, a punição aplicada pela Justiça Eleitoral a prefeitos e governadores que já tiveram as contas rejeitadas pelo Poder Legislativo local foram multas e a proibição de poder se candidatar nos anos seguintes.

"Será uma novidade você dizer que cometer crime contra responsabilidade fiscal dá impeachment. Nunca houve (impeachment por rejeição de contas)", disse.
"Depois, uma eventual rejeição (das contas) vai ser contestada no Supremo pelo governo. É imprudente o Congresso decidir (abrir um processo de impeachment) com base em um assunto pendente no Supremo", destacou.

Outro ponto citado por Falcão para refutar essa hipótese é que as contas que estão sendo analisadas pelo TCU são de 2014, último ano do primeiro mandato de Dilma, e a Constituição Federal prevê que apenas crimes de responsabilidade praticados no atual mandato poderiam justificar um impeachment. "Ou seja, mais uma questão para o Supremo", afirma.

Além, disso, observa Falcão, mesmo que tenha havido irregularidades, teria que ser comprovado que foi uma decisão direta da presidente para que seja possível sustentar a abertura de um processo de impeachment. "O terceiro argumento (contra a abertura de impeachment) é que não é um ato individual dela, mas é uma política de governo (a gestão fiscal)", diz.

"Meu raciocínio é que esse conjunto torna a coisa, do ponto de vista técnico, extremamente difícil", acrescentou.

O diretor da FGV Direito Rio, no entanto, não descarta completamente a possibilidade de impeachment devido ao aspecto político do julgamento. Ele ressalta, porém, que um impeachment sem uma justificativa clara poderia comprometer a imagem do Brasil perante à comunidade internacional, o que pode servir como um fator inibidor desse processo.

"É um julgamento político. Então, o Congresso pode dizer, como disse para o (ex-presidente Fernando) Collor, que isso (a rejeição das contas) fere a dignidade do cargo. Agora, você ferir a dignidade do cargo é uma coisa muito ampla. Não existe uma definição unívoca do que é a dignidade. O que vai decidir isso é o número de votos (no Congresso)", observou.

"Estive com vários banqueiros e investidores. Para o mercado externo, é muito complicado um impeachment que não seja totalmente claro porque a continuidade democrática é um dos ativos do Brasil hoje. A visão externa não comporta interpretações muito elásticas", insistiu.

Ele observa que, no caso o impeachment do Collor, havia comprovações de uso de recursos provenientes de corrupção para uso pessoal, como a compra de um carro Fiat Elba.

Na avaliação de Falcão, a estratégia da oposição à Dilma é "criar um clima de insegurança a favor do impeachment". Segundo ele, "nenhum dos pedidos (de abertura de processo já apresentados na Câmara) traz fatos concretos".

"Eles tratam de hipóteses com base em decisões futuras do TSE (que vai julgar as contas de campanha de Dilma) ou do TCU. De momento não tem nada. O que não quer dizer que pode vir a ter", ressalta.

SIM

O jurista Adilson de Abreu Dallari, professor de direito administrativo da PUC-SP, produziu em maio um parecer sustentando que Dilma poderia sofrer um impeachment por atos do primeiro mandato do seu governo. O documento havia sido encomendado pelo Instituto dos Advogados de São Paulo.

De lá para cá, ele considera que as evidências de irregularidades na gestão fiscal se avolumaram e tornaram mais fortes os argumentos favoráveis ao impeachment.

Ele cita o artigo 85 da Constituição Federal que prevê que "atos que atentem conta a lei orçamentária" são considerados crimes de responsabilidade. Na sua avaliação, o governo também desrespeitou trechos da lei 1.079, que regulamenta o processo de impeachment, e a Lei de Responsabilidade Fiscal, que proíbe que o governo tome recursos emprestados de bancos públicos.

O professor destaca o caso das "pedaladas fiscais", em que o governo atrasou em grande volume (R$ 40 bilhões) repasses para bancos pagarem benefícios como o Bolsa Família e o seguro-desemprego. Como os bancos desembolsaram os recursos mesmo assim, isso configuraria empréstimo à União.

Dallari considera que o caso é ainda mais grave porque as irregularidades melhoram as contas públicas artificialmente em ano eleitoral. Na sua avaliação, já está comprovado que houve crimes.

"No Tribunal de Contas, o ministro decide depois do pronunciamento dos órgãos técnicos. E os órgãos técnicos já se pronunciaram. Então, não dá mais para negar um fato, porque está tudo documentado", disse.

Dallari argumenta que Dilma tem responsabilidade direta sobre os atos praticados.

"Pela Constituição Federal, o Presidente da República é o chefe de governo. Os ministros são subordinados. Então, a responsabilidade é do chefe. Não tem como escapar disso", argumenta.

"O importante nessa história é que não estamos falando de uma transgressão feita por uma subagência do instituto de pesquisa contra malária lá no interior da Amazônia. Estamos falando de coisas que aconteceram necessariamente no nível superior do governo", ressaltou.

Dallari rebate o argumento de que não haveria precedente para um impeachment da presidente por rejeição de contas do governo. Na sua avaliação, o fato de decisões de órgãos do Legislativo locais não terem levado à cassação de mandatos de prefeitos pode ser consequência do apoio político angariado por eles nas câmaras municipais.

"Para que o pedido de impeachment vá para diante, é preciso ter dois terços do Legislativo. Vamos falar português, é o que a Dilma está tentando fazer agora com essa reforma (ministerial, anunciada semana passada): conseguir apoio de um terço dos parlamentares (171 deputados). Ela pode ter cometido todos os crimes do mundo, se tiver um terço dos votos, não haverá impeachment", observou.


Na avaliação de Dallari, quando um governante do Poder Executivo é reeleito, seu mandato passa a ter oito anos na prática, pois não há interrupção de governo. Para ele, isso permite que juridicamente Dilma sofra um impeachment por atos praticados antes da sua reeleição. O professor considera que se isso não for possível cria-se um incentivo para que se cometam irregularidades no quarto ano de mandato.

"Essa teoria de restringir ao mandato atual é completamente absurda porque ela é um incentivo à corrupção", afirmou.

Fonte: "UOL"



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